sexta-feira, 28 de maio de 2010

LUZ DO SOL - 14 -

- ANA LUNA -
- 14 -
Abel Viana tornou-se ferrenho adversário do Juiz de Direito Mardoqueu Ramos de há muito por questões diversas, até políticas. Certa vez Abel Viana jurou vingança contra o Juiz Mardoqueu. Isso até mesmo depois da morte do seu filho, Abelzinho, como o velho carinhosamente o chamava. Joca de Mundica matou o filho de Abel Viana e disso a inimizade cresceu mais ainda. Onde estivesse o magistrado sempre corria o risco de ser morto. O homem da Justiça também era bom no gatilho e por várias vezes acertou em seus rivais, bandidos a mando o coronel Abel Viana e de outros inimigos políticos ou não. O certo é depois de uma vingança sempre haveria de vir outra se não fosse acertada a primeira ou segunda ou terceira ou quanto mais que fosse. Dessa vez estava metido no meio o também Coronel Ezequiel Luna Torres homem valente e capaz de matar o seu próprio amigo se assim carecesse. Bom no gatilho, o Coronel tinha ainda a seu dispor a ação do feitor Zenon e então também o mulato Sabugo e de certa enfermeira que ele - o coronel - conhecera há pouco tempo. Seu nome era Guacira que fazia o papel de enfermeira, guardando por todo o tempo o Doutor Mardoqueu mesmo depois que ele começara a andar pelos corredores da Casa Grande. A despeito de existir na Fazenda três filhas do coronel, ali não havia um bom sossego enquanto o doutor Mardoqueu estivesse sob proteção do Coronel Torres. Assim era a vida na Fazenda Maxixe.
Certo dia, o Coronel Torres caminhava em direção do quintal da Casa Grande quando surgiu um rapaz de forma sorrateira, caminhando nas pontas dos pés, com uma faca não, por trás do coronel sem que esse prestasse atenção e ergueu a mão para desferir o golpe fatal. Nesse momento, por trás do vaqueiro caminhava o mulato Sabugo que notou a intenção do vaqueiro e lançou como uma seta certeira o seu punhal que foi se cravar no pescoço do homem, fazendo-o cair de imediato, provocando tremendo barulho atrás do Coronel Torres. Com tal barulho provocado por um “arg” do assassino o Coronel se voltou às pressas vendo ao seu redor aquele vaqueiro, a faca, e o jovem Sabugo correndo para cima do assassino tentando perguntar de quem se tratava. Porém, o punhal certeiro não deu tempo ao homem falar, pois já estava morto.
--- Para mim? Esse covarde? Como é que pode? – reclamou o coronel.
--- Para o senhor mesmo. Ele teria matado o senhor. – falou Sabugo de modo sério.
--- Você me salvou! Zenoooon!!! – gritou estridente o coronel chamando o seu feitor.
De imediato, Zenon, que estava nos fundos da Casa Grande contando o numero de vaqueiros e procurando ver quem estava ali há pouco tempo, saltou em cima dos pés de voltou ao chamado do Coronel Ezequiel, alarmado. De outro lado os capangas do coronel, ao ouvirem o seu gritar correram para ver e chegaram para reconhecer o cadáver do homem ainda jovem.
--- Meto Ferro. – disse um.
--- Quem? – perguntou outro.
--- Meto Ferro, disse ele. Era assim que se chamava. Agora está morto. Por quê? – respondeu quem falou primeiro.
--- Zenon! É assim que me proteges? – voltou a falar o coronel embrutecido.
--- Mas coronel, eu estava contando os vaqueiros para ver quem era novo aqui! – respondeu Zenon um pouco sentido.
--- Pois deixe de contar. Eu estou indefeso nessa casa. Se não fosse Sabugo, você não teria mais a mim. – retrucou o coronel cheio de raiva.
--- Sim senhor, coronel. Eu não conto mais. Deixo outro pra contar. – respondeu Zenon cabisbaixo por ter que fazer outro serviço.
Nesse ponto se ouviu um disparo de arma de fogo vindo do quarto do Juiz. Sabugo correu em disparada seguida do coronel e de Zenon. Em lá chegando encontrou um corpo do chão. Olhou para o Juiz e esteve estava assombrado. Ele olhou para Guacira, e esta estava tranqüila limpando com um sopro o cano do revolver 45 para pólo no coldre. Sabugo perguntou então o que tinha havido.
--- O bandoleiro e mandou eu me sentar, pois não queria me matar comigo de pé. Foi nesse espaço de tempo que eu saquei a da arma e o resto você sabe. – falou Guacira.
--- Muito bom. Muito bom. – falou Sabugo.
O coronel chegou apressado e indagou de forma surpresa.
--- Que houve? Que houve? – perguntou o Coronel Torres pasmado.
--- Mas um. Só isso. – respondeu Sabugo de forma ironica.
--- Está vendo Zenon? Está vendo? – berrou o coronel Torres.
--- Eu sei coronel. Mas este ai entrou ontem. Zacarias o nome dele. – falou Zenon.
--- Já perco as contas nos dedos. – refletiu ligeiramente Sabugo enquanto sorria.
--- Isso é uma merda! Que proteção se está dando ao Juiz em nossa casa? – gritou afrontado o coronel Ezequiel Luna Torres.
--- Tenha calma, coronel. O senhor seja prudente. Veja que só morreu gente do outro lado. – falou Sabugo.
--- Eu sei meu jovem. Eu sei. Mas não era para ser assim. Uma coisa dessas nunca aconteceu aqui desta forma. E nem de outra. – expôs o coronel Ezequiel.
--- Veja bem. Sejamos sensatos. Zenon tem a parte dele, Guacira tem a sua, o senhor tem também a vossa parte. Eu tenho a minha parte. O Juiz que já está bem melhor tem como pensar. Agora vamos discutir as partes de cada qual. Entende agora? – falou Sabugo de forma coerente.
A partir de então cada qual montou uma estratégia de defesa. E foi assim por mais alguns dias quando o delegado chegou a Casa Grande trazendo informações de que estava ciente sobre um homem louro que permanecia na Vila Rancho das Pedras a procura do Coronel Torres para matá-lo. Ele mesmo não tinha motivos para prendê-lo, pois a conversa lhe veio através de terceiros. A ele só era possível mesmo investigar. Porém, investigar podia despertar acima de tudo suspeitas. O que seria melhor era o coronel falar com o capitão Zenóbio Manso, senhor de terras que poderia ter acesso a certos homens o qual seria bem melhor. O coronel Torres ouviu a explanação e decidiu chamar de fato o capitão Zenóbio Manso para lhe relatar tal fato. Com isso pediria ao capitão ajuda para conter o tal de Loiro. Certamente que esse era um bom plano. Em seguida o coronel Ezequiel chamou o seu homem forte dos últimos tempos – Sabugo – para ir ter com o capitão e contar-lhe sobre tal façanha. Com isso evitaria do capitão vir ao rancho Maxixe e partiria com certeza para um local onde Zenóbio sabia existir pessoal capaz de enfrentar um inimigo – como se dizia – a altura. E foi assim que Sabugo fez. Deixando o Rancho sob os cuidados da moça Guacira, ele partiu sob expressas recomendações de manter rigoroso silencio. Ao chegar ao local Fazenda Arroio do Boi, o jovem Sabugo, ainda desconhecido dos capangas do capitão Zenóbio ele apenas disse que trazia um recado do coronel Torres para entregar pessoalmente ao capitão.
--- Quem é você? – perguntou um jagunço.
--- Da casa do Coronel Ezequiel, sô! – respondeu Sabugo.
--- Moreno assim? – inquiriu o jagunço.
--- É minha cor, patrão. – redargüiu Sabugo se mostrado muito manso até.
--- Vou falar com o feitor. Espere aqui. Não tem por que! – respondeu o jagunço.
Já passados alguns minutos apareceu o feitor e logo reconheceu Sabugo. Fez festas, cumprimentou e chamou Sabugo para descer, pois o capitão estava no alpendre. Esse também reconheceu Sabugo, o rapaz do calço que derrubou o feitor Zenon. Após muita festa o capitão foi direto ao assunto. E Sabugo explicou o que o coronel Ezequiel Torres estava a precisar e confiava então no capitão por sua alta influencia no meio.
--- Bem! É certo que tenho alguns influentes conhecidos. Mas, o senhor vem comigo? – perguntou o capitão Zenóbio.
--- Se for preciso, eu vou. – respondeu Sabugo.
--- Bem. O meu feitor Lindolfo virá também. Pode-se se arranchar que partiremos em meia hora, - falou o capitão Zenóbio preocupado.
Temístocles era o feitor do capitão Zenóbio Manso que fez amizade segura com o rapaz Sabugo apesar de esse não ser o feitor do coronel Ezequiel Luna Torres. No caminho para o local do encontro do capitão Zenóbio Manso onde o senhor de terras teria com um estranho eles dois trocaram impressões sobre o calço que o rapaz teve que dar no feitor Rafael Zenon o que fez gargalhar por diversas vezes o capitão Zenóbio ao pensar que alguém pudesse fazer o mesmo com o seu feitor numa contenda como aquela que houve do lado de fora do necrotério da Delegacia de Polícia que ficava na Vila Riacho das Pedras. O grupo composto por cinco homens, três dos quais eram o capitão Zenóbio, seu homem forte Temístocles, o rapaz Sebastião Sabugo e dois capangas enfrentaram as agruras do sertão ao atravessar campos de juremas, angicos e alguns pés de juá, em um sol terrível e escaldante, por fim eles avistaram a bodega do compadre Genésio que alimentava as bocas de roceiros, velhos, meninos, moças e mulheres raquíticas que residiam em mocambos feitos de pau e corda entrelaçada ou mesmo de palha, chão de barro batido, algumas sem pintura de cal. Era essa a vida da roça que não se conhecia.

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