sexta-feira, 31 de julho de 2009

RIBEIRA - 352

SESSÃO DE CINEMA
Estou pensando no que era a minha mãe. O seu modo de pensar, de ver as coisas, sentir, escutar. Eu lembro bem que, no seu dizer, ela não gostava de cinema. De ir ao cinema. Lembro-me bem que uma certa vez, logo quando se casou com o meu pai, ela a convidou para os dois irem assistir a uma sessão de cinema. Tão logo começou a sessão, de repentea mulher se levantou da poltrona em ela estava sentada, chamando o marido e logo saiu pois a senhora não gostou de ver o que estava vendo e, além do mais, o local era muito escuro com uma projeção feita em uma tela que para ela, era um negócio muito feio, os atores. Meu pai quis mostrar a sua esposa que tudo aquilo era normal, pois o filme carecia de um ambiente escuro. A mulher não contou conversa e saiu da sala, partindo em direção da sua casa com o marido querendo fazer notar o que estava a ocorrer. Porém, nunca mais a minha mãe voltou ao cinema para assistir um filme. Uma outra coisa que a minha mãe não gostava era de ouvir rádio. Simplesmente não gostava. Com o passar do tempo, já com a sua idade um tanto avançada, ela começou a ouvir, quando eu punha na radiola um disco com músicas antigas que ela chegava a comentar serem bonitas as melodias que eu colocara. Eram valsas, canções, modinhas, composições que eram do seu tempo de jovem ou de moça. E ela foi se acostumando com o meu modo e, não raro, com o mais tempo passado chegou a assistir filmes na TV, programas na TV, jornais-falado no rádio e na TV. Muitas vezes era ela quem pedia a mim para ligar o rádio ou a TV, pois era horário de poder assistir uns programas agradaveis. Hoje eu lembro disso me pergunto por que a minha mãe não gostou de ver um filme num salão, só porque era um local escuro.Talvez fosse apenas isso. Na minha cavalgada no meio do tempo, eu vi que as pessoas, mulheres, principalmente, não gostavam das coisas "modernas" de antigamente. Para elas, aquilo era muito feio - moderno - com os "homens", sendo no cinema, pregados numa parede - tela - a se movimentar. E hoje, ainda, tem pessoas que não assistem TVs ou cinema, porque dizem que não "entendem" aquilo. Enfim, cada geração tem seus meios e motivos. Não se pode culpar. Se é o progresso para nós, é uma coisa estranha para tais pessoas.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

RIBEIRA - 351

- INSOLAÇÃO -
Brasileiros selecionados para Veneza - Daniela Thomas é categórica ao falar do Festival de Veneza, para o qual foi selecionado seu longa "Insolação" - co-dirigido por Felipe Hirsch. "Os festivais são como um pódio para a gente. Ter um filme selecionado para Veneza é uma honra muito grande. Pois o Marco Muller [diretor do Festival] acompanha as principais tendências criativas do momento", disse a cineasta. O longa participa da seção Horizontes, a principal mostra paralela do Festival, que acontece entre 2 e 12 de setembro.
Daniela já participou dos principais festivais de cinema do mundo, com "O Primeiro Dia", exibido fora de competição em Berlim em 2000, "Linha de Passe" e um curta do longa coletivo "Paris, Te Amo" em Cannes, em 2008 e 2007, respectivamente. Todos foram codirigidos por Walter Salles.
Para Hirsch, mais conhecido como diretor de teatro - contando com Daniela como cenógrafa em vários de seus trabalhos -, o Festival de Veneza vem como mais um precioso passo no processo de cinco anos de trabalho em "Insolação". "Fomos lapidando com calma. Queríamos falar de amor e utopia, meditando cada coisa do longa. Foi um filme para o qual faziamos questão de que cada passo fosse muito bem pensado".
O codiretor também diz que o mais importante ao fazer "Insolação" era a sinceridade. "O que nos impulsionou e tentamos levar para o filme foi ser o mais fiel possivel aos sentimentos.É um filme delicado, pois para se falar de amor é necessário delicadeza".
"Insolação" foi rodado em julho do ano passado - quando Daniela voltou de Cannes - em Brasília, mas a ação não se passa em nenhuma cidade específica. "A capital aquí não é vista pelos seus cartões postais, a gente mostra os corredores e áreas de serviço", explica Daniela.
O roteiro foi escrito por dois norte-americanos, o dramaturgo Will Eno e escritor Sam Lipsyte, baseando-se em contos de autores russos do final do século XIX, início do século XX, como Tchekhov, Pushkin e Turgenev. "Os personagens vagam apaixonadamente e sentem uma espécie de febre de amor".
No começo da história, um deles não sabe se está apaixonado mesmo ou se está sofrendo de insolação, daí o título", conta a diretora. O elenco traz Simone Spoladore, Leonardo Medeiros, Leandra Leal e Paulo José, que funciona como uma espécie de narrador.
Para as telas, Daniela e Hirsch levaram a experiencia da parceria de mais de uma década de teatro, que rendeu obras como "Não Sobre o Amor", "Avenida Dropsie" e, mais recentemente Viver Sem Tempos Mortos", protagonizado por Fernanda Montenegro, - que acaba de estrear no Rio depois de uma temporada em São Paulo.
"Costumo achar que o teatro pode trazer coisas para o cinema, e vice-versa. Em "Insolação", creio que fizemos um filme delicadamente cinematográfico", arremata Hirsch. Já Daniela acredita que o longa vai encontrar um público muito particular, ou como ela diz, "hibrido". "É um filme que nasceu de pesquisa de linguagem, é algo muito especial. Acho que deve se comunicar tanto com as pessoas que gostam de cinema, quanto as que gostam de teatro".

RIBEIRA - 350

CARANGUEJO-UÇÁ
Em uma manhã de domingo, minha mãe, meu pai, meu irmão e eu fomos passar o "dia" - como se dizia naquela época - em casa da minha prima Neusa, mãe de um sem numeros de crianças. Neusa morava no bairro das Rocas que ainda não era um "bairro". Era um aglomerado de casas, vindas do tempo em que se fez o Cais do Porto de Natal (Rn). Em outros dizeres, Rocas também foi um bairro onde os soldados portugueses lotados no Forte dos Reis construiram seus casebres em terra firme, onde moravam. Ah! Isso, faz tempo das antas. Minha prima Neusa morava em uma casa - casinha pequena - sem serviço nem de água, nem de luz. Era um breu, o bairro. A água, seu marido, Guilherme Mendonça, extraía de um poço feito no quintal, usando uma bomba que, com a alavanca, se podia retira-la do fundo do chão, que não era tão fundo, assim. Dessas bombas de água que ainda existem no interior do Brasil. Casas, só havia do lado do sol, na rua São João. Em frente a casa em que a minha prima morava. havia só um charco que a maré fazia, para desaguar ali. Nao havia moradias. A Feira das Rocas, era ao longo do Grupo Escolar "Isabel Gondim", muito antes da casa de Neusa. No local, também não havia o prédio do Hospital dos Pescadores - ao que eu me lembre, construído na administração Café Filho, presidente do Brasil -. Afinal, no local, só havia mangue de um cheiro horrível. "Uma podridão", como dizia a minha mãe, ao sentir um cheiro como aquele.
Ao chegarmos à casa de Neusa, logo me entreti com um dos seus filhos - Dita, era como a gente o chamava. Seu nome verdadeiro, era Wilton. E, olhando para o manguezal, vi que alí dava para brincar, mesmo atolando os pés que se aprofundavam até as canelas. E lá fomos nós - eu e Dita - buscar caranguejo ou mesmo "tesoureiro", outra espécie de caranguejo de somente uma pata, valente que só ele. Ao presentir os algozes, lá estava o caranguejo com sua tesoura armada para a defesa do seu habitat. Um "mordida" de um "tesoureiro" era tenaz, pois só largava quando seu "inimigo" saísse de campo. Não raro, o desafeto lhe tirava a pata, e o animal saía cambeta. Para se retirar a pata encravada na pele (da mão ou da canela) era preciso muito esforço, pois já sem vida, a pata fincava no local da mordida, como se diz, com unhas e dentes. Era preciso força para abrir os dentes afiados da pata do "tesoureiro". No mangue, havia de tudo para se brincar. Tinham piabas - peixes miúdos, pequenos, vindo com os peixes maiores, que com o secar da maré, saíam em correria para pegar as águas do rio Potengi e somente voltar quando a maré enchesse. As piabas, essas não tinha jeito. Ficavam mesmo no lamaçal.
Além dos peixes miúdos - piabas - nós se arranjava com as ostras de conchas afiadíssimas, suficientes para se encravar no pé da pessoa. E para não dizer que não falei de crustáceos, tinham alí os caranguejos que o povo chamava - e ainda chama: caraguejo-sá. - Na verdade, o seu verdadeiro nome, é caraguejo-uçá. Uçá deriva do nome "Ulcedis cordatus", nome bastante estranho. Quando era Janeiro, os caranguejos-uçá ficavam "bêbados" ou "de leite". Era o tempo da desova de caranguejos. Os bichos saíam das tocas peranbulando pela rua e, raro era de se encontrar um caranguejo dentro de uma casa, no quarto e até mesmo na cozinha. Tais caranguejos-uçá, não são próprios para o alimento humano, porque elas - os caranguejos femeas -estão no ponto da desova. No caso, estão de leite. Em Natal, o apanhar de caranguejo é frequente e os apanhadores enfiam o braço na lama preta bem fundo, até ao ombro, para para caçar ou pescar o crustáceo pelo casco. Quando o caranguejo está no seu ninho, ele encolhe as duas patas ao redor da boca e, então, o apanhador pega o bicho pelo casco. Quando na terra firme, ele é enrolado com imbira, pois o bicho é valente e só entra na cidade se for amarrado. A sua captura pelas comunidades extrativista foi e é sempre desse mesmo modo. O caranguejo-uçá desempenha um importante papel ecológico na cadeia alimentar do povo mais pobre. E, hoje, até os ricos turistas se ambientam desse fruto. Tem, hoje, inclusive locais de se capturar caranguejo-uçá na região de mangue.O caranguejo-uçá representa a maior parte das capturas do pescado.Por sinal, esse tipo de caranguejo é bastante apreciado nas praias e restaurantes de Natal. Quando nós voltamos para a nossa casa - eu, com cortes profundos nos pés, provocados pelas conchas de ostras, vimos bem os caranguejos entrando pela porta a procura de um ninho de desova. As mulheres gritavam pela sua presença enquanto Dita chutava para fora os amentradores animais, calando o temor de sua tia, mãe e avó que por certo já tinham nas mãos as vassouras para dar cabo ao bicho.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

RIBEIRA - 349

TUDO É RIBEIRA
Eu estou puxando o tema de que tudo teve início no bairro da Ribeira. Quando Natal foi "descoberta", os homens de Portugal vieram para ficar a pedra do pelourinho no centro de uma terra que, depois, ficou sendo chamada de André de Albuquerque, na Cidade (Alta), em Natal (Rn). Isso foi em 1599. Finzinho do ano. Porém, os fundadores de Natal descobriram também que já em tempos ídos, para além de 1500, Natal era visitado por um francês de nome Jacques Rifault, mais conhecido por Refoles. Ele veio aqui a mando do Governo da França, buscar madeira de escorria um leite vermelho. E foi desse pau, que se colocou o nome do país - Brasil - pois a madeira tinha em todo o continente e sempre se cortava brotava um visgo feito brasa. Mas essa é outra história. Aqui, estamos falando do bairro da Ribeira.
Quando ou após ter sido descoberto Natal, a Ribeira não existia como nome. Os soldados portugueses que estavam no Forte (dos Reis), ficavam mesmo por lá. Alguns se aventuravam em descobrir novas "terras" por Natal e foi assim que um deles "descobriu" a tal chamada "Lagoa Seca". Além dos portugueses, tinham também os escravos fugidios. Esse fizeram "descobertas" para os lados de Lagoa Seca enquanto um homem de posse, mas sem grande posse, foi degredado para Natal, e aqui fez um sítio que o povo chamou de "Quintas", porque o homem tinha que pagar a quinta parte do lucro que auferia ao Governo Português. Bem! Mas isso é outra história, também. A nossa questão é a Ribeira.
Os soldados que "vinham" do Forte para o alto - daí o nome Cidade Alta - tinham que atravessar um pântano no meio do caminho. É que o rio (Potengi) espraiava-se por toda a redondeza e quando era tempo de Janeiro, a situação era bem pior. Mas, o tempo foi passando e o povo foi construindo suas casas. Na Cidade (Alta), ficavam os moradores - ricos e pobres - e na Ribeira, hávia o comércio de vendas de artigos de luxo e de lixo. Alí, se morava em casas boas ou ruins. Era assim a vida do bairro que ainda não era bairro. Para o início do seculo XX, e ainda final do século XIX, tinha na Ribeira, um prédio onde morava Joaquim Siqueira. Esse prédio ficava na esquina da rua - hoje, Frei Miguelinho com a Esplanada Silva Jardim. Era uma casa de esquina, confrontando com a casa onde nasceu o depois Frei Miguelinho. A rua das Virgens - hoje, assim batizada - era chamada de Rua Senador Bonifácio. Nessa rua, morou o alfaiate João Bevenuto, onde tempos depois foi o Hotel Central e também, construiu-se um palacete pertencente ao italiano Guilherme Lettiere. Em sua época, era a residência mais elegante da Capital. A casa ficava vizinha ao que foi chamado de Hotel Central. Alí, no palácio, se "escondeu" durante a Revolução Comunista de 1935, o Governador do Estado Rafael Fernandes. Bem próximo tinha a residencia do Coronel Francisco Cascudo, pai de Luis da Camara Cascudo. O seu filho nasceu alí na Ribeira, ao contrário do que muitos historiadores narram. Era uma residência de alto luxo. Nessa mesma rua - das Virgens - estavam as residencias de dr. Vicente Farache, fundador do time do ABC F.C..
A rua Duque de Caxias, nos anos 20, era conhecida por rua Sachet. No seu começo, onde hoje tem a Agencia do Banco do Brasil, alí morava o empresário Anaximando Oliveira. Essa foi derrubada e o terreno de encheu de mato até que o Banco do Brasil construiu a sua sede. Antes, o BB funcionava no prédio da esquina entre a rua Duque de Caxias (Sachet) com a rua "15 de Novembro". Hoje, é o prédio da Receita Federal. Antes que o BB funcionasse naquele local, alí havia tres casas baixas, do lado do sol. O BB demoliu as casas para construir sua sede. Depois foi para a outra esquina, onde até hoje está.
Ainda na rua Duque de Caxias, onde é hoje a sede da Delegacia do Trabalho, havia uma residencia de Dona Letícia Cerqueira. A senhora comprou umas casas de taipa para fazer a sua, com alicerce profundo e que, mesmo sendo a Delgacia do Trabalho, ainda resiste. Na esquina da av Duque de Caxias com a Nísia Floresta, era uma residencia de dona Glorinha Bttencourt, onde a mulher transformou em uma pousada de ótima qualidade. Atualmente, o local serve de estacionamento de carros. Ainda tem trés prédios velhos na sequencia em direção a rua Ferreira Chaves, antes da Delegacia do Trabalho. Por sinal, na DRT, também funcionou um Banco e vários escritórios na parte de cima.
Na esquina da rua Nisia Floresta com a Duque de Caxias, era uma casa de morada do senhor Antônio Fernandes de Oliveira. Na sequencia, pela av Duque de Caxias, se encontrava três casas pequenas e que depois Severino Alves Bila construiu no local um prédio que leva o seu nome - Ed.Bila -A parte de baixo do prédio foi alugado a Habib Chalita, e em um dos andares de cima funcionou um Loja Maçônica. Na esquina da av Tavares de Lyra com a Rua Duque de Caxias, funcionou por um largo tempo uma loja de bicicletas e seus acessorios, de propriedade do sr. Plinio Saraiva, primeiro passageiro a fazer o percurso entre Natal e Recife nos ídos de 1930 em um avião que fazia escala em Natal. Plinio Saraiva morava no Tirol, em uma bela casa situada na rua Mossoró com a Av Afonso Pena. Alí,na sua residência ele mantinha uma serraria para serrar tocos de paus e vender para a casas que usavam fogão à lenha. Sua esposa era Dagmar Saraiva e os filhos eram Vera, Dupont e Darque Saraiva. Onde Plínio Saraiva instalou a sua loja, foi depois o Prédio do Banco do Rio Brande do Norte e, hoje, é o PROCON.
o Dr Grácio Barbalho morou em um prédio onde depois foi a Western Telegraphic. Era um verdadeiro palácio aquele que a família de Gracio Barbalho ocupou, na rua Duque de Caxias. Hoje, o prédio foi transformado e está ao abandono, pois a firma - DUMBO - que o ocupou, saiu de lá. No prédio onde foi construido o Grande Hotel, em 1935, era ali a mansão do Cel. Solon, importante salineiro de Areia Branca. Quando o Governo Rafael Fernande quis construir o Hotel, ofereceu-lhe a quantia pedida e o Cel Solon desocupou o local. Conta-se que ali foi palco de tiroteio entre rixas do Cel Solon e seus algozes. Vizinho a casa do coronel, pela av Tavares de Lyra, ficava uma estação do telégrafo. Voltando o trajeto, pela rua Duque de Caxias, vizinho a um prédio de esquina onde funcionou a Companhia Força e Luz, está um palacete onde morava Fortunato Aranha, dono da Livraria Cosmopolita, situada na rua Dr. Barata. Alí, ele viveu até que o prédio foi comprado pelo Instituto do Açucar e do Alcool. Hoje, nada existe ali. Somente o abandono.
Seguindo da rua, iremos encontrar tres casas de moradia, pequenas, por sinal, que Cyro Cavalcante comprou e instalou um moderno prédio de venda de peças de automóveis. Na parte de tras, tem uma oficina de retífica de motores de veículos de várias espécies. Cyro Cavalcante também adquirio o largo terreno em Petrópolis, ao lado do Colégio Maria Auxiliadora (no tempo que ele adquiriu esse terreno era do Comando do Exercito) para a construção de várias casas, verdadeiros palácios, podendo assim chamar-se como sendo o primeiro conjunto feito em Natal.
Ainda na Rua Duque de Caxias, havia o palácio do Dr Januário Cicco, médico genecologista e obstetra e que construiu a Maternidade que leva o seu nome, situada na av. Nilo Peçanha, em Petrópolis. Em frente ao palacete de Januário Cicco, ficava a oficina de Antonio Farache, e pelo lado direito ficava a casa de morada de dono Zulmira Lampréa, esposa de um viajante italiano que fazia negócios com artigos de porcelana. Na parte do lado direto na rua Duque de Caxias, na esquina, onde era e é a Recebedoria de Rendas, antes funcionava o Hotel dos Leões. Do outro lado da rua, antes de se chegar a esquina, havia o Hotel Avenida - de Teodorico Bezerra -. Antes de ser Hotel, alí era a residencia do sr Elias Lamas, verdadeiro casarão. Elias Lamas era Consul do Chile, em Natal, e mantinha uma loja de venda de artigos eletro-eletrônicos, como discos e rádios, a rua Dr Barata. Na rua Tavares de Lyra, antes da construção do Cais do Porto de embarcações pequenas, era um ancoradouro de botes que vinham de Macaiba e da Redinha com gente para fazer compras no comércio da Ribeira. As suas casas, que foram transformadas em luxuosas residencias, eram apenas casas pequenas e que foram sendo vendidas a terceiros para se constituir em um verdadeiro patamar do negócio. Hoje, a Ribeira tem muito pouco do que já teve, um dia. Se a vida, em Natal, começou na Cidade (Alta), foi na Ribeira que ela se consolidou.

terça-feira, 28 de julho de 2009

RIBEIRA - 348

ERNANE ALVES DA SILVEIRA
Quando eu era menino, coisa de 7 ou 8 anos, ouvia passar sobre minha casa, um avião teco-teco que fazia vôo do campo que ficava na estrada de Ponta Negra, onde só tinha cajueiros entre outras árvores frutíferas, e muito mato. Alí, era a que hoje conhecemos como Rua Roberto Freire. No tempo passado, alí não havia rua. Eu me lembro muito bem que os aviões teco-teco - era esse o nome porque o seu motor ao ser acionado fazia um barulho como se fosse um teco-teco - levantavam vôo desde o campo que se chamava "Aéro Clube", pois fazia parte do patrimônio dessa associação - Clube Social Aéro Clube, cuja sede ficava no Tirol, bairro distante do campo de aviação - e voava para a cidade - Natal Rn -, fazendo um contorno até chegar a um campo de pouso do lado esquerdo do rio Potengi, onde pouca gente costumava ir, a não ser os mecânicos que davam assistencia aos teco-tecos. O campo ficava em frente, do outro lado do rio, ao Cais Tavares de Lyra, no bairro da Ribeira.
Para a criançada era uma alegria ver passar de perto, a uma pouca altura, um avião teco-teco, e em terra acenavam com brio para os aviadores que passavam no alto. Nós ficávamos contentes só de olhar as pequenas cabeças dos comandantes aviadores. Na verdade, para que estava em terra, não era próprio saber se os aviadores estavam vendo, lá de cima, os garotos - e garotas, é claro - cá embaixo. Dava prazer quando, dos aviões teco-teco, se jogavam boletins de propaganda das casas de comércio e a garotada em alvoroço, corria para pegar, ainda voando, aquelas propagandas que, para nós, era o máximo da alegia.
Um dos aviadores que fazia esses vôos acrobáticos, era o ainda não doutor Ernane Alves da Silveira, para nós, que tinhamos a oportunidade de vê-lo de perto, era um verdadeiro deus do Olimpo. Caso inusitado para os meninos da redondeza onde Ernane da Silveira costumava ir, na rua Mossoró, cruzamento com a Avenida Afonso Pena, no bairro do Tirol. Na casa que Ernane costumava ir, era a residência do senhor Plinio Saraiva, histórico comerciante de Natal, cujo estabelecimento ficava no bairro da Ribeira. Ali, também residia a jovem Darque Saraiva, filha de Plínio Saraiva. Ela, pelo que eu sabia na época, era também aeronauta, viajando no seu teco-teco, cruzando Natal, passando quase por cima de sua moradia. A residência de Darque Saraiva, era uma espécie de casarão, como um largo jardim em sua frente, formando de uma rua - Morroró - à outra - Av Afonso Pena - e no mesmo terreno, por trás da casa, havia uma serraria onde homens cortavam torras de madeira prontas para ser usadas em casas que usavam fogões à lenha. Havia toras de várias grossuras e de tamanhos diferentes. O pó da serra se espalhava pelas cercanias, ficando grande parte ao pé do muro da casa, pela av. Afonso Pena. Quando alguém passava pelo local, fazia poeira ao fazer uma marcha como sendo um trem - tuc-tuc -.Na parte de dentro da serraria, juntava-se o pó que Plínio Saraiva doava a gente moradora no morro do Alto Juruá, em Petrópolis, pois aquela gente não tinha meios de comprar carvão ou mesmo madeira torada para queimar. O pó de serra dava um bom fogo que durava bem mais que a madeira. Eram mulheres, rapazes, meninos e os próprios homens que buscavam o pó de serra, levando em sacos de açucar, feijão ou mesmo de farinha, para ir fazer o seu fogo. Na casa de Plinio Saraiva tinha ainda uns pés de manga que serviam muito bem para o seu filho - Dupont - e os outros garotos da redondeza, fazerem um "circo" onde se brincava como em um Circo de verdade. Quando não, Dupont arrumava a sala de visita para projetar "filmes" feitos em papel celofane que se projetava em uma "tela" feita com um lençol. Uma lâmpada servia como lente para levar a imagem até à tela. As sessões, se fazia à noite, enquanto Ernane namorana Darque, sob um alpendre tomado todo por uns pés de rosa ou mesmo, de trepadeira. Quando a turma entrava casa a dentro, sempre cuprimentava aqueles herois de Olimpo, pois para nós, eles eram verdadeiros heróis por voarem como asses de cinema em seus aparelhos, embora sendo um teco-teco, que cruzavam Natal, indo até à praia do Meio, e circundar para atingir o ponto de pouso do outro lado do rio. Alí, os aviadores ficavampor longo tempo - uma hora - até que pudessem voltar ao seu campo de orígem, no recanto de Capim Macio, quase na divisa com a vila de Parnamirim. Para nós, Ernane e Darque, eram ícones de um novo mundo onde bem poucos poderiam estar presentes. Eles afrontavam o ar, o céu, o mar para fazer o que mais lhes aprazia. Ernane da Silveira esteve com o seu nome na política, tendo sido vice-prefeito e prefeito de Natal Rn, pelos ídos de 1960 a 1964. Depois desse tempo se desligou da política, ficando como esportista, presidente do ABC Futebol Clube. O seu nome passa desapercebido pelos mais jovens, esquecendo-se de que ele foi o homem que esteve à frente da obra do Estado João Machado. Ele mesmo disse: "É bem melhor que ser um desportista, que ser um político". Por algum tempo, a Prefeitura de Natal deu a Ernane da Silveira uma pensão como pagamento pelo serviços prestados à Prefeitura de Natal nos anos em que foi Prefeito da Cidade. Eu não sei se ele, até hoje, recebe tais proventos. Do alto da sua glória, como heroi do céu, ele sabe bem mais que os insignes homens da plebe.

domingo, 26 de julho de 2009

RIBEIRA - 347

VERDUREIRO

"Ó que saudade que eu tenho da aurora da minha vida, da minha infãncia querida que os anos não trazem mais".
Nos versos dessa poesia, eu lembro, agora, dos tempos de minha infância, quando na rua onde eu morava, passava todos os dias, o vendedor de verduras. Lembro-me de que nem só verduras ele vendia, pois em seus baláios tinham frutas, legumes, e tantas outras espécies, como abacate, macaxeira, bananas leite e anã, batata doce, abacaxí além do comum tempero verde, alface, coentro, hortelã, cebola verde - uns canudos compridos que ainda hoje são vendidos - e tudo que se podia comprar nos cestos pendurados por um galão. O vendedor passava todos os dias, de manhã, logo cedo, com suas mangas de várias qualidades, como sendo manga rosa - ah! manga rosa! - manga espada, que muita gente temia consumir, manga bacurí, chamada de "temerosa", pois tinha um caroço no alto da fruta parecendo um tumor e quando aberto, deixajava escorrer uma saumora parecendo - Ave Maria!!!- pus. Porém, o homem não ligava por isso. Na porta de minha casa, ele descia os balaios - e eram seis ou oito, se a memoria não me falha - para poder minha mãe escolher o que desejava comprar.
--- Quanto é isso? - perguntava a mulher.
--- Um mil reis - dizia o homem, com uma cara abusada, olhando para o outro lado ao mesmo tempo que "gritava".
--- "Verdureeeeeiro! Olha a verduuuura! Tem manga, abacaxi e banana! Verdureeeeiro! - gritava o homem, se abanando com seu chapeu de palha de carnaúba.
--- O senhor não quer vender! Por um preço desse! - rogava a minha mãe.
--- É o tempo, minha senhora. O tempo. Tá tudo caro no mercado! - respondia o verdureiro.
E tinha que esplicar o quanto custara um molho de verdura que ele comprara naquele dia. Mamão, sapoti, jaboticaba. Tudo pelo preço da cara.
--- É o fim do mundo, senhora! Não se pode mais viver! - dizia o verdureiro.
--- Mamão, eu tô botando no lixo. Esse, não quero! - dizia a mulher.
--- Leve o abacaxi. Dois por 20 centavos. Tome! Pode levar! - respondia o velho homem mais aquietado.
E chegavam outros fregueses, moradores da vizinhança, olhando de longe, as frutas - bananas, mangas, abacaxis -.
--- Quanto é esse? - perguntava alguém.
--- Três por um mil reis - respondia o verdureiro.
--- E as bananas? - perguntava um outro.
--- Um mil reis, a palma. - dizia homem.
--- Vigi. Que coisa cara! Lá em casa tem de graça! - respondia uma mocinha.
E o verdureiro fechava a conta do que a minha mãe comprara enquantos outros "fregueses" procuravam um molho de verdura, uns tomates, pimentões é até mesmo um pé de couve.
O homem, astuto, enfiava a mão no bolso da calça, ligeiro, para tirar o troco e se ouvia o tilintar das moedas no final da sacola do bolso da calça.
E, assim, o homem, de cor morena, roupas resgadas, cheirando a suor, todo encardido de poeira da rua, sandálias de rabicho quase não cabendo nos pés, calças encurtadas com o vira dado em suas bocas, era assim a figura do verdureiro.
De lá saía, gritando: "Verdureeeeiro! Olha a verdura! Verdureeeeiro!.".
Para mim, era uma manhã de festa, pois a minha mãe havia comprado verduras de todo o tipo, além de um sapoti, fruta gostosa, doce, e saborosa. Ela levava tudo isso nas mãos enquanto que eu e meu irmão faziamos a festa com o que havia sobrado para nós podermos desfrutar, ouvindo a advertencia de nossa mãe.
--- Não vá se engasgar com as cementes! - dizia ela, la de dentro da casa.
Ainda reclamava dos preços de tudo o que ela comprara.
--- Caristia! Não compro mais a esse homem! - dizia ela.
Mas só tinha esse homem para ela comprar! O que fazer!
No outro dia,a história se repetia com a mesma lenga-lenga da mulher com o verdureiro. Ele sorria de bom grado e minha mãe fazia cara feia, resmungando que aquilo era um roubo. E assim, era o progresso. Hoje, já não tem mais os verdureiros, com oito cestos nos dois ombros, pesados como que, chega fazia o homem arcar, quase beijando o chão com seus balaios entupidos de verdura, frutas, lagumes e coisa que até Deus duvida.

sábado, 25 de julho de 2009

RIBEIRA - 346

A GAROTA DE MÔNACO
Entre as várias lições que o cinema francês vem ensinando há algumas boas décadas, duas se sobressaem em especial: (1) menos é mais e (2) boas interpretações são fundamentais. A Garota de Mônaco leva bastante a sério estas premissas. Com simplicidade narrativa, e evitando qualquer tipo de penduricalho cinematográfico, o filme narra de forma clean e linear o fascinante encontro entre três intigrantes personagens: o advogado Bertrand, seu guarda-costas Christophe e a apresentadora de TV Audrey.
Eles se conhecem no belíssimo Principado de Mônaco, o que por sí só já é um pretexto para algumas tomadas de encher os olhos. Por imposição de um cliente, Bertrand, um homem de sentimentos travados, é obrigado a aceitar os serviços do segurança particular Christophe. Este, por sua vez, é a própria encarnação do profissionalismo. Entre ambos surge Audrey, garota que transita com enorme desenvoltura entre a sensualidade, a ingenuidade e a mais pura vulgaridade. São três mundos em conflito. Três personagens que - de tão diferentes entre sí - acabam se aproximando de maneira inexorável, onde aflorarão diversos tipos de sentimentos contraditórios.
A Garota de Mônaco tem o mérito de saber prender a atenção do público com a força de sua história e a sobriedade de sua narrativa. Tudo bastante simples e direto - e não por isso menos empolgante. Pelo contrário. Principalmente quando se contacom esta trinca impecável de atores, que resultou em duas indicações ao César 2009. Ator Coadjuvante (Roschdy Zem), e Atriz Revelação (Louise Bourgoin).

sexta-feira, 24 de julho de 2009

RIBEIRA - 345

FRIA MADRUGADA
A massa de ar polar que atinge a região Sul do País provocou temperaturas negativas em diversas cidades de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, nesta madrugada, 24/07, que já pode ser considerada a mais fria do ano. Às 8h fez -5,8ºC em São Joaquim (SC), temperatura mais baixa da região, segundo o Instituto Nacional de Meterologia (Inmet). A frente fria também atingiu parte do Sudeste, como São Paulo e Rio de Janeiro. As temperaturas também estavam negativas nas cidades gauchas de Vacaria, onde fez -4,9ºC, em São José dos Ausentes, com -4,1ºC, e em Quaraí, com -3,6ºC. Em Passo Fundo, em Bagé e em Uruguaiana a temperatura era de -0,6 ºC. Em Porto Alegre, os termômetros marcaram 2ºC na região do Aeroporto Internacional Salgado Filho. Em Santa Catarina, às 6h, fazia -0,8ºC. Temperaturas baixas ainda em Joaçaba e em Curitibanos. De acordo com informações da Climatempo, também houve temperaturas negativas no Paraná. Em Curitiba, a mínima ficou em 8ºC. Além do Sul do País, a massa polar também fez caírem as temperaturas em São Paulo. Apesar da chuva, que atingiu grande parte do Estado durante a madrugada, os termômetros na Capital paulista registraram 13°C por volta das 7h30. A previsão é de que a temperatura caia mais ao longo do dia e a máxima não deve passar dos 15°C. Em Florianópolis, quem saiu de casa muito cedo para o trabalho não teve outra opção a não ser abusar dos agasalhos. Na capital catarinense, os termômetros de rua marcavam 6ºC, mas o vento dava uma sensação de ainda mais frio. A expectativa é que a massa de ar polar atue com toda força na próxima madrugada em Santa Catarina. No Paraná, o frio mais intenso, nesta sexta-feira, ocorreu no sul, centro e oeste do Estado.

RIBEIRA - 344

CARROS ENCALHADOS
Após um ano de espera, muito preparo e saudades, aventureiros se encontram para uma jornada de 12 dias de solidariedade, a Expedição Brasil Melhor. Este ano a largada aconteceu na Praia de Pipa, no Rio Grande do Norte. Eram 8h em um cenário paradisíaco, os Chapadões, incrível formação de falésias nos arredores de Pipa. Muita dificuldade para o primeiro dia de viagem: foram 100 quilômetros de praia, dunas, cinco travessias de rios, cinco carros encalhados e muita diversão.
No caminho, muitas comunidades de pescadores - a região abriga várias criações de camarões. Após a travessia do segundo rio, a primeira das trilhas de areião até a Barra de "YK", divisa entre Rio Grande do Norte e Paraíba. O visual era impressionante: na faixa paraibana háa um grande parque de captação de energia eólica, dunas e uma estrada que margeia o rio até a praia.
Alguns carros só puderam sair dalí guinchados. Mas o que pode parecer um problema, para os trilheiros é, na verdade, diversão garantida. A estratégia é tirar o veículo do areião, tarefa que Fábio Cunha, da equipe Clube de Estilo, abraçou. Mais à frente, outros automóveis também pararam, e dessa vez Heliomar, da equipe Curitiba, se posicionou com seu equipado carro - quase um "tanque de guerra" - para ajudar os demais aventureiros. Até algumas pessoas que passavam por alí colocaram a mão na massa e ajudaram no resgate.
Mais de uma hora de areião depois, a maré já estava quase cheia e chovia muito. Foi uma corrida contra o tempo, mas superou-se o desafio. Dalí, a parada na terra indígena da Aldeia Potiguara reservava outra surpresa: Ciro, piloto da Ruffo's, transformou-se em cacique temporário do local. Passado o povoado indígena até o próximo ponto de referência e de lá os aventureiros partiram para Campina Grande.
Durante o trajeto foram distribuidos kits escolares e cestas básicas, além da realização de ações sociais na cidade de Areias, na Paraíba. O trajeto vai, agora, até Arco Verde, em Pernambuco.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

RIBEIRA - 343

RIBEIRA
Ao se falar na Ribeira, deve-se dizer que é um bairro de Natal, Rn, e onde foi - praticamente - iniciada a cidade. Outrora, em tempos ídos, quando se residia em Natal, capital do Estado, estava se compreendendo apenas na Cidade - Cidade Alta - um local de habitações provincianas e único de residencias de moradia. Ao se dizer "provincianas", se quer dizer de "provincia", o que, no tempo em que a cidade estava nascendo, não se falava neste termo. Havia a Cidade (Alta) que era localizada em um topo de maior alcance para a visão da estensa costa, e um outro ponto, em um local mais baixo e que por ser constantemente alagado pelas águas do rio Potengi, que banha a cidade, então aquele ponto passou a se chamar de Ribeira. Era um termo que se dizia para melhor identificar quando se tinha que ir ao bairro que nem bairro era. Em 1900, a cidade ainda era de pouca importância para o resto do mundo. Foi então que o Governo do Estado abriu os olhos para o desenvolvimento da cidade. Começaram a chegar os carros de trem e o bairro se tornou, na verdade, em bairro. Com a vinda do trem, abriu-se a oportunidade de crescimento da Ribeira, com a construção de portos cuja finalidade era a de guardar os produtos que o Estado tinha para exportar, evitando-se de levar tal produção pelo porto do Recife. Esse foi mais um passo que o bairro tomou naquela época, ao par de também operar em outras atividades, deixando o fator residencial apenas para a Cidade. No bairro da então chamada Ribeira, construiu-se novas moradias, pois a gente de menor poder aquisitivo já morava naquele local, ocupando as casas que se armavam nas ruas que hoje existem. As ruas não tinham sequer, nomes de identificação quando a Ribeira começou a existir. E se tinha, eram nomes dados por acaso, pois não representavam um nome verdadeiro. Assim surgiu a rua das Virgens, a rua do Comércio, a rua Sem Nome que logo depois ganhou a denominação de Frei Miguelinho, homem que nasceu naquela rua e, quando morreu, por sentença do Governo da União, na cidade de Salvador, era Padre Miguelinho. Em continuação, abriu-se um porto que era um mero ancoradoro na rua que passou a se chamar de Tavares de Lyra, governador do Estado em tempos passados. Não existia as Rocas, como existe hoje. Então, o bairro da Ribeira terminava na rua Esplanada Silva Jardim. Em seguida, veio a rua Duque de Caxias, e outras menores, como a 15 de Novembro e mesmo a Dr. Barata, uma rua onde residiu o homem que deu nome aquela rua estreita, mas de grande movimento comercial. Entre becos e travessas, o bairro cresceu e ganhou fama como um ponto de grande atração comercial. Nesse tempo, 1920, a Cidade não tinha qualquer movimentação de turismo. Os navios que alí ancoravam, ou era para descarregar e carregar mecadorias, ou para receber os viajantes que rumavam para o Rio de Janeiro. Natal olhava o progresso que estava chegando em outras capitais do pais, como Recife, Salvador e Rio de Janeiro. Quando começou a II Guerra Mundial, um pouco antes o Governo do Estado construiu o Grande Hotel - 1938 - já um passo enorme para a cidade. Nesse tempo, a cidade tinha poucas pensões, como o Hotel Avenida, Hotel Internacional que nunca chegaram a ser hoteis de verdade. A Ribeira, a partir de 1940, tomou forma e passou a ser desenvolvida, perdendo os casarões que já estavam construidos ao longo da avenida Tavares de Lyra, rua das Virgens, rua Duque de Caxias, rua Dr Barata, rua Chile, que assumiu o nome do lugar do anterior Rua do Comercio, onde se comprava de quase tudo. Apenas depois de 1940 é que a Ribeira virou bairro. E então, Natal passou carta de data ao novo e promissor local, onde chegavam os trens, bondes, navios, botes e todos os meios de transportes que aumentavam a cada dia.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

RIBEIRA - 342

ENQUANTO O SOL NÃO VEM
Filme da Agnês Jaoui estréia nesta sexta-feira (17) em São Paulo. O cinema da francesa Agnès Jaoui é calcado nos personagens. É o arco de evolução das pessoas em cena que conduz a narrativa e não o contrário. E isso não é diferente em seu mais novo filme, "Enquanto o Sol Não Vem", o que não quer dizer que essa respeitada roteirista, diretora e atriz esteja se repetindo. A cada trabalho, ela e o seu co-roteirista e também ator, Jean-Pierre Bacri, encontram uma nova abordagem e se sofisticam. Jaoui ganhou um prêmio pelo roteiro de "Questão de Imagem", em Cannes (2004), co-escrito por Bacri, e seu "O Gosto dos Outros" foi indicado aos Óscar de melhor filme estrangeiro, além de ganhar dois prêmios Cesar (melhor filme e atriz coadjuvante), em 2001. No filme "Enquanto o Sol Não Vem", que estreia em São Paulo nesta sexta-feira (17), Jaoui aborda entre outras coisas, o legado que o feminismo deixou para a sua geração. Ela é Agathe Villanova, uma política feminista, que retorna para a casa de sua infância, na região de Avignon, pouco depois da morte de sua mãe. O reencontro entre as irmãs Agathe e Florence traz à tona ressentimentos do passado, quando uma era a preferida da mãe. Ela, por sua vez, mantém um caso extraconjugal com Michel Ronsard (Bacri), um jornalista que faz um documentário sobre Agathe, que, no passado, foi escritora antes de entrar para a política. Ronsard trabalha cm Karin na produção do documentário. No entanto, a presença do rapaz na casa da família traz outra complicação. Ele é filho da empregada, Mimouna, que trabalha com a família há décadas. É desse estranhamento que "Enquanto o Sol Não Vem" encontra uma outra força política abordando a questão dos imigrantes e todo o ressentimento que acompanha Karim, que chegar a fazer um vídeo com sobras de filmagens do documentário, atacando Agathe e sua família. É com uma delicadeza quase subliminar, nas entrelinhas, que Jaoui toca em dois assuntos polêmicos na França contemporânea: mulheres na política e imigração. Se a comédia leve das primeiras cenas toma um desvio para um tom mais sério e até melancólico é porque isso é um reflexo do país da cineasta, onde liberdade, igualdade e fraternidade é um lema menos popular que no passado. Filmes recentes, como os premiados "Bem-Vindo" e "Entre os Muros da Escola", mostram a França como um caldeirão de etnias. O assunto está presente no filme de Jaoui, mas de outra forma. Tal qual a chuva que quase nunca dá trégua aos personagens, a questão está ao lado para não deixá-los esquecer, seja na figura de Karim ou na de outros personágens. Os momentos cômicos, no entanto, também estão lá. Muitos deles envolvem a dupla de documentaristas que parece não ter a menor experiencia, nem intimidade com a câmera, o que desperta um mau humor tipicamente francês em Agathe. Ao falar de infortúnios, como a perda de um amante, de um trabalho ou uma filmagem que não deu certo, "Enquanto o Sol Não Vem" mostra que o ser humano é capaz de sobreviver às pequenas tragédias individuais.
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RIBEIRA - 341

OLHOS AZUIS
O filme "Olhos Azuis", de José Joffily, conquistou na noite desta quinta-feira, (16), o troféu "Menina de Ouro" como melhor longa de ficção do 2º Festival de Paulínia. A produção ganhou no total cinco prêmios, mesmo número que "Antes que o Mundo Acabe", de Anna Luiza Azevedo, escolhida como melhor diretora de ficção. A premiação ainda destacou "Só Dez Por Cento é Mentira", de Pedro Cezar, como melhor documentário, e a dupla Roberto Berliner e Pedro Bronz por melhor direção do gênero. O Grande Prêmio do Juri ficou com "O Contador de Histórias", de Luiz Villaça. A cerimônia de encerramento teve a exibição de "Tempos de Paz", de Daniel Filho, homenageado da noite, e contou ainda com um show dos Paralamas do Sucessos. No total, R$ 650 mil foram distribuidos entre os premiados.
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quinta-feira, 16 de julho de 2009

RIBEIRA - 340






O BÊBADO

- CONTO -




- CONTO -





Faz tempo que tal fato aconteceu. Foi numa manhã de verão que tudo isso ocorreu. Picula era como lhe chamavam. O seu verdadeiro nome, porém, era José Bonifácio, nome muito estranho para ele, que nem sabia quem foi o José Bonifácio de Andrada. Um dia, alguém lhe chamou de "pinguço" ou era "pingunço". Uma coisa assim. O certo é que ficou sendo o seu nome como Picula e não pingunço apesar de ser mesmo um bêbado contumaz. Pois bem! José "Picula" amanhecia o dia acordado do jeito que Deus lhe deu, pois, para ele, dormir, só de quando em quando. Às vezes, Picula dormia na mesa de um bar. De outras, lá estava deitado à beira da porta de um armazem qualquer, dormindo porque já era a vez "de quando". Um dia, eu vi Zé Picula bom que nem acreditei no que estava vendo. Para mim, eu estava sonhando, pois se encontrar um bêbado do jeito que era ele inteiramente desperto, sem ao menos o cheiro etílico da aguardente que talvez não tivesse bebido, aquilo não era possivel. Cumprimentei-o e ele, a mim, do mesmo gesto, afinal, entre nós, havia uma certa amizade. Não que houvesse uma amizade de bêbados. Porém, apenas uma amizade. Uma simpatia entre ele e eu.




Recordando bem, fazia tempo que eu conhecia Picula. Não raro, eu falava com ele, em tempos que ele estava mais sóbrio. Ou, pelo menos, não tinha, ainda bebido que ele costumava fazer. Lembro-me que certa vez, ele um tanto sóbrio, falou-me do seu passado, sua meninice, sua juventude, seus encantos e desamores. Lembrou de uma dama por quem ele verdadeiramente se apaixonou. Amor de juventude, mas um amor virtuoso, cheio de encantos e de esperança. Eu até diria que aquilo sucedido nada mais era que uma espécie de melodrama. Um drama meloso, de mel. Era o que deixava entender o que Picula me contou. Disse-me ele que a dama era bela, aos olhos dele, cheia de encantos, perfumosa pois o seu cheiro encandecia por onde ela andava, em um local onde a mulher estivesse. Eu escutei com bastante atenção, vez que o homem não estava, ainda, tão embriagado assim. Ele queria falar da mulher deslumbrante, na qual ninguém podia se acercar um minuto sequer para não embrutecer o enigmático rapaz, naquele tempo, alinhado e bem tratado. Ele me contou que a jovem mulher tinha um sabor de nectar inigualavel. o seu perfume era embriagante e os dois apesar de tudo, namoravam, mesmo ela trabalhando em um bar como aquele que nós estavamos, onde damas passavam, olhavam, algumas, me sorriam como querendo furtar-me para longe dalí. E eu, com a minha formar de amar mulher com as que eu via, denotava a elas uma leve esperança. Enquanto isso, Picula contava o seu conturbado segredo. Segredo de alcova, segredo de amor.Não sabia ele que aquelas eram cartas que ja haviam passado de há muito e ele, naquele instante infindo apenas rogava um pouco de tranquilidade e de felicidade, de um sonho louco que na febre de dor ele deixou-lhe, no qual ofereceu-lhe um dia àquela amada em troca de uma ilusão perdida que ele ainda julgava ter. O tanto que ele queria era um pouco de bem que se fez fracassar para o eterno recanto onde se guarda os ninhos desfolhados cheios pranto a correr pelo vagar das imensas ondas.



Para mim, aquilo era uma eterna poesia cheia de mágua e de rancor de um pauperrimo coração feita por um notívago ébrio em plena luz do amanhecer. E ele continuava a contar com a sua voz trêmula motivada pela bebida que já vinha consumindo há um largo tempo. Ás vezes falava baixo, tão baixo que eu não ouvia direito. Era mais um ronronar contando tudo o que já havia passado em sua dura e incansavel precária existencia. Em outras ocasiões, o tom da sua voz era mais audível. Estavamos sentados à mesa do bar, em um cantinho afastado, encostados na parte de tras, onde havia logo fora, um monte de carcaça enferrujadas de carros, alguns imprestáveis, outros, somente a parte da cabine. E, Picula, entre uma careta e outra, falava-me do desamor por quanto já havia sofrido. A dama que ele se referia, partira, e ele não sabia do seu destino. Partira, tão somente, como o vente que açoita a pessoa sem essa nada poder fazer algo para a sua proteção.Nesse ponto da história, o bêbado verteu lagrimas dos maculados olhos, fundos como se quisessem naufragar na face alquebrada daquele homem. Menos homem. Mais um ébrio. Eu serví-lhe uma dose de bebida. Ele afastou o copo, como quem não quisesse. Apesar de oferecer-lhe a bebida, ele se negou a receber. Toda aquela história lhe deixara alquebrado e triste como se ele já tivesse tomado a bebida.


De um instante para outro, Picula procurou se levantar da cadeira, na verdade, um tamburete. Ele tentou, porém caiu ou sentou-se rápido, como quem desandava no tempo. A falta de equilíbro lhe fez impotente. É o caso de todos que começam a experientar o vício da bebida. Quando não mais se espera, vem o tombo levando ao chão aquele inveterado bêbado de todos os dias. Era assim, também com o jovem Picula. Jovem, porque ele não aparentava ter sequer 40 anos de vida.Por isso, ele era um jovem, apesar de ter aquele vício terrivel que tem todos que bebem.

Certa vez, um outro conhecido meu de Picula, havia me contado uma história triste: a história do ébrio Picula. Na verdade, esse meu conhecido, "Farinha com Sal", me dizia tão bêbado quanto estava, que o seu amigo tinha vivido uns tempos com uma dama de bar, de nome Clara. Eu ouvi e nada respondi. Então, "Farinha" começou a dedilhar devagar toda uma história quase que inacreditável. Soava como se fosse uma fantasia de um bêbado quando não tinha o que dizer. Porém, mesmo assim, eu ouvi o recitar de "Farinha", com toda aquela pausa que os bêbados constumam dar. Ele contou que já conhecia Picula há uma porção de tempo. Muito tempo, mesmo. Mesmo quando eles eram rapazes. Eles se conheceram alí por perto. Somente após um bom período é que "Farinha" veio a saber que ambos moravam no mesmo bairro. E, desde então se fomou uma amizade duradoura.
Quando o romance de Picula começo, então "Farinha" se afastou um pouco para não atrapalhar os dois enamorados. Disse-me "Farinha" que Picula era muito ciumento, mesmo sabendo que Clara trabalhava em um bar. Mas o ciume do rapaz era algo doentio. Um dia, os dois - Picula e Clara - foram morar juntos. Era um quarto de dois vãos. Uma sala e um quarto onde os dois se agasalhavam. E a mulher tinha uma menina de seus 7 anos de um outro relacionamento. Mesmo assim, Clara e Picula viviam bem. Era comum ver-se os dois caminhando para o bar, logo cedo da manhã, de mãos dadas, pareciam dois pombinhos. Então, Picula deixava a dama no bar e rumava para a oficina onde trabalhava. E viveram assim por um largo período de tempo, talvez anos. Foi daí que Picula começou a ter ciumes por causa de seu Manoel do Cigarro, um homem bem mais velho que ele, que se engraçou de Clara, pagando bebidas dia e noite para a mulher que quase não bebia e deixava o dinheiro no caixa, retirando depois uma parte. O restante ficava por conta do preço da bebida e um troco para a dona do bar, Alzira, era o seu nome.
Então, Picula começou a fazer malquerencia com Clara, por conta do homem, principalmente. Sabia ele que a mulher dava umas "voltas" com Manoel do Cigarro para conseguir dinheiro, pois o que fazia como garçonete, não lhe rendia muito. Tremendas brigas se formaram entre os dois até que Picula retirou Clara para viver em casa. Para ele, havia triunfado de vez. Por isso mesmo, por várias vezes, os dois foram beber em outro bar, comer peixada e viver felizes. E o tempo passou. Os anos se foram. Estavam sós, a dama e o cavalheiro. Quando não esperava, Picula, tomando as suas carraspanas, motivos para brigas imensuraveis entre ele e a mulher, um dia, ele chegou em casa e não mais a encontrou. Apesar de esperar até altas madrugadas, Clara não voltou hora nehuma. No dia seguinte, ainda cheio de bebidas, Picula procurou a mulher no bar de Alzira, não conseguindo resultado, com a mulher dizendo que fazia tempo que não via Clara. Passou o dia, com Picula sem trabalhar e sem ganhar também. Não conformado com a situação, ele voltou para casa e, por mais surpresa ainda, a mulher tinha vindo buscar a filha. Não disse nada a ninguém. Só levou embora a sua filha. Daí por diante, Picula desequilibrou e passou a fazer da vida um copo de cachaça. Nunca mais foi nada na vida. Nada, não. Era a forma de esquecer a sua desventura. Quando tinha uns trocados, pagava a bebida. Quando não, ele pedia aos outros ou se arranjava como sobras de copo. Manoel do Cigarro, nunca mais se ouviu falar nele.





quarta-feira, 15 de julho de 2009

RIBEIRA - 339

À SANGUE FRIO
- CONTO -
Quase 8 horas da noite e Otávio resolveu tomar um banho, pois o dia foi de muito serviço na sua oficina e, então, ele já estava exausto de tanto montar e desmontar motores de barcos à óleo diesel. O bairro estava todo ou quase todo escuro com um silêncio profundo, apenas quebrado pelo barulho intermitente do rio que amançava nas pedras suas águas mornas, num sacolejo de vai e vem, à toda hora. Era sinal de que a maré estava enchendo naquele ponto do destino. Do mar, só se ouvia o barulho das ondas, e nada mais. O trem de carga estava parado há um longo tempo, na rua, e nem o pobre do maquinista estava por lá. Enfim, tudo era calmo, apenas quebrado pelo marulhar das ondas pequenas e lentas do rio.
Naquele instante, Otávio empurrou a porta que dava para o banheiro, fazendo um grosso barulho como se estivesse há um largo período sem ser aberta. Dentro do banheiro úmido, assumia um cheiro desagradavel vindo do sanitário, uma peça que, de branca só existia o nome, pois, de todo, era encardida. Nesse instante, o homem puxou uma tira que servia à descarga, para ver se limpava a privada, cheia de urina dos homens que trabalhavam com ele. Tais homens - cerca de três - já haviam saído logo cedo, coisa de 5 ou 6 horas da tarde. Apenas ele ficara alí, consertando um motor velho que se quebrou porque não tinha mais jeito. O motor era de um barco que fazia tempo que estava anconrado à margem do velho rio de muitos outros barcos. Na oficina, tinha para além de 10 motores, uns já sem jeito para reparo. Logo a seguir, ouvio-se a torneira despejando quase em gotejo a água que, com certeza era o homem lavando-se das agruras do dia. Era uma lavagem que o homem fazia diariamente para tirar as maselas do seu corpo em uma oficina fétida e cheia de ratos, baratas e grilos. Para Otávio, nada daqueles ruidos provindos dos bichos tinha qualquer importância. Ele, só estava interessado em se lavar para tirar o mau cheiro do óleo que tinha penetrado em seu corpo já um tanto cansado. Havia que dissesse que, naquele velha estrutura física só existia óleo amargo, pois a água e o sabão não largavam em nada aquela inhaca grudenta e profunda que já vivia com ele. Quem não soubesse, Otávio estava pegado desde criança em motores dos mais antigos e modernos. No início, eram bravos motores de motos pequenas e barulhentas, de ensurdecer qualquer um. É que ele ajudava ao pai, que também era mecânico de alguma certa fama. Com o passar do tempo, Otávio enveredou por motores de maior ganho, como jeeps, jipões até que ele entrou no mercado dos barcos movidos à diesel. E já estava nisso há um tempão. Coisa de trinta anos.
Logo depois do banho, ele se enxugou com uma toalha feito um trapo, suja como todo aquele ambiente nauseabundo e procurou se vestir como se fosse um homem elegante, apesar das velhas roupas serem um farrapo, que de nada mais o serviçe. Na saída, apagou a lâmpada do recinto, puxou a pesada porta de madeira, trancou a feixadura e saiu de um modo todo alquebrado como se estivesse bêbado. Na rua, avistou alguns alcoolatras dorminhocos que se agasalhavam nas portas das casas de comércio, àquela altura, todas fechadas e bem seguras. Eram casas de vendas de objetos para de pesca marinha, armazens de algodão, cimento e madeiras, sem falar em escritórios de toda a espécie. Alí, os bêbados desprovidos de qualquer vergonha encontravam um canto para sossegar o sono.
Sem mesmo notar aqueles ébrios, e se notava, nao dava atenção, Otávio seguiu o seu caminho, em busca da casa da mulher amada, um apartamento tão desprovido da sorte como a sua dona, Emília, que habitava alí há alguns anos. Já perto do apartamento, Otávio notou que ainda estava funcionando - quem sabe! Por muito tempo ainda - o bar de Alcides, um homem parrudo, cheio de trejeitos, calças de suspensorios, camisa aberta ao peito, chinelas nos pés, com um palito escavacando os dentes, soltando um efeito como sendo um sonoro assobio, ao puxar uma farpa de algo que ele mastigara instantes antes.
Alí, Otávio bebericou um conhaque, enquanto uma dama-da-noite se acercava dele, se fazendo entusiasmada, chamando-lhe de "bonitão" e se agasalhando em seu colo, tecendo-lhe caprichosas tranças em seus parcos cabelos da cabeça. Diante de tanto afago, o homem se fez rogado, beijando-lhe os seios da inquieta dama-da-noite que soltava um estranho perfume de resedá por todo o seu corpo. Então, a mulher se viu sentida por aquelas doces carícias e se deleitou cada vez mais ao corpo do homem. Entre beijos e mimos, a dama sorriu como uma gata sorri quando está no cio. Eram todas imensas e inebriantes fantasias aqueles dolentes afagos que a dama fazia ao seu dono protetor de rápida ocasião. A mulher lhe pediu um drinque e o homem não fez segredo.Ambos beberam como dois eternos ébrios, sem nem notar as demais damas que passavam ao seu redor.
Trajando um vestido comprido, com a saia arrastando no chão, cheia de anaguas por baixo da veste, a dama, à certa altura, chamou o homem para que fossem dormir juntos. Porém, Otávio lhe negou o tendencioso pedido, pois a sua "mulher" lhe estava esperando. Por fim, a dama se mostrou satisfeira com um agrado que o homem lhe pôs nos seios. E disse, entre beijos e carinhos deleitantes que estava tudo bem, pois de outra vez não tinha escapatória. O homem, sorriu. Em alguns instantes Otávio saiu e foi direto para o seu - ou dela, Emília - apartamento bem curto e pequeno, como se fosse um local de bocecas de porcelana onde brincavam as meninas travessas.
Após subir uns degraus do primeiro andar, Otávio chegou ao apartamento. Antes, porém, uma cara de mulher abriu a porta para ver passar o homem que quase não fazia barulho ao galgar por entre o acesso até o seu aposento. Esse rosto desfigurado e esbranguiçado, Otávio nem chegou a notar. Era já alta hora da noite, coisa de 11 horas quando o homem chegou ao cômodo um tanto úmido. A mulher, Emília, estava postada junto a uma pequena janela que dava para a rua, olhando fixa, a porta onde o seu amante entrara. Não teceu conversa. E nem o homem.Ela estava como a esperar que Otávio entrasse e fosse deitar, talvez dormir. Por isso, o seu silêncio. Horas antes, Emília esteve na rua. Foi até ao bar onde viu, ao deleite, prazer suave e demorado, o seu homem ao agarro com a outra dama-da-noite. Ela esteve um tempo fora. Depois, retornou ao apartamento. Por isso, o seu jeito de guardar silêncio, sem discutir, à espera do amante. Com um instante, Otávio procurou o catre e, como já estava sonolento, dormiu como um justo. Nem conversou com a mulher que de sua altivez, também não fez contenda. Enfim, quando o homem adormeceu, ela golpeou com uma faca, dessas que se corta as partes maiores de carne ou do peixe, torceu o seu pescoço até sentir que o amante não mais resistia. Ela pôra um fim ao amásio cujo sangue derramou por sobre o leito, enxarcando por todo vasto apartamento. A cadeira que ela se sentara, caiu, num movimento qualquer feito pelo seu braço ou o braço de Otávio, no extertor da morte. Aquele era o fim do seu amado.

terça-feira, 14 de julho de 2009

RIBEIRA - 338

"DESTINO"
Depois de uma sessão que provocou risos na noite de sábado (11) entre os jornalistas no 2º Festival de Cinema de Paulinia, Lucélia Santos, a atriz e produtora de "Destino", chegou à coletiva de imprensa sobre o filme no domingo pronta para um linchamento. Porém, mediado pelo crítico de cinema e curador do festival, Rubens Ewald Filho, o debate foi menos duro do que o esperado, em parte por causa da rapidez de Lucélia em assumir logo no começo da coletiva todos os problemas do filme, evitando um confronto direto com os jornalistas.
A atriz e o produtor Diler Trindade narram todas as etapas do produção até que se chegassem ao filme exibido no sábado, o que explica, mas não justifica, o resultado final ter sido tão ruim. Inicialmente concebido como uma série de 25 capítulos, o formato do projeto precisou ser alterado para dois filmes e quatro epísódios para se adaptar às exigências de financiamento da ANCINE. Depois, para ser exibido no festival de Xangai, em junho, os dois filmes foram fundidos e apenas um. Acrescente-se a isso uma série de cortes impostos pelos censores da China em etapas diferentes do projeto e vários recomeço ao longo de 13 anos e chega-se ao que ao público de Paulinia assistiu.
"Isso foi o que eu consegui fazer. Não sinto nenhuma culpa" disse Lucélia. "É claro que gostaria de ter feito um grande filme, que gostaria de ter chegado à perfeição, com um roteiro perfeito, com uma história perfeita. Concordo que o roteiro tem inúmeros problemas e a direção poderia ter tentado costurar as vulnerabilidades de outra forma, mas tenho limites nesse caso. Não sou a diretora, sou a produtora", disse depois de questionada sobre o que achou da recepção ao filme na noite anterior.
"Coloquei nesse projeto um sonho, com compromissos assumidos. Tinha que concluí-lo da melhor maneira possivel. Se não o concluisse, isso ía virar uma lenda". O diretor Moacyr Góes não estava no Festival por compromissos familiares, segundo Diler.
Sobre as cenas "agressivas" de merchandising - foram ao todo 18 marcas, a maior parte concentrada no meio do filme, como em um constrangedor intervalo comercial que divide a história em duas - Lucélia reconhece o problema. "Se não fosse isso não tinha filme. Não posso tirar. Esses são os caras que puseram o dinheiro. Mas acho que podiamos ter pensado em algo mais sutil, mais integrado ao roteiro dramático".
Agora os produtores se concentram em tentar exibir "Destino" na TV aberta chinesa, o que, segundo Lucélia, representa um público potencial de 900 milhões de pessoas. Só depois vão tentar o lançamento em cinema e televisão no Brasil, mas ainda não sabem se o filme será lançado com as cenas mais violentas excluidas pela censura chinesa. E Lucélia promete que vai tentar levar seu filme a todos os festivais que puder. Como lembrou Diler no debate, se for um fracasso na China, ainda vão poder escrever no cartaz brasileiro do filme: "Já visto por mais de 20 milhões de pessoas".
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segunda-feira, 13 de julho de 2009

RIBEIRA - 337

NÃO SE PODE VIVER SEM AMOR
Diretor de "Proibido Proibir" (2006) e "A Cor do Seu Destino" (1986), o chileno radicado no Brasil. Jorge Durán, está finalizando o filme "Não se Pode Viver Sem Amor". Conhecido por seus roteiros como "Lúcio Flávio" (1977), "Pixote", (1981) e "O Beijo da Mulher-Aranha", 1984), todos de Hector Babenco, Jorge Durán se prepara para lançar seu terceiro trabalho na direção, "Não se Pode Viver Sem Amor". O filme, em fase de montagem, não é um projeto recente. O argumento foi escrito em 1999 e ganhou um prêmio do Ministério da Cultura. Quase dez anos, vários roteiros e uma longa dirigido depois, Durán pode retomar o projeto, que inicialmente se chamava "Á Sombra do Edificio". Jorge Durán declarou ter contado com a colaboração de Dani Patarra (roteirista de "Batismo de Sangue") para transformar esse argumento num roteiro. Foram vários tratamentos, até chegar num ponto que ele considerava maduro para filmar. O cineasta tem 67 anos e está há quase 36 do Brasil.
Com um elenco que inclui jovens talentos, como Cauã Reymond (Divã), Simone Spoladore (O Primo Basílio) e Fabiula Nascimento ("Estômago"), e veteranos como Rogério Fróes ("Vestido de Noiva"), o filme "Não se Pode Viver sem Amor" narra algumas horas na vida de um grupo de pessoas, pouco antes de uma ceia de Natal. "É um filme sobre pessoas e sentimentos à flor da pele. Ficamos mais sensíveis no final do ano, quando fazemos um balanço de nossas vidas. É quando afloram conflitos, a solidão fica mais evidente", descreve Durán.
Pela primeira vez, Durán fez um filme em digital. No começo, admite que estava receoso. "Fiz as contas e, para fazer em película, sairia muito mais caro. Eu tinha medo de filmar em digital porque o resultado final nem sempre corresponde ao esperado. Mas foi um aprendizado e uma surpresa. Gostei muito e agora só pretendo trabalhar com essa tecnologia", empolga-se. Embora não haja finalizado "Não se Pode Viver sem Amor", ainda sem distribuidora nem data de lançamento definidas, Durán já tem uma idéia para seu próximo filme, novamente como diretor. Pretende contar uma história que se passa no deserto do Atacama, no Chile, região onde mora sua filha. "Será sobre um brasileiro fora de seu contexto. Ele tem a vocação para a literatura, mas é um mecânico. Longe de casa, terá muitas experiencias de vida", antecipa Jorge Durán.
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domingo, 12 de julho de 2009

RIBEIRA - 336

MARIA DE OLIVEIRA
- "MARIA BOA" -
Agora, falo de uma pessoa que nunca a conhecí e, se alguma vez, na rua eu a ví, digo que não sabia quem era ela. Porém, de saber o seu nome: Maria de Oliveira Barros, nascida no dia 24 de junho de 1920 - véspera de São João - e que faleceu no dia 22 de julho de 1997, na Casa de Saúde São Lucas, à uma hora da madrugada, vitimada por um AVC - Acidente Vascular Cerebral - mais conhecido com o nome de "trombose", entupimento da veia do cérebro - trombo. Esta senhora, quando murreu, com 77 anos, era conhecida no Brasil e no mundo como sendo "Maria Boa", dona de um lupanar de verdadeiro luxo e belas artes, cheio de enfeites, de coisas bizarras, luz-e-sombra por seus recantos e corredores, toalhas e água para atender aos clientes, além de bebidas de fino gosto.
Maria de Oliveira Barros chegou à Natal - Rn - trazida por Nezinho Fernandes, um farto negociante aqui estabelecido para ser doméstica em sua casa. Foi o próprio Nezinho com quem teve a primeira conjunção carnal e, para não alarmar a família, o homem a colocou em uma casa, dando-lhe roupas e comida, Maria de Oliveira tinha apenas 20 anos de idade. Ela nasceu em Campina Grande - Pb - e, em Natal, ficou para sempre. Os relatos não falam de sua família.
Depois de amante de Nezinho Fernandes, ela compreendeu o seu destino. Já era mulher-da-vida e, então passou a viver com outros homens, inclusive com o nobre Dr. Manoel Vilar, oftalmologista e renome e único da cidade do Natal. Daí em diante, sabendo bem pouco ler e escrever, valendo-se da sua juventude e beleza, com o gosto apurado pelo cinema, a música e mesmo a literatura, dona de uma inteligência farta, Maria Barros procurou estabelecer a sua sina, frequentando o Grande Hotel, modelo de requinte e luxo, único na cidade, uma vez que os demais hoteis então existentes não passavam de simples pensões.
Daí por diante, Maria Barros, chegando no auge da II Guerra Mundial, fez a vida de prostituta. Alguém lhe disse que ela era uma mulher decente, uma prostituta de linhagem. Era uma boa mulher. Para todos os efeitos, frequentando o salão do elegante e esnobe Grande Hotel, não tardou em ser chamada por "Maria Boa", não por atrevimento, porém por uma delicadeza, uma cortezia dos que "sairam" com ela. Maria Barros ouviu uma voz que lhe disse: "Você pode montar um cabaré na cidade". Nesse tempo, casas noturnas nãp havia por esses lados. Maria pensou e procurou uma casa retraída que lhe servisse de bordel. E, tão logo se instalou na cidade, buscando as moças do interior da Paraíba, Pernambuco, Piauí e mesmo Rio Grande do Norte, ela passou a divulgar entre os homens que preferiam o Grande Hotel, local de esmero e requinte, que já podiam procurar o cabaré de "Maria Boa", primeiro de Natal. E, desde esse afortunado período, durante a Guerra e depois dela, o randvous da cafetina mulher ganhou fama, vindo homens até mesmo do exterior, com França, Tchecolovaquia, Espanha e, por que não dizer, Estados Unidos e do próprio Brasil. Vinham eles conhecer os mistérios revelados à meia-luz entre gritos e sussurros pelas damas da noite, mulheres doutas em fazer o homem gemer.
Maria Boa se firmou na cidade e chegou a desfilar, durante o período do caranaval, em um carro conversível, por volta de 1950, na companhia de Antônio Farache, um graduado homem de negócio da capital, figura de tradicional família aqui residente - a família Farache que abriu a Rádio Poty de Natal e fundou o time do ABC F.C..
Maria Barros permitia aos taxistas estacionar no interior do seu bordel, onde o motorista levava para casa ou mesmo o Grande Hotel, em cliente depois de viver momentos de orgias. Pelo cabaré de Maria Boa passaram as mais formosas e encantadoras divas que já podia se ver por Natal. Eram todas escolhidas a dedo, por assim dizer. As damas da noite tinham residência para morar, fora do cabaré, bem perto de onde atuavam. Durante a II Guerra, os aviadores aquí sediados colocaram no bico de um B-25, o mais moderno avião em operação naquela época, o nome gravado de "Maria Boa". Ela não acreditou nessa façanha até que foi chamada para ver de perto o aparelho que trazia o seu nome. Um sargento da Força Aérea Americana tirou uma foto de Maria Boa, ela inteiramente nua. Esta foto, um tanto desbotada, se encontra na Base de Fortaleza, Ce, onde sempre no dia 22 de abril há uma ferrenha competição de aviadores e atletas disputando torneios que puseram o nome da bela e incandescente mulher: Maria Boa.
Maria de Oliveira Barros teve, pelo menos, um filho que durante muito tempo trabalhou em taxis, na capital. Estudantes dos diversos Cursos da Universidade Federal fizeram um trabalho, entrevistando a própria mulher, enfocando a época aurea de Maria Boa. Tais trabalhos acadêmicos fizeram daquela simples protituta um "Mito", pois abordaram o fenômeno da protituição até mesmo infanto/juvenil. Os estudos mostraram o desenvolvimento físico e psicossocial dos nossos jovens quando os bordeis funcionavam em Natal.
Pelos ídos anos de 1990, via-se Maria Barros caminhar de manhã cedinho do calçadão da praia do Meio, acompanhada de uma antiga amiga. Mulher de falar bem, como uma dama de escol, Maria Barros não revelava ser, nos fins de sua vida, a plena meretriz que, um dia chegou a ser. Reprimida pelas senhoras donas, ela não se importava com o que podiam pensar do seu comércio. pois frequentava a sua casa os homens mal-amados, distantes das suas esposas. Maria Barros contava com amigos e clientes. Era uma dura vida para a mulher. No fim, era ela uma respeitavel mulher sem nada a reclamar. Polítos, empresarios, estadistas eram os seus clientes. Sua morte, no dia 22 de julho de 1997, passou ignorado pela sociedade, onde as donas de casa mostraram um alívio com o fim de "Maria Boa", a mulher fatal.

sábado, 11 de julho de 2009

RIBEIRA - 335

ARROZ AMARGO
Silvana Mangano nasceu em Roma, Italia, em 23 de abril de 1930. Após o casamento com o produtor Dino De Laurentiis trabalhou com os nomes mais importantes do cinema italiano: Federico Fellini, Vittorio De Sica, Alberto Lattuada, Marco Ferreri, Pier Paolo Pasolini, Franco Zeffirelli, Tinto Brass e Luchino Visconti. Ela começou no cinema bem jovem, com apenas 16 anos, e em 1948, aos 18 anos, chegou ao estrelato pelo papel principal em "Arroz Amargo", do diretor italiano Giuseppe de Santis..
Silvana Mangano trabalhou com os mais importantes diretores italianos e europeus e foi um símbolo do cinema neo-realista italiano. Se casou com o produtor cinematográfico Dino De Laurentiis e teve quatro filhos: Veronica, Rafaella, Federico e Francesca. De personalidade bastante reservada, ela foi definida pelo diretor Alberto Lattuada que a dirigiu mais de uma vez, como "uma mulher cuja beleza é um resumo de classicismo e modernidade. Uma imagem na qual há toda a essência da grande pintura do século XV, mas que também poderia servir de modelo para os mestres modernos".
Seus filmes mais marcantes, além de "Arroz Amargo" foram "Teorema", "Morte em Veneza" e "Violência e Paixão", os dois últimos de Luchino Visconte. Ela morreu vítima de câncer no pulmão e era uma fumante inveterada. Silvana Mangano fez 40 filmes e ganhou seis prêmios por filmes que fez, dentre os quais "Morte em Veneza" e "Ouro de Nápoles". Sua morte ocorreu em Madri, na Espanha, no dia 16 de dezembro de 1989.
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RIBEIRA - 334

"À DERIVA"
Com a primeira exibição no Brasil de "À Deriva", de Heitor Dhalia, começou na noite desta quinta-feira, (9), o 2º Festival Paulínia de Cinema. Primeira produção internacional da carreira do diretor pernambucano radicado em São Paulo, o filme havia tido sua première mundial no Festival de Cannes, em maio passado, dentro da mostra Um Certo Olhar. Diretor de "Nina" (2004) e "O Cheiro do Ralo" (2006), Dhalia selecionou dois atores internacionais para integrar o elenco deste seu terceiro trabalho - o francês Vincent Cassel ("Instinto da Morte", em cartaz no Brasil) e a norte-americana Camila Belle. Ambos falam português. O ator francês porque visita frequentemente o Brasil a passeio e a atriz norte-americana por ser filha de uma brasileira. Nenhum dos dois esteve presente à sessão de Paulínia, que aconteceu no Theatro Municipal da cidade, com 1.300 lugares, e foi bastante aplaudida. O filme tem previsão de estreia em 31 de julho.
Com roteiro assinado pelo próprio Dhalia e Vera Egito, "À Deriva" retrata a crise vivida por um casal (Vincent Cassel e Debora Bloch), mostrada pelos olhos de sua filha mais velha, a adolescente Filipa (foto) - a estreante Laura Neiva, com 14 anos na época da filmagem. Há no filme uma sugestão de atração erótica entre a garota e o próprio pai - que está vivendo um caso com uma amante (Camila Belle). Na coletiva do filme, na tarde de ontem - sexta-feira, 11 - o diretor comentou o assunto. "Isso é construído no filme de maneira muito delicada, muito sutil. A gente nunca quis reforçar este aspecto". Dhalia destacou ter consultado vários psicólogos para poder abordar este tema e também a competição entre mãe e filha, outro detalhe importante no desenvolvimento do conflito familiar.
Para o diretor, seu filme não é sobre incesto e sim "sobre uma família". Ele destacou que a história incorpora diversos aspectos pessoais, embora não seja autobiográfica. Como a personagem de Filipa, Dhalia morou numa praia e vivenciou a separação dos pais aproximadamente com a mesma idade da protagonista. Presente à coletiva, Débora Bloch afirmou considerar sua personagem "muito tocante". E acrescentou: "Ela é uma mulher da minha geração. É muito bom conhecer a história que se está contando". Para ela, contracenar com Vincent Cassel foi igualmente muito agradável. "É muito facil trabalhar com ele. Além de ser um grande ator, é uma pessoa que se integra a toda a equipe", elogia. Ela frisou que a língua nunca foi uma dificuldade por Vincent, porque "ele fala muito bem o português, melhor ainda do que se ouve no filme".
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sexta-feira, 10 de julho de 2009

RIBEIRA - 333

BEM VINDO
Ao ser lançado na França, em março de 2009, o filme "Bem-Vindo", de Philippe Lioret, causou polêmica. O motivo foi denunciar os problemas legais criados por um professor de natação francês, Simon, pelo fato de ter abrigado e ajudado um imigrante ilegal, o jovem curdo Bilal. A produção estreia apenas em São Paulo. Na estreia dessa polêmica, o Partido Socialista francês redigiu um projeto de lei batizado de "Welcome", título original do filme, em que propôs a supressão do chamado "delito de solidariedade". Trata-se dos artigos de Código de Entrada e Estadia de Estrangeiros, que penalizam com prisão de cinco anos e multa de 30 mil euros quem ajudar, transportar ou abrigar qualquer imigrante ilegal na França.
Simon, professor de natação, faz tudo isso por Bilal, jovem curdo que procura há meses chegar à Londres, para reencontrar a namorada, Mina. Acaba de chegar a Calais, França, num campo de refugiados e não tem nem dinheiro nem permissão para seguir viagem. Divorciado, Simon sofre de um desespero amoroso semelhante, pois não consegue esquecer a ex-mulher, Marion.
O improvável encontro entre esses dois homens oferece a oportunidade para que o diretor Philippe Lioret construa uma crônica sólida de como a intolerancia contra os imigrantes se manifesta nos dias de hoje no continente considerado como o berço da cultura e da civilização; a Europa - cujo progresso econômico atrai sem cessar estrangeiros de todos os pontos do planeta.
Há um comentário político em cada cena do filme, mas ele não se traduz em nenhuma forma de discurso. O roteiro cria contexto para seus personágens com riqueza de detalhes não raro incômodos. Assiste-se à tentativa de Bilal e outros imigrantes ilegais de atravessar a fronteira francesa, escondidos num caminhão. Para passarem pela fiscalização, precisam enfiar sacos plásticos na cabeça e prender a respiração por alguns minutos - caso contrário, os sensores dos fiscais identificam o gás carbônico liberado. Bilal não aguenta e, por isso, ele e os companheiros são presos. Não sem antes ganharem números gravados com tinta indelével em suas mãos, detalhe que lembra os campos de concentração nazistas.
Liberados temporariamente, depois disso, para circular na cidade de Calais, os imigrantes de pele morena são destratados a cada passo. São mesmo impedidos de entrar em supermercados, ainda que mostrem seu dinheiro. Uma situação que perturba pessoas como Marion, a ex-mulher de Simon, uma voluntária especializada em assistência social a esses estrangeiros deslocados, sem futuro à vista.
Aparecendo na academia onde Simon leciona em busca de aulas de natação, Bilal tem um plano secreto: atravessar a nado o canal da Mancha e chegar a Londres a tempo de impedir o casamento arranjado para a sua namorada pelo pai dela. De nada adianta o professor advertí-lo sobre os perigos da jornada, que dura dez horas ou mais, em água gelada e sob risco da travessia de grandes navios. O paralelismo da angústia dos dois homens que, apesar das diferenças, encontram território comum para uma troca de experiencias, é o ponto alto do filme, que recebeu três prêmios no Festival de Berlim 2009 - melhor filme europeu da mostra Panorama, além dos troféus de Juri Ecumênico e da Lable Europa Cinemas.
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quinta-feira, 9 de julho de 2009

RIBEIRA - 332

ENTRE LENÇÓIS
O filme nacional "Entre Lençóis" trata de uma história de amor à primeira vista. A trama conta a história de Paula e Roberto, um casal jovem, bonito e atraente que se conhece em uma boate e, sem trocar muitas palavras, vai parar em um motel, onde passam toda a noite. "Todo mundo vive isso em algum momento: conhecer uma pessoa e querer transar imediatamente com ela", argumenta o diretor colombiano Gustavo Nieto Roa, que assina a sua primeira produção no país. "E para viver esses dois personagens, eu escolhi dois atores muito bons, nacionalmente conhecidos e muito bonitos", diz Roa. O filme foi rodado entre os meses de maio e junho de 2008, e quase todas as cenas foram filmadas em um quarto de motel, no Rio de Janeiro. Além de protagonistas, Gianecchini e Paola são os únicos atores do elenco, por isso os dialogos ganham grande destaque no roteiro, escrito por Renê Belmonte. "Este é um filme sobre a possibilidade de ser inteiro, de se jogar numa relação, descobrir alguém, sem o compromisso de aprofundar nada", comenta Giannecchini. "Todo mundo deveria ter a chance de viver uma experiencia como essa, de se apaixonar intensamente apenas por uma noite", completa.
Em seu primeiro longa como protagonista, Paola Oliveira conta que ficou à vontade para fazer as cenas de nudez."Cabia perfeitamente no texto. Dexei o pudor totalmente de lado", disse a atriz.
Um dos mais populares diretores de cinema em seu pais, Gustavo Nieto Roa é natural de Tunja, na Colômbia, e cultiva uma paixão antiga pelo Brasil. Esteve aqui pela primeira vez em 1965 documentando a recem-inaugurada capital federal. Na época, era diretor e produtor do departamento de Cinema e Televisão das Nações Unidas, em Nova York, para o qual trabalhou até 1972. Nesse período, viajou pela América, Europa, África e Ásia produzindo e dirigindo documentários para o seriado da NBC International Zone. Roa sempre quiz fazer cinema de ficção e, por isso, voltou à Colombia para se inteirar das suas necessidades. Atualmente, Roa desenvolve projetos de longas-metragem no Brasil, México e Colômbia. Em seus planos para 2009 incluem ainda a consolidação de uma produtora de filmes no Rio de Janeiro e pelo menos dois filmes realizados por ano aquí.
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