domingo, 31 de outubro de 2010

AMANTES - 14 -

- Débora Falabella -
- 14 -
E foi com surpresa que Silas Albuquerque tomou ao chegar ao seu escritório naquela manhã de inicio de ano. A placa havia sido mudada e então estava o seu nome e em baixo: DIRETOR. Ele estremeceu apesar de já ter sido dito por Vera Muniz que havia ele sido promovido a Diretor. A jovem dama ainda não chegara ao seu escritório ou estaria a fazer negócios em outros Departamentos da Organização. E agora, Silas Albuquerque era o novo Diretor. Mesmo assim, ele não saberia dizer a quem teria que dirigir. Se acaso fosse o titulo de Jornalista, assim mesmo não caberia também ser um exemplar Diretor. Ele sorriu por conta do chamado Diretor pois assim seria alguém e não apenas um jornalista. E então, Silas se lembrou de antigos e notáveis jornalistas cuja função era de apenas jornalismo. Algo ascendeu em seu interior ao ver o seu nome acrescido por Diretor. Um instante parou acima de sua mente. E se lembrou de Verinha, a mulher menina, garota, jovem e, com certeza, moça. Ela estaria por trás de tudo o que lhe acontecera no real momento.

Então, Silas Albuquerque passou a ser o novo Diretor de qualquer coisa. Ele era acostumado a dizer que um dia seria também o diretor, um executivo de algum negócio da vida. No instante em que pensava naqueles triviais momentos, chega-se por trás a mulher que lhe era amada. Fez cócega nele e indagou:

--- Que tal? – sorriu amplamente Vera Muniz.

--- OH. (sorriu o homem e disse) – Por trás de um homem sempre está uma grande mulher. – sorriu Silas ao dizer tal costumeira frase.

Vera Muniz sorriu e disse que ao seu tempo ele saberia acreditar no que estava olhando.

--- Ao trabalho moleque. – sorriu Vera passando a mão da barriga mostrando que ali tinha um filho seu e precisava então trabalhar.

Em determinados momentos, Silas Albuquerque foi notificado de uma reunião entre todos os Diretores da Organização. Estaria presente o seu presidente Diogo de La Vega acompanhado da vice-presidente, Vera B. Muniz. Assuntos em pauta: o novo Diretor e as filmagens de Rio das Contas. Era o mês de janeiro, aquele. Data máxima para se fazer as filmagens de locação no interior da Bahia. As equipes de filmagens tinham sido deslocadas para a região da Chapada Diamantina, mesmo sem o acompanhamento do restante do pessoal, inclusive Vera Muniz e Silas Albuquerque. Nesse encontro foi definido o esquema para a produção. O restante do pessoal ficaria no Rio das Contas com os cinegrafistas e quando tudo terminasse, no prazo de quinze dias, já havia outro esquema para ser cumprido. Porém, isso, o presidente La Vega não quis adiantar.

As equipes de filmagens e demais componentes já estavam todas em Rio das Contas. Inclusive Silas e sua amada, Vera Muniz. Os trabalhos andaram rápidos com filmagens in loco do rio, das lagoas e das cachoeiras. Era tudo muito belo e aconchegante se não foram o sol escaldante que fazia capaz de derreter toda e qualquer espécie de vida. Vera se angustiava pelo calor. Não raro deixava de ir para os locais de filmagens para se acomodar em tenda armada para as equipes de filmagens. Silas era quem mais sofria com isso. A toda hora ele estava a procurar pela amante e lhe reservava um copo de água ou de algo parecido com laranja. Ela as vezes não queria. Porém, assustado, Silas fazia dengos a amada e findava com ela a beber um pouco de líquido. Era mesmo um sol causticante aquele a beira do rio. Tinha momentos que não se podia nem filmar com tanto calor abrasador. Temiam-se defeitos nos equipamentos. O diretor das filmagens era um homem de seus cinqüenta anos. Ele não parava de reclamar. Os mosquitos ferroavam a todo tempo, de modo principalmente quando o sol se punha e o frio era igualmente mais temeroso. De dia fazia sol e calor. De noite era a vez da frieza. Nesse tempo as equipes passaram quinze dias até voltar a cidade. Um cinegrafista e seus ajudantes ainda ficaram na região fazendo tomadas. Porém, o restante do pessoal voltou esfogueado de vez para a capital do Estado. De todos, Vera Muniz era a que mais sofria pelo calor, até mesmo em Salvador, a capital.

--- Que horror? Isso é terra de ninguém? – reclamava um dos assistentes.

--- Ora já se viu! Imagine os cangaceiros que viveram nessa parte do Estado. – respondia outro.

O Estado da Bahia era todo um só. Quando chovia – o que não aconteceu durante as filmagens – era só o aguaceiro torrencial. Quando não, era sol terrível. Meninos se podia ver descalço, trajando molambo, à cata de alguma arribação pelo sertão do interior tornado seco. Crianças paupérrimas residindo em casa de barro batido. Em outros instantes, por acaso e entre matas e rochas viam-se moças arranjadas com trajes baratos levando trouxa de roupa por cima das suas cabeças, algumas a cantar toados simples e rudes pelos então velhos cangaceiros. Ou modinhas de sertanejos bem populares no velho sertão. Mulheres de idade média entoavam em seu caminhar os mesmos cantos de sempre e de todos os dias e de todas as horas. Os tropeiros eram homens rudes. Eles caminhavam longas léguas tiranas com foice e outros instrumentos de corte nos ombros e nas mãos. Alguns levavam espingardas de caça. Outros não levavam nada. Os meninos, armados de bodoques, matavam algum bicho para comer a qualquer hora. Eram nambus, cotias ou mesmo rolas do mato. Essa era a sina do sertanejo. Para se bem dizer, a filmagem locou em partes da região onde tinham serras bem altas de um lado a outro. Na depressão, havia planície.

Quando as filmagens foram concluídas nova reunião foi de certo convocada pelo presidente da corporação. Nessa ocasião era para tratar de outros temas. E ficou decidido que a vice-presidente da organização Vera Muniz, devia ir a Viena para ser empossada como Presidente em definitivo, pois La Vega seria transferido para outro País. Com dois meses de gravidez, a moça foi pego de surpresa. E todos os diretores presentes também ficaram surpresos. Silas, o amante de Verinha, teve a maior surpresa de sua vida. De um modo ou de outro, a questão foi encerrada e a viagem de Vera Muniz fora definitivamente marcada. Houve um, porém:

--- Eu solicito de todos os diretores a permissão para levar comigo o Diretor da organização, senhor Silas Albuquerque. – declarou a nova Presidente em exercício.

Houve silencio total. E foi quebrado apenas pelo antigo presidente da organização, Diogo de La Vega ao se referir naquela ocasião:

--- Permitido. – declarou o presidente demissionário, De La Vega.

E os demais diretores aplaudiram a decisão.

Vera Muniz e Silas Albuquerque partiram do Rio de Janeiro em avião de carreira com terminal em Paris, na França. Eles aproveitaram a viagem para visitar Museus, praças, Igrejas, cafés entre outros aspectos que, por ventura, Silas não conhecia. Foi um dia inteiro de visitas até que os dois pegaram um trem para Viena, na Áustria. A moça estava grávida e, dado esse motivo, ela necessitou ir ao banheiro do trem por mais de uma vez. O terno amante de Verinha sempre estava preocupado por seu estado por tal motivo. E sempre que Vera Muniz voltava do gabinete, Silas olhava para Vera e então perguntava:

--- Tudo bem? – perguntava Silas do modo preocupado.

--- Tudo. – sorria Vera ao modo.

E assim seguiu a viagem. Silas, delirante com a paisagem e a cada instante chamava a atenção de fazendas, gado, homens a trabalhar e também o transito de carros, caminhões, tratores entre todos os casos onde se podia ver na estrada. Vera, ao lado da janela do trem, apenas vislumbrava aquilo que já avistara em outras ocasiões. O sono adormeceu a mulher. Por longos momentos ela estava a dormir. Enquanto isso, Silas olhava todo o esmerado panorama até então desconhecido para o rapaz. E ele se lembrou de trágicas ocorrências que por ali se deu em tempos remotos. A II Guerra era tudo o que lhe vinha à memória. Os soldados em seus carros a trafegar pelo mesmo local que então não mais se notava. Jipes, motos, carros tanques e outros recursos da Guerra. Onda de medo. Terror. Ele igualmente trazia em sua memória o passado de um povo tão resistente.

Outras pessoas no trem conversavam em línguas estranhas. Talvez alemão, provavelmente. Ele apenas escutava os sorrisos de algumas pessoas alheias ao que se passara naquela modesta província em meio do ano de 1940. Veio-lhe a vontade de fazer um inominável alarde terrível para o pessoal entre vaias e apupos. E ele nada fez. A cidade de Viena havia chegado. Avenidas largas e arborizadas. Esse era o panorama que Silas descortinava. Prédios imponentes. Palácios, museus e calçadas repletas de elegantes cafés e restaurantes. Gente bem vestida. Silas ouvia sempre dizer que Viena era a décima maior capital da Europa, episódio que ele não acreditava. E tinha o terceiro nível de padrão de vida. Os majestosos prédios impressionaram Silas a todo instante. Feiras ao ar livre era algo que impressionava o rapaz. A cada passo Silas sentia-se maravilhado ao lado de sua querida Vera Muniz que naquela cidade assumiria a condição de Presidente da Organização Pomar. Entre risos e lágrimas, o homem fez os mais amplos idealismos a Viena. Doces, bolos e tortas enchiam os olhos e a boca do rapaz sem ver qual seria o costume do povo vienense. E a Catedral Católica dedicada a Santo Estevam era um monumento colossal. O Danúbio era sem sombras de dúvidas o braço que envolvia a cidade a todo custo. Silas retomou ao que teria que fazer da cidade imperial e decidiu ficar por longos tempos a percorrer as ruas e então reportou a Vera que seria melhor os dois se encontrarem na Catedral de Santo Estevam após Vera ter a reunião para qual foi convidada no Palácio das Nações. E Silas aproveitaria para ver de perto o cemitério dos desconhecidos, um parque existente em um dos lados da cidade onde eram sepultados os pobres ou pessoas cujo nome não se sabia. Ele andaria de charrete e veria o Museu de Bonecas além de ver o mais famoso relógio da Cidade. Esse era o relógio de Anker. No centro da cidade podia-se comprar alguns locais de artigos domésticos, entre frutas e legumes.



sábado, 30 de outubro de 2010

AMANTES - 13 -


- 13 -

O velho ainda começou a caminhar quando Silas, de repente, teve a idéia de chamá-lo para uma conversa mais aprofundada, seguindo por todos os caminhos que o velho traçou até a sua última vez. Por ter perdido um amor, não era o suficiente para se transformar uma estória de acordo com a necessidade de um pleno documentário. Além do mais teria Silas de argumentar todos os conceitos dessa estória e fazer da mesma uma eloqüente marca capaz de suscitar o apogeu da pela consciência humana. Silas teria que ver os pormenores da fase do homem até o ponto em que chegou ao descrédito da sociedade. Alí estava uma lenda viva para todos os efeitos. Tinha-se que se buscar algo de maior valor para sagrar a confirmação de Molambo. O velho não precisaria a aparecer na tela. Era bastante contar a sua estória e um ator fazer a vez do velho. Então, era preciso desencantar o seu verdadeiro sentido heróico. E era necessário se conversar por mais tempo com o velho e ver quem ele era em suma na verdade. Vera Muniz ficou impressionada com a estória do velho Molambo e fez questão de seguir a todo custo sua empreitada.

--- Eu nasci aqui. Mais à frente. Do outro lado do rio. - explicou o velho Diomedes.

Os amantes prestaram mais a atenção no que Diomedes tinha a falar. E assim ele disse. Quando nasceu, todos os moradores do lugar, chamado Coqueiros, tomaram conhecimento de Diomedes. Ele ali nasceu e cresceu até nove anos de idade quando saiu para a capital em companhia de sua mãe, lavadeira de roupa de gente rica. E Diomedes se matriculou em uma escola de dona Ritinha para aprender as primeiras letras. Quase todo o final de semana, ele e sua mãe voltavam a Coqueiros para fazer serviços domésticos em sua própria casa. O seu pai era pescador e, nas horas vagas, bebia cachaça. Isso, quando estava em terra. Ele, Diomedes, vivia uma vida simples e desde cedo conheceu Otacília, apelidada por Cila. Quando ele estava na vila, sempre conversava com Cila. Porém, nesse entretempo surgiu outro amigo conhecido de Diomedes que mantinha interesse em Cila. O seu nome era José Macedo, filho também de pescador. Mesmo assim não havia arega entre os dois apesar de, com o passar do tempo Diomedes sentir certa atração de Macedo por Cila. Mesmo assim, Diomedes não ligava para o caso. Quando estava na capital, além de estudar, mantinha a função de carregador de frutas nos caminhões que faziam viagens de outros municípios do Estado. No final de semana sempre costumava a voltar a Vila de Coqueiros. Em certa ocasião havia um baile na Vila e Diomedes dançou com Cila. Dessa dança surgiu o namoro. Isso despertou o ciúme em Macedo. Certa vez, Macedo disse a Diomedes que era melhor ele acabar o namoro, pois Cila seria dele. Diomedes sorriu e não levou nada a serio. Com o carregar dos caminhos, Diomedes aprendeu a dirigir os carros. E com o tempo passou a fazer viagem para o interior dirigindo caminhão. O namoro com Cila continuava firme a despeito do ciúme de Macedo. Certa vez, Diomedes comprou um caminhão. Então ele fazia as próprias cargas, não mais trabalhando para alguém. Namoro firme com Cila e fazendo carrego de frutas nos dias de semana. Com isso houve o progresso. Marcou-se o casamento. Bebidas, comidas, roupas para um rapaz e vestido de noiva para Cila. No dia do casamento, quando a moça caminhava para o altar, veio Macedo e fez o disparo com uma garrucha. Foi morte certa para a virgem. O pessoal, revoltado, agarrou na hora José Macedo e o estrangulou. Era o fim do malsinado vingador. Houve o sepultamento de Cila e desde aquela data Diomedes caiu em depressão. Foi internado no Hospício e depois daquele tempo nunca mais foi um homem para qualquer negócio.

--- Eu fiquei meio varrido da bola. – explicou Molambo de forma triste.

--- Porém, quando conheci o senhor, não vi nada que me dissesse que então o senhor fosse desequilibrado. Apenas o senhor se vestia em trajes desiguais. – falou Silas sem alegria.

--- É. Tem razão. Mas a minha cabeça não coordenava o corpo. – sorriu o velho entristecido.

--- O senhor vivia tempos naquele barraco! – soletrou Vera ao homem.

--- É. Vivi ali, em outros cantos. E só de uns tempos para cá eu vim para viver com a minha família. A minha mãe ainda vive. Meu pai morreu há muito tempo. – falou o velho entristecido.

--- Mas, por que o senhor não veste traje mais em conta? – indagou Vera querendo forçar novas respostas.

--- Estou bem com esses. – sorriu Molambo um pouco mais alegre.

--- Sei que está. Sei que está. Mas se o senhor recebesse roupas novas não vestiria? – indagou Vera ao velho.

--- Não paga a pena. Eu, antigamente, depois que minha noiva foi morta, tive muito tempo no Hospital. Depois sai e fui morar na casa do pessoal que a minha mãe lavava roupa. E ali me deram roupas. Muitas roupas. Porém então me veio à tristeza. Eu rejeite tudo. – argumentou o velho Molambo.

--- É danado! Mas o traje de noiva ainda está guardado? – perguntou o rapaz Silas.

--- De Cila? Ah esse nunca esqueço. Vai comigo para dar a ela onde estiver. – chorou Molambo.

--- Vamos fazer um acordo! Eu lhe dou roupa e comida e o senhor me conta toda a sua historia da vida. – falou Silas com obstinação.

--- Não paga a pena. Eu volto depois a ficar do mesmo jeito. É porque já fizeram isso comigo. E não valeu a pena. – ressaltou Molambo.

--- Tente de novo. Talvez a sua noiva esteja querendo isso dessa forma: mudar de roupa! – sorriu o rapaz para o velho.

O velho chorou mais uma vez. As lágrimas desceram no seu temido rosto cheio de barbas. A face suja do velho encobria o que lhe restava de se ver. Afinal, depois de um longo tempo, o velho falou resistente.

--- Eu vejo a minha amada Cila. Ela sempre volta. Faz dias que não vem. Mas sempre volta. Ela não quer que eu mude de traje. Ela só pede que eu vá pra junto dela. – falou o velho a chorar.

O tempo passou e os amantes retornaram ao Ap de Vera Muniz. Ela dirigia o veículo. E chorava muito por toda aquela aflição de Diomedes. O rapaz, Silas Albuquerque, enternecia a jovem para sufocar seu desassossego. Não valeria a pena se chorar por causa de uma desavença de amor de outras pessoas. Afinal, ele não era o único na vida. Casos como o de Diomedes havia em muitos lugares, por certo.

Os dias passaram sem novidade. Certa ocasião Vera Muniz saiu do banheiro do seu Ap alegre por demais. Ela havia vomitado bastante quando por lá esteve. E na volta, só havia alegria para repor ao seu amante. Vera temia em dizer por que não sabia bem o que ele responderia afinal. Porém, a moça indagou do rapaz:

--- Tenho duas notícias! Uma boa e outra ruim! Qual eu digo em primeiro lugar? – relatou a moça ao rapaz.

--- Qualquer uma! – sorriu o rapaz.

--- Bem. Vai à primeira. A boa. Você foi promovido ao cargo de Diretor da organização. – sorriu Vera ao dizer tal noticia.

--- Viva! Mas logo eu? Agora que me formei em jornalismo? Essa é demais! – sorriu em altas gargalhadas o jovem Silas Albuquerque.

--- Não quer saber nem mais a outra? – sorriu Vera se recostando no divã onde estava o seu amante.

--- Quero. Mas não me diga que eu vou viajar! – sorriu Silas.

--- Não. Não é isso. A questão é que você vai ser pai. – sorriu a moça em deleite.

--- Arra merda! Você? Grávida? Não é possível!!! Agora tudo se modifica!!! Eu não quero mais você trabalhando!!! Nem viajando!!! – ressaltou o rapaz de forma impetuosa.

--- Besteira! Quem vai ter o filho sou eu! – sorriu Vera ao dizer tal proeza.

--- Eu sei. Mas precisa tomar tôo o cuidado. Não viajar. Deixa de lado esse negócio de Turquia. – relutou o rapaz vendo sua amada de forma divinal.

--- Não é Turquia, querido. É Capadócia. Fica na Turquia. Mas é aqui que vamos filmar a nossa Capadócia. E é apenas a região da Chapada Diamantina. Rio das Contas. – sorriu a moça.

--- Seja lá como for. Mas você não deve ir para esse tal rio. Aliás, em meu notebook estou digitando a estória de Molambo. Você acredita? – indagou o rapaz.

--- Jura? – perguntou alegremente a amante.

--- Estou começando agora. Talvez demore um pouco mais. E eu preciso voltar à Vila Coqueiros para ter novas conversas com Molambo. – sorriu envergonhado o moço.

--- Eu preciso ver o que você já escreveu. Depois. Agora vou dormir. Amanhã tenho o que fazer. Espere!. – sorriu Verinha para o seu amado se levantado do divã e saindo em busca do quarto de casal.

O rapaz também disse o mesmo. Era hora de dormir para acordar bem cedo. Afinal ele tinha que passar na casa de sua mãe e dizer da novidade.

 


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

AMANTES - 12 -

- 12-

Certo dia após, Silas estava no apartamento de Vera. A aula de Silas terminara um pouco antes do normal. Ele já fazia do apartamento o seu novo lar, apesar de ter que ir a casa de sua mãe quase ou todos os dias. Dona Lindalva, a mãe de Silas, era mulher de seus sessenta anos. Às vezes, estava com Lindalva a sua comadre de fogueira, Dona Clotilde, que passava dias e mais dias morando naquela casa. Sempre que Silas desaparecia, era Clotilde quem assumia o lugar do rapaz. Com relação a Vera, certa vez Silas já estava na ampla sala do Ap a consultar seus apontamentos do filme que faria no mês seguinte. Vera estava ao lado, no birô, fazendo talvez a mesma coisa ou algo parecido. Os dois amantes viajariam para o sertão da Bahia dentro dos próximos dias para a região da Chapada Diamantina onde seriam feitas as filmagens do documentário. Eles estariam mais propriamente do sertão do Rio das Contas. Naquela noite tudo era silencio no Ap de Vera Muniz a não ser o barulho tênue que chegava de baixo dos automóveis que passavam para um lado e para o outro. Uns gritinhos de quando em vez e nada mais. Em dado instante, Silas parou de ler os seus apontamentos. Ele olhou para Vera e não sabe por que teve a idéia de lhe perguntar:

--- Você nunca quis casar? – indagou Silas a Vera Muniz.

--- Hum? – quis saber a moça de forma aleatória à pergunta do rapaz feita de supetão.

--- Casar. Ou mesmo viver junta com alguém. - explicou Silas de forma mais sutil.

--- Ah sim. Casar, não. Eu não penso em casar. Tem muitos compromissos. Se eu chego tarde ao Ap o homem vem logo saber onde eu estava. Se não saiu ele vem com a pergunta: “Não vais sair hoje”? – sorriu Vera ao responder ao seu amante.

--- É verdade. E tem os filhos. Negócio para mais pensar. – sorriu Silas acabrunhado com a pergunta feita por ele.

--- É. Os filhos. Já estive com um rapaz. Por sinal ele era casado. Mas estava se largando da esposa. Vivemos poucos meses. Um dia, por um motivo qualquer, ele me viu acompanhada com outra pessoa. Eu e o rapaz éramos somente amigos. Mas foi o ponto da discórdia. Ele foi embora. Um para um lado e outro para outro. – fez ver a moça à indagação do rapaz.

--- Sei bem que eu te vi alguns domingos, com esse tal rapaz. Seria esse? – indagou Silas surpreso com a estória.

--- Não. Mas que cinema? – indagou Vera Muniz de forma surpresa e tecendo a cabeça para ver se lembrava de algum cinema.

--- Olímpia. De manhã. Certo domingo. – sorriu Silas ao responder a indagação de Vera.

--- Ah sim. Olímpia. Naquele domingo eu procurei você. Mas o rapaz que estava comigo era tão apressado que tive de voltar. Ainda te chamei. Eu ti vi naquela ocasião. Sabia que você tinha me visto também - - sorriu franca a moça.

Silas igualmente sorriu na oportunidade. Ele não sabia ter sido Vera Muniz o alguém que lhe procurara naquela oportunidade.

Os amantes estavam já propensos a viverem juntos. Casar, talvez não. A moça queria apenas viver como dois amantes. Eles viveram como amantes por longo período quando ainda eram estudantes do Grupo Escolar. Silas pesquisou a memória e foi encontrar um dado que por eles passou. Certa ocasião, os dois amantes, ainda infantes, foram a uma praia um pouco distante para tomar banho de mar. Era uma praia deserta. Pouca ou quase nenhuma gente passava por essa região. Apenas pescadores arredios que aproveitavam a maré seca ou mesmo enchendo. Tinha um Forte na região, algo pouco distante de onde os amantes tinham chegado. Havia morros ou dunas. Nesse dia em que eles foram, subiram uma duna e desceram para o seu meio para depois subir para o outro lado. Foi nessa ocasião que Silas viu um casal postado em outra duna, encostado na parede da duna, fazendo sexo. Ele chamou a garota Vera para ver também o que ele vislumbrara. Vera foi até a encosta e de momento viu os dois namorados fazendo sexo escondidos pelas paredes das dunas. Os dois garotos – Vera e Silas – ficaram assustados com o que estavam vendo afinal. Mesmo assim, sob o doce barulho do mar ao romper as ondas nos rochedos postos ao longo, os amantes, temerosos, ficaram a ver os dois enamorados a cumprir o seu desejo de um logo e duradouro amor. Vera sorriu e disse a Silas:

--- É assim que eu vejo a mulher vizinha fazer com o marido. – falou Verinha a sorrir.

--- Psiu. Cala tua boca. Eles podem ouvir que estamos vendo. – articulou Silas para a garota.

A mocinha então sorriu querendo fazer o mesmo compromisso que ela estava a ver naquele sublime momento de afeição. O tempo era de tarde, e os amantes, olhando os namorados então fizeram a seu jeito o que estavam a ver.

Silas sorriu complacente repleto de suavidade ao se lembrar do momento de pleno amor na praia azul de areias escaldantes em meio a umas dunas. A jovem observou Silas a sorrir e indagou por que ele estava a sorrir de forma tão displicente. Silas apenas sorriu e então gargalhou ao dizer a meiga jovem que era o caso do amor estranho que um dia eles assistiram.

--- Quando? – indagou Verinha a sorrir também.

--- Um dia. Faz tempo. Na praia. Os dois namorados. – sorriu Silas ao lembrar que também tinha feito o pleno amor a dois.

--- Ah bom. Disso você não esquece. Nem me lembrava mais. – sorriu Verinha ao chamar Silas para o quarto de casal.

E então, eles fizeram um verdadeiro amor sublime para lembrar de fato o que tinham visto nas dunas da praia distante e sem quase ninguém.

No domingo daquela semana, os amantes foram passear ao longo, em uma praia deserta, onde apenas o vento açoitava as paredes rochosas de suas estepes colossais de cinco metros de altura e para cima e para dentro ao longo da terra plana comungavam verdadeiras planícies extraordinárias varrendo o chão com o céu. O marulhar das ondas vinham se por até aos pés dos amantes. Verinha corria temerosa se atracando ao rapaz. A moça receosa penetrava em umas cavernas abertas pela própria natureza na rocha árdua. Os amantes estavam ali solitários a contemplar a própria natureza. As roupas de banho que a moça trajava podia se notar muito bem a silhueta de seu corpo ardente e amado.

Vozes distantes. Eram pessoas a transitar por cima onde os amantes estavam encolhidos nas cavernas abertas na rocha antiga feita com esmero, de cores avermelhadas e escurecidas. As vozes tomaram rumo diferente de onde estavam os amantes. Os dois sorriram e então se fez amor à sombra do penhasco sob as ondas do mar aberto a salpicar salgadas porções das águas onde retinham a vida. Era o orgasmo da natureza feito a qualquer motivo. Logo após o descanso os amantes foram até a praia já um tanto cheia para se banhar e retirar os salpicos do orgasmo. Era amor tão delirante como fora em tempos juvenis. Verinha sorria a um só tempo a sacudir água nos magros peitos de Silas. Esse se ajeitava e sacudia em troca salpicos de ondas para a moça correr à praia até cansar. Tantas horas perdidas pelo tempo e que então Silas tentava reaver. Após aquele eterno aconchego os amantes seguiram rumo afora até chegar a uma vila onde havia um rústico bar. E por ali se refestelaram de mariscos e goiamuns ao toque de uma sanfona puxada por um acordeonista sem nome. Do meio da terra surgiu a figura de um esmoler a pedir a ajuda dos amantes. Ele era o Molambo, com certeza. Verificou o jovem Silas.

--- Você é Molambo? – indagou surpreso o jovem Silas.

--- Sim. Uma esmola, pelo santo amor de Deus! – recitou o velho encanecido Molambo.

--- E o senhor mora por esses lados da praia? - pesquisou de forma sutil a moça Verinha.

--- Eu moro aqui mesmo. – respondeu Molambo ao receber uma nota do rapaz Silas.

--- Mas eu conheço o senhor de há muito. Eu era moçinha. Pequena. E o senhor era morador de um casebre de papelão! Nossa Senhora! – disse alarmada a moça Verinha.

--- Isso foi há muito tempo. Hoje eu moro aqui, onde nasci. – recitou Molambo.

--- E como é o seu nome verdadeiro? – indagou Silas a pesquisar o homem.

--- Diomedes, meu filho. Diomedes. Aqui ninguém me chama desse nome de Molambo. – respondeu o velho cabisbaixo.

--- Você tem filhos? – indagou Silas ainda surpreso.

--- Não. Filhos, não. Eu moro com a minha irmã lá no alto depois do rio. – falou Molambo ainda cabisbaixo a guardar seu dinheiro.

Silas olhou para Vera Muniz querendo dizer que ali tinha uma idéia. Ela então compreendeu o que o rapaz falou ou quis falar. Afinal eles estavam diante de uma figura que para eles fez história pelo medo que o dois sentia quando meninos. O homem, de seus sessenta anos, ainda era vivo. Talvez tivesse mais algo para contar, no lugar de somente pedir esmolas. Talvez.

--- Mas o senhor nunca casou? – indagou Silas alarmado.

--- Há muito tempo eu era noivo. Mas a moçinha logo morreu no dia do casamento. – recitou Molambo como quem queria chorar

--- O vestido de noiva! – argumentou alarmado o rapaz dizendo isso para Vera Muniz.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

AMANTES - 11 -

- Mariana Ximenes -
- 11 -
No dia seguinte, de paletó e gravata ultimo modelo, Silas Albuquerque já estava, muito cedo, 8 horas da manhã, em seu novo estabelecimento. Um birô último modelo com fino e esmerado acabamento, estantes ao redor da sala, pastas da mesa, computador para digitar o que fosse necessário, papéis, canetas e todo o luxo que se podia pensar. À frente do birô, uma poltrona. Ao seu lado, uma cadeira de um esmerado acabamento. Funcionários chegavam e passavam para os seus serviços. Todos se cumprimentavam uns aos outros. E ele estava só em um ambiente por demais acanhados que Silas se sentia envergonhado. Ao lado do seu gabinete, estava o da vice-presidente, Vera B. Muniz. Ele logo avistou esse pormenor. Na sua porta, estava o marceneiro a pregar – Silas Albuquerque – em um pouco abaixo – Assessor -. Porém não dizia de que ou quem ele era o sentido de assessor. E Silas ficou a imaginar:

--- “Assessor de quem?” – pensava Silas com um amargo sorriso.

Por um tempo Silas ouvia o leve tilintar dos computadores na imensa e destinada sala com vertiginosos executivos imersos em seus afazeres. O edifício era um super mega para tantos funcionários, servidores, executivos e tudo mais envoltos nos seus eternos compromissos. E Silas envolto em seu trabalho de não fazer coisa alguma. Àquela hora da manhã era bastante cedo para a vice-presidente estar presente. Silas ficou a imaginar com quem a moça dormira, pois o eterno ciúme já lhe assomara o peito. Lembrava de qualquer modo Silas do tempo de criança. Ou mesmo garoto, quem sabe jovem. E assim ele se lembrou do sítio de Heráclito que a gurizada chamava apenas de “Eraquis”. Do dia em que foi com Vera até o local por entre morros, bem no centro, em uma depressão. O Sítio era repleto de mangueiras, cajueiros, pitombeiras e outras frutas então desconhecidas pelo garoto. Ele se lembrava das historia que o velho Heráclito contava para ambos. Vera ficou assombrada quando o homem contou o fato das raposas.

--- Elas vêm todas as noites. Caem na risada. As galinhas e os galos ficam assombrados. As raposas pulam de um lado e para outro dando risada. Quando cai um, elas pegam e traçam. – contava o velho Eraquis.

--- Traçam o que? – indagou Vera assustada com a estória.

--- Traçam. Comem as galinhas. – sorria o velho Eraquis.

--- Virgem Nossa Senhora! Comem? Vivas? – argüiu Vera em pânico.

--- É. Elas comem vivas. De noite. Nem tem graça. Rasgam tudo. – contou o velho.

--- Vou embora! As raposas podem aparecer! – levantou a mocinha cheia de temor.

--- Espere. Espere. Certa vez, eu me armei de uma espingarda e fiz tocaia. – disse Eraquis.

--- Fez o que? – perguntou a garota com assombro.

--- Tocaia. Esperei as raposas. Esperei até certas horas da noite. Quando elas apareceram, a galinhada já ficou alarmada com elas. Có-có-có Co-có-có. Eles em cima dos cajueiros. E as raposas sorrindo. Pulando de um lado para o outro. Foi aí que eu disparei: pei! – um só tiro. Matei quatro raposas. As outras foram embora e nunca mais voltara. – sorriu o velho.

--- Voltaram não? – perguntou Vera de olhos esbugalhados.

--- Voltaram nada. Às vezes aparecem umas ou outras. E eu já sei. Quando as galinhas começam a cacarejar, eu: pei! Só dou um tiro. Mato todas! – sorriu Eraquis a boa graça.

--- Vamos embora Silas. Pode ser que hoje elas apareçam por cá! – recomendou Vera com medo terrível das raposas.

--- Espere. Não vá agora. Eu tenho uns cajus para você. E vamos conversar mais. A tarde está calma. Não se vê viva alma! – sorriu o velho Eraquis.

--- Alma???? E tem alma aqui???? – indagou alarmada a garota Vera.

--- Tem. Mas só aparecem de noite. – tranqüilizou a sorrir o velho.

--- E o senhor mora aqui sozinho? – perguntou Vera assombrada.

--- É. A mulher morreu por esses dias. Eu fico só nesse matão. – respondeu Eraquis.

O velho então encheu o cachimbo de fumo e pegou a fumar. Cada tragada que dava gosto. O fogareiro acesso de brasa era o ponto para se acender de novo quando tudo tivesse apagado.

O rapaz se lembrou desse momento enquanto Vera Muniz entrava no seu acanhado escritório. A cumprimentá-lo com um leve beijo na face ao dizer:

--- Cuidado. Aqui é diferente. – sorriu Vera Muniz.

E começou a indagar de Silas se ele tinha alguma idéia para se resolver. Ele respondeu que não, pois nem sabia por onde começar. Estava apenas a pensar no local que ele era para ir onde faria o documentário sobre toda a ampla região.

--- Capadócia. Vamos para o meu gabinete e poremos o caso em dia. – respondeu Vera Muniz.

Na verdade, não era de fato Capadócia a terra que Vera queria fazer um documentário de cinema para exibir no Brasil e, principalmente, no exterior. Depois de longo espaço de tempo, Vera falou em um sítio arqueológico existente no Brasil. Era tão sagrado o sítio, que ela achou por bem chamar de Capadócia em homenagem a região da Turquia. E foi desse termo que ela colocou a idéia em suas próprias mãos. O destino era longo demais. Pelo menos duas unidades foram conectadas para rodar a filmagem. O tempo que levaria este documentário talvez fosse de doze meses. E talvez mais até. A locação era algo de difícil acesso para os cinegrafistas, diretores, roteiristas e demais pessoal empregado nessa aflitiva filmagem. Vera Muniz tinha tudo em sua memória. O texto estava pronto, o roteiro também. Então somente faltava se por a mão na massa. A idéia de buscar um novo elemento para auxiliar na direção do filme surgiu quando Vera viu o nome de Silas no jornal no qual o rapaz trabalhava. A despeito de ser um quase jornalista, Silas havia se comprometido com o Clube de Cinema da Cidade. Então, cravou a sopa no mel.

--- E eu disse; Silas é o nome. – sorriu Vera ao contar a trama a Silas.

--- Até aí esta tudo muito bom. Mas eu não sei nem um pouco de filmagem. - argumento Silas impressionado.

--- Então é aí que entra você. Não importa que saiba ou não. Eu tenho cinegrafistas. Em tenho diretor. Eu tenho roteiristas. Eu tenho tudo que se precisar ter. Mas não tinha alguém da minha confiança para ajudar nas filmagens. Daí por que eu chamei você. – sorriu Vera Muniz.

--- Em palavras bem simples: eu não faço nada. – sorriu Silas preocupado com o tema.

--- Não é bem assim. Você administra tudo o que tem que ser feito em termos de direção. E além do mais você viaja comigo. – sorriu Verinha aos olhos de Silas.

--- Até ai está uma beleza. Mas na prática, o que eu faço? – indagou Silas atormentado.

--- Hora meu bem. Nós estamos falando de uma região inóspita. O plano é de trabalhar da região da Chapada Diamantina. É um sertão terrivelmente remoto. A Chapada fica no centro do Estado da Bahia. Temos ali o chamado Rio das Contas. Esse rio brota no cume de uma pedreira e despenca como verdadeira cachoeira com a formação de piscinas belas e naturais de águas cristalinas. Temos ali uma vegetação exuberante e de caatinga. E em todo esse local você está presente. E, aliás, comigo. Agora entendes? – indagou a sensual Vera Muniz.

A cabeça do rapaz girou ao contrario, pois jamais pensaria em termos tão avantajados como o que a moça explanava. Tudo era magnífico e de uma eloqüência tal cujo poder de vislumbrar somente podia vir de uma mente tão brilhante como a de Vera Muniz. Eles conversaram horas e mais horas perdendo até a noção do tempo. A Chapa era o marco para alavancar toda a proeza daquela exuberante moça. Ela, que viajara por todo o resto do mundo, seria a mentora de algo sensacional para expor o País à altura de qualquer outra nação. Quando a conversa veio ao seu final, os dois amigos estavam exauridos. A filmagem do trabalho começaria na semana vindoura com as entrevistas de pessoal dos de escritórios. Ministros, Governador entre demais pessoal que se pudesse compor. Até aí, Silas não tinha coisa alguma a poder fazer. Apenas ele estaria a concluir os seus estudos. Quando as equipes fossem deslocadas para o sertão da Bahia, os amantes estariam presentes.

À noite, após a aula, o rapaz foi ter ao apartamento da doce mulher amada para se deleitar em conversas corriqueiras ao som de um cd acalentador. Ao toque sutil de um bolero despertou a chama do peito dos ardentes amantes como nos velhos e distantes tempos onde orquestra e nem radio havia para o deleite dos dois. A dança de salão enlevava os amantes a recomeçar tudo que havia perdido na voragem das quimeras. Longo espaço de amor fecundo inspirou os amantes ao deleite da candura a viver sonhos entre laços. Sonhos de alcovas perduravam aos dois enamorados. Carícias latentes eram somente afagos cuidadosos para a eternidade do prever. Na rua, dez pisos abaixo, enamorados sorriam embevecidos de tanta durável alegria costumeira. O buzinar dos veículos nem ao menos tirava os sonhos dos eternos namorados. Havia música ao luar e a candura de solilóquios de amor.



quarta-feira, 27 de outubro de 2010

AMANTES - 10 -

- Katherine Heigl -
- 10 -
Verdade pura. Vera Muniz estava encantadora mais que no tempo de adolescente ou mesmo ainda menor como garota. Sua formosura era irradiante em plena liberdade de dizer e ouvir falar. A candura de sua face se igualava com as dos seus seios e mesmo a do corpo inteiro. Seu andar parecia uma fada ao pisar por onde passava. Olhos vibrantes, cor mais que alva. Cabelos se fossem castanho era mesmo o que dizer cor de ouro. Vera Muniz caminhava para se tornar em um doce encanto de primavera igual às borboletas douradas. Já com vinte ou vinte e poucos anos de idade, Vera era capaz de ter tudo o que a uma mulher necessita. Seu veículo era um Chevrolet Corsa Classic modelo com quatro portas. De tudo o que era moderno estava aos pés de Vera Muniz. Havia tempo em que ela estava nos Estados Unidos. Em outros, era na Europa e mesmo no Japão. Quando certa vez alguém lhe falou a cerca da Turquia, ela viajou até aquele País. Foi então que conheceu a região de Capadócia, um lugar de pedras e de cavernas que o mundo todo admirava. Vera não somente conheceu como viu as gigantescas e colossais pedras perfuradas habitações dos nômades da Anatólia. O significado do nome é muito simples: “Terra de cavalos de raça”.

Quando seguiram para o trigésimo terceiro andar do edifício onde funcionava a suntuosa e elegante Agencia Pomar os dois conversaram coisas do presente, pois, naquele dia, Silas seria o novo empregado da luxuosa agência. Dormir no apartamento da vice-diretora da organização já havia sido uma vitória para Silas, apesar de conhecê-la há mais tempo. A se ver trajando roupas simples para uma nobre função, já deixara Silas um tanto decepcionado. Com isso, ele falou para Vera Muniz que ainda precisava ir a sua – dele – casa para mudar os trajes, pois a sua função exigiria trajes bem mais completos.

--- Tolice! Isso depois se observa. – sorriu a amante Vera.

--- Mas eu estou sujo!!! – exclamou com veemência Silas Albuquerque.

--- Não vejo por que. – respondeu a jovem Vera.

Com esses detalhes a cumprir Silas e Vera foram então para o escritório da vice-presidência onde ambos ficaram mais livres de olhares estranhos. Muito embora estivesse trajando roupas simples. Vera trajava roupas grã-finas. Silas ao seu lado parecia um homem despido. Mesmo assim, chegaram os dois ao gabinete de Vera por um elevador privativo. No meio do caminho, a moça respondeu ao rapaz que se ele quisesse, poderia adquirir roupas de melhor porte do próprio edifício onde ele seria então o novo auxiliar da vice-presidência. Com tal observação de Vera, ele então se sentiu completamente despido de corpo e alma. Quando Silas rumou para o apartamento de Vera Muniz, ele estava a trajar roupa simples, as mesmas que então trajava. Ele estava em aula e nada mais de suntuosidade pusera em seu corpo. Tivera apenas um telefone celular para fazer contato com a moça. Tudo isso e nada mais.

Após deixar a documentação necessária na bancada de sua amada, foram os dois amantes ao magazine da organização procurar o traje adequado para vestir o pobretão Silas. O magazine do edifício era luxo só. Silas ficara admirado com tamanha nobreza em um repleto edifício onde havia de tudo para se escolher ou comprar. Com tamanha altivez de negócios, ele se sentiu ainda menor que os próprios servidores do bazar. Após esmiuçar por demais, Vera Muniz concluiu estar completo o fardamento do seu soberbo jovem. O pagamento foi feito através de cartão de credito da própria Vera Muniz.

--- Aqui todos têm seu cartão de crédito. Você terá o seu. – sorriu Vera Muniz perante Silas.

--- Mas querida, eu nem sei quanto vou ganhar de salário? – estranhou o jovem Silas.

--- Tolice. Isso não tem importância. Depois a gente vê isso. Compras! – sorriu Vera.

Assim passaram os dois amantes o restante da manhã a comprar roupas de etiquetas famosas. Na hora do almoço Vera convidou Silas para irem fazer a refeição no restaurante do mesmo edifício, pois naquela organização tinha de tudo o que necessitassem no seu dia-a-dia de modo que os funcionários não precisassem procurar em outros locais. No espaço reservado a Vera Muniz apareceu um cidadão de seus cinqüenta anos a cumprimentar a jovem e olhar bem para o rapaz. Tímido como uma rolinha silvestre, o rapaz nem teve ao menos tal lisonjeado prazer de cumprimentar tal figura. O homem é quem veio em sua direção.

--- Prazer, senhor Albuquerque! Vejo que está em boa companhia! – soletrou o homem a Silas.

--- Muito prazer. É. Vera é uma amiga de infância. E hoje estou aqui. – sorriu sem graça Silas

--- Ele é o rapaz que eu te falei. É um grande profissional do ramo. – sorriu Vera Muniz ao seu chefe, Diogo de Lá Veja.

--- Eu admiro os jovens. Sempre graciosos. Eu sei que ele se sairá bem na sua nova missão! – relatou De Lá Veja entre sorrisos.

--- Tenho certeza que sim senhor La Veja. – respondeu Vera Muniz.

Silas apenas sorriu, pois nem sabia o que reservava para si a sua nova função. O homem parecia ser de origem espanhola. Recatado, elegante, brioso, feitio perfeito para um magnata da estirpe do velho/novo cidadão. Foi então que Silas caiu do céu, pois a organização em que se metera era muito mais além do que ele esperava. Havia conversa, sim. Porém todos fariam a sua parte. No salão de refeições conjuntas Silas pode ver como os seus futuros companheiros se comportavam com esmero e maestria. Era para ver as conversas reservadas que alguém se comportava. E naquele instante, à sua mesa, estava o presidente da organização, senhor Diogo de La Veja, um cavalheiro de escol. O refeitório em que Silas estava era por demais decente, cercado por meias paredes e onde só tinha acesso as pessoas devidamente convidadas ou aquelas que eram as das mais altas classes. O homem se esquivou em sentar ao lado de sua vice e decidiu que outros compromissos lhe assumiam, pois eles estariam em reunião às três horas da tarde.

--- Eu estarei presente. – relatou Vera Muniz.

--- E o rapaz também. – verificou o senhor De La Veja sorrindo afinal.

--- O senhor Albuquerque já está sabendo! – sorriu a moça ao patrão.

O certo é que Silas não sabia de coisa alguma e sentiu uma pontada na perna dada por Vera para ele apenas concordar.

--- Eu estarei sim senhor – sorriu sem querer ao se levantar o jovem Silas.

Logo após o presidente De La Vega sair, Silas se voltou para Vera e indagou que tal de reunião era essa. Ele não sabia de coisa alguma. E ainda teve que mentir ao dizer ao chefe que estaria presente. A moça sorriu com vagar. E respondeu:

--- Assuntos da diretoria. Com certeza para te apresentar aos novos consorciados. – sorriu Vera

--- Onde fui amarrar meu burro! – falou Silas de forma irônica.

A jovem Ver Muniz se reservou para não soltar uma tremenda gargalhada ao ver a cara de Silas amargando o seu destino. E disse ainda Vera Muniz que ela não lhe havia descrito a tal reunião para que ele não se assombrasse de tamanha situação em que a jovem moça o metera. No mesmo sentido, Silas adiantara que teria de ir a sua casa, pelo menos para tomar banho e mudar de roupa, pois a que estava usando lhe apertava por demais o colarinho.

--- Nem pensar! Troque a camisa no bazar onde comprou! – acudiu Vera Muniz com olhar tenso para o rapaz Silas..

--- Agora tem mais essa? – reclamou o rapaz a sorrir.

--- Vá se ajeitando do seu modo de agir, pois de agora em diante tudo mudou para você. – reclamou Vera Muniz com olhar severo.

O rapaz ficou inquieto. Logo pensou no Cine Clube. E pensou também em sua casa. A mãe estaria em pânico por não ter noticias suas. Então ele se lembrou de discar para casa e avisar a sua mãe que estaria então em uma nova função em um novo escritório, pois teria serviços extras a executar e, talvez apenas retornasse a casa para o jantar. A jovem Vera Muniz escutou tudo que o rapaz falou ao celular e não disse mais coisa alguma. Apenas pensou na casa em que ele morava e o velho mendigo que tanto eles corriam com medo de ser alcançados. Só então a moça sorriu numa verdadeira gargalhada. Todos a olharam com cismas. E o rapaz com temor e aturdido inquiriu a Vera:

--- O que foi? – indagou o rapaz meio cético.

--- Nada não. Eu me lembrei de Molambo, o velho de nossa infância. – respondeu ainda a sorrir a jovem Vera Muniz.

--- Que velho? Ah sim. Molambo. Dá pra se ver. O que é feito dele? – averiguou Silas.

--- Não sei. Deve ter morrido. Certamente. Molambo! – apenas cismou a jovem moça apenas a lembrar de fatos de outrora.

A noite veio, e os dois amantes deixaram a repartição. Ela seguiu para o seu apartamento após deixar o rapaz em sua casa, em ouro bairro para onde ele e sua mãe se mudaram logo depois da morte de seu pai. O velho Albuquerque foi acometido por uma leucemia e teve morte quase prematura, apesar de ter sofrido com sintomas há vários anos.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

AMANTES - 9 -

- Alice Braga -
- 9 -

E os dois fizeram o acordo de se encontrar às duas horas da tarde do dia seguinte. Após o telefonema, Silas ficou a tremer e a suar por ter encontrado a sua doce e querida amada de velhos carnavais. A sua mente delirava de tanta emoção. Ele avistara Vera na sessão de cinema de um domingo. Ela estava de braços com o noivo ou namorado. E então pensou Silas em tudo isso que lhe afetara sobremaneira o espírito de jovem. Os colegas de redação estavam a trabalhar freneticamente. O Chefe de Redação estava a buscar as matérias policiais do dia. E Silas ainda não tinha posto em ordem todo o seu material que recebera da reportagem. Nesse espaço de tempo, ele procurou reaver o que se perdera em tal momento, colhendo as matérias mais preciosas do dia para dar ao Chefe de Redação. Silas ainda tinha aula no período noturno e tudo que fazia era pensar em Vera, a doce e inigualável amada.

Quando o relógio da Matriz marcava às duas horas da tarde, Silas entrava na Agencia Pomar em busca da vice-diretora da entidade. Ele tinha que preencher um catatau de documentos, deixar a sua Identidade para reaver depois e tudo isso e tudo a mais não fora a presença da vice-diretora a lhe chamar orientando a portaria que estava um seu amigo. O porteiro então deixou seguir o rapaz. Ela era deslumbrante e luxuosa. Silas olhou bem os seus dedos para investigar se tinha aliança de noivado ou não. E depois de apertar-lhe a mão direita notou que Vera não tinha aliança. Com certeza, aquele rapaz era só um namorado ou coisa assim. Ao entrar no gabinete da vice-presidente Vera, foi aí que notou o seu sobrenome, coisa que nunca tinha observado: Muniz. O seu nome era Vera B. Muniz. Muito embora tivesse visto um “B”, Silas não teceu maiores comentários. Então, os dois começaram a conversar sobre o passado de ambos e até chegar a pretensão de Vera Muniz.

--- Bem. Você termina o curso este ano. Dois meses faltam. E eu quero você aqui, comigo. Eu sou, no momento, a vice-presidente da organização. Essa agencia é um império. Rica até demais. Tem agencias por boa parte do mundo. Hoje, eu estou aqui. Amanhã poderei estar em outro local. E quero ter você comigo! – sorriu Vera com a sua suave tez aveludada e untada de carmim.

--- É danado. E eu vou fazer o que? – sorriu Silas com a conversa de Vera.

--- Aceita? – indagou Vera para sentir a reação do rapaz.

--- Pelo salário nem se fala. Mas tem um, porém: eu sou amador. Foca. Ainda falta muito para aprender. E isso só se aprende fazendo. Eu assumo um cargo nessa organização. Agora; faço o que? – averiguou Silas cheio de duvidas.

--- Bem. Boa questão. Fazer o que? Você já ouviu falar em Capadócia? - perguntou Vera Muniz

--- Ca o que? – estremeceu o rapaz com o nome dito pela jovem moça.

--- Não faz mal. Capadócia é uma região da Turquia. Bem longe daqui. Só tem pedras. E balões também. Balões. Sabe? (sorriu Vera) Desses que o povo faz. Mas, é o seguinte. Se você aceitar a tarefa, tem uma região no coração desse país – o Brasil – que é semelhante à região de Capadócia. Eu tenho a missão de fazer uma excursão para trazer gente de fora. De fora mesmo e deixar esse povo “navegar” por essa região. E o que você faz? Viaja comigo para a nossa Capadócia. – sorriu a moça encantada com a presença de Silas.

O rapaz ficou pensativo como a cobrar de si os anos dourados que passaram os dois em pleno amor sem saber o que faziam. Ele olhava para a face de Vera e sorria sem parar. Apenas sorria para o encanto de Vera Muniz àquela hora da tarde. Não sabia ele porque sorria. Se de alegria ou de emoção. Sorria apenas. Horas de recordar a praia distante que certo dia eles foram para tomar banho e fazer casos indecentes. Naquela hora eles não sentiam o prazer ou o dizer de indecentes. Apenas eles brincavam na praia deserta de amor sem atração. Amor porque queria fazer sem emoção ou desvario. Na praia vazia de gente, eles chegaram a torno das oito horas de um domingo qualquer e de um ano qualquer. O sol brilhava no firmamento em um mês de novembro, talvez dezembro. Eles, inteiramente despidos, nem timidez sentiam um do outro. Era apenas os amantes desnudos a brincar de correr, fazer amor, tomar banho, namorar sem prestar atenção às horas e ao tempo. Era um verdadeiro frenesi o que os dois faziam. E disso ele lembrou em todos os detalhes. Das ostras, das pérolas marinhas, dos peixinhos brilhantes, pequeninos, porém ágeis em escapar das mãos arteiras da garota, dos sargaços de cores diversas, amontoados uns sobre os outros, das caravelas reluzentes e queimantes iguais brasa, águas salgadas, espumas alvejadas a se desmanchar na areia da praia. De tudo isso Silas se lembrava, como notava igualmente dos rochedos entre o mar e a areia do mar. Gigantes tais rochedos como se fossem tragar para sempre os dois infantes. Bocas abertas entre a terra e o oceano tais rochas negras, talvez marrons. Entremeios de um para outro lado como fossem horrendas cavidades abertas ao céu marinho. E de tudo isso Silas não esquecera.

No instante que Vera Muniz falou mais forte, Silas de imediato ouviu. Estava atônito em seu pensar, recordar as melhores fazes de sua vida infante que nem mesmo ouvira a sua amante a dedilhar o que ele havia a fazer. De repente, sem tirar os olhos atentos do crepuscular ornato de esmeralda a descer pelo aberto decote da moça ele sentiu o que estava a delirar naqueles momentos de desafios e de distração:

--- Estás a ouvir rapaz? – indagou a moça a Silas tão meio tonto a cismar a doce candura.

--- Estou. Certo! Capadócia. – sorriu Silas procurando decifrar o que Vera Muniz havia dito.

--- É. Capadócia. Mas não foi isso que eu falei. Você aceita em ir comigo? – indagou a jovem.

--- Mas é claro. Mas eu tenho que pedir demissão do meu emprego. Assim, eu venho para onde você quiser que eu esteja – falou de modo amoroso o rapaz.

A jovem Vera Muniz sorriu de encanto, pois sentia ali a doce primavera de um antigo e eterno amor. O pavimento onde estava Silas no edifício onde funcionava a Agencia Pomar, era bem amplo e a agencia ocupava o trigésimo terceiro ou trigésimo quarto andares do edifício. Tal hipótese fora levantada por Silas naquele instante, vez que a jovem moça lhe avisara estar na vice-presidência da Agencia Pomar e sendo assim, ela estaria no trigésimo andar junto com o presidente da organização. Acima, no trigésimo quarto andar devia ser para reuniões a portas fechadas onde se tomaria decisões ou para fazer conferências. De tal forma era que Silas já estava a um passo do sucesso. Isso dependeria apenas de sua decisão em aceitar a oferta de operar ao lado de Vera Muniz. Uma vez a decisão fosse aceita, era o progresso para a fama. Quase a concluir o curso de Jornalismo e já estando com a sua ocupação garantida, Silas estava então a ser visto por outra forma aos olhos de sua amada companheira. Ao sentir o delicado afago da doce Vera Muniz ele foi a fundo a tomar tal decisão.

--- Está bem. Você me aguarde, pois estou já a pedir demissão do meu atual trabalho. – ressaltou Silas. À embriagues do sucesso.

--- E hoje â noite? – indagou Vera com um sorriso na face.

--- Tenho aula. – sorriu também o rapaz.

--- Ah bom. Mas, de qualquer forma esse é o meu telefone. – disse a moça lhe entregando o cartão com o número do telefone celular.

A noite veio depois que Silas voltou ao trabalho de copy-desc no seu primeiro emprego. Ao chegar ao seu balcão ele redigiu um pedido de demissão argüindo motivos superiores. Nada fez para completar a sua derradeira missão de ajudante de jornalismo. O jovem moço tinha o progresso pela frente. Era tamanha a alegria que o atentava, pois nada mais havia de lhe acomodar daquele instante para frente. Ele seria no dia seguinte um auxiliar da vice-diretoria da Agencia Pomar. Por tudo isso, ao se despedir dos companheiros de redação nem disse que estava seguindo para uma nova e longa missão de estafante progresso. A certo tempo ao finar a aula, ele ligou para a jovem Vera Muniz para dizer-lhe apenas um olá. A moça o atendeu, do seu apartamento e lhe chamou para então celebrar a decisão em comum apenas os dois. Silas esfregou as mãos e partiu para o apartamento de Vera Muniz. Foi uma noite de plena orgia e acertos de tempos passados.

Silas e Vera eram dois em um amplo aconchego. A noite era calma onde a moça residia. Do alto do seu Edifício Lego, onde a nobreza habitava e de onde coisa alguma se podia ouvir, eram os dois amantes em um só delírio. A lua enchia o céu moreno com afago e esplendor. Na avenida, viam-se as luminárias dos veículos a transitar. Eram fios de luz de variadas formas e cores. Violetas, azuis, vermelhas, amarelas e de tonalidades quase ofuscantes para os ébrios notívagos a percorrer as calçadas dos hotéis de luxo como era o apartamento de Vera Muniz àquela hora da madrugada. Na sala ampla do complexo notavam-se quadros de famosos artistas de tempos medievais como também estatuetas de porcelana e bronze das figuras distintas de um passado distante e bem remoto. A luz que iluminava o restante do complexo eram tênue e quase fosca. Um gato de porcelana dormia o seu sono sem alvoroço e mudo. Um bêbado caído ao solo encostado em torno de uma parede estava a dormitar embaixo de todos aqueles contornos de ferro e massa. O mar espraiava-se ao destemor de todos os cantos da divina Cibele ao encanto da Frigia. A luz do cabaré enfeitava-se de plumas como a noite de eternos lampejos.

--- Oito horas amor. Estas a dormir? – indagou Vera Muniz ainda sonolenta.

--- Que? Oito horas? Mas que vamos fazer? - inquiriu Silas a um só tempo.

--- Vamos ao trabalho. Você está em um novo emprego. – sorriu a moça toda despida.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

- Ana de la Reguera -
- 8 -

ASA MORENA: AMANTES - 8 -

ASA MORENA: AMANTES - 8 -: "O rapaz foi pego de surpresa. Alguém estava a lhe procurar. De imediato, sem contemplação, ele guardou os ingressos vendidos e, pôs a caminh..."

AMANTES - 8 -

O rapaz foi pego de surpresa. Alguém estava a lhe procurar. De imediato, sem contemplação, ele guardou os ingressos vendidos e, pôs a caminho. Poderia ser qualquer uma das lindas e exuberantes moças que ele as conhecia. Como poderia ser alguém que pela primeira vez teria meios de conhecer. Com a mente presa nos talões de ingresso vendidos, Silas chegou até fora onde alguém dissera querer lhe falar. Ele e o rapaz que com Silas caminhou. Àquela hora, perto do almoço, já nem podia pensar em alguma fada, maga ou mesmo Cinderela. Talvez alguém acompanhada do seu elfo, mito dos célticos, germânicos ou nórdicos. A rua do Cinema Olímpia estava quase deserta. Um carro passava a toda velocidade a buzinar para ninguém, cheio de moças a gargalhar. O motorista era outro charmoso rapaz. Esse dizia pilherias a toda prosa. Um bar existente em um beco estreito onde poucos automóveis se aventuravam passar estava repleto de bêbados àquela hora da manhã ou tarde. Dos ébrios se ouvia pilherias sem graça a que todos achavam airosas. Do mictório do Cinema Olímpia saía um dos que estavam atrasados para chegar a sua casa na hora do almoço. O aficionado de filmes saiu tão depressa que nem se desculpou a Silas naquela hora quando foi de encontro ao rapaz. E no instante derradeiro, Silas recuou um passo para o azougado passar. O homem era baixo, tinha cerca de 30 anos, quase careca, branco que nem uma lesma e usava óculos de lentes para míopes. E foi Silas quem pediu desculpas pelo acidente incontinente.

Ao chegar ao salão de entrada do cinema, Silas e o homem que o chamou, não encontraram mais ninguém. Silas ainda entrou no salão de exibição de filmes, porém não havia alma. O rapaz ainda foi fora e procurou em uma sorveteria que funcionava ao lado do cinema, porém não havia mais nem sinal da pessoa. Era uma moça jovem e, aparentemente estava só, pois o rapaz não vira outra companhia ao seu lado. No mesmo instante, Silas caminhou até a esquina de uma rua próxima onde havia uma farmácia, e ali também não encontrou a tal figura. Ainda olhou ao correr da pracinha cujo setor se aproximava a certa distancia, e lá entre pessoas que transitavam também não vira nenhuma pessoa que pudesse ser alguém familiar ou mesmo conhecido de tempos passados. Mesmo pessoas da Faculdade de Jornalismo. Colegas, entre muitos conhecidos. O que ele notou foi à presença de um mendigo que se aproximara dele a pedir esmola. A esse indigente Silas só teve um dizer:

--- Perdoe!. – falou Silas ao esmoler que se pôs a caminhar.

--- Porras! Será uma alma! – falou o rapaz do cinema que se aproximou de Silas.

Silas olhou para o rapaz do cinema e teve vontade de dizer um desaforo, porém de quase nada respondeu voltando para ver o mapa dos ingressos vendidos. Na hora, ele não cogitou ser alguém da Faculdade ou da associação do Cine Clube. Bem que podia ser alguém querendo tomar informações sobre o filme que havia sido apresentado no horário matinal. O certo é que, de cabeça totalmente inchada de tanto pensar, Silas resolveu esquecer tudo que passara de uma só vez.

--- Os ingressos? – indagou Silas ao rapaz da cabine.

--- São esses. – respondeu o rapaz olhando para Silas.

Dias depois Silas estava no seu trabalho como aprendiz de jornalismo porque o seu curso teria conclusão no final do ano. Então ele passaria de vez da condição de simples “foca” para jornalista categoricamente profissional. Mesmo assim, ele já estava safro em muitas matérias apesar de ser um revisor de matérias policiais. Silas já estava no jornal há cerca de um ano gozando do maior afeto da diretoria. Nesse dia, pouco tempo depois da sessão de cinema, ele foi chamado pela secretaria do jornal para atender ao telefone, como era de costume quando havia ligação externa. No seu birô tinha um telefone de ramal e ele pediu para a secretaria ligar para o seu telefone. A moça concordou e foi feita a ligação. Pensava Silas ser mais um caso de polícia de última hora que estava a chegar. O rapaz pegou lápis de papel, como era costume e atendeu ao telefone. Mesmo assim, não era um telefonema da polícia. E sim de alguém de fora, sendo da mesma área de jornalismo ou mídia. A voz era de mulher. E Silas respondeu.

---- Sabe quem está falando? – indagou a voz a sorrir.

---- Não. Quem fala? – sorriu Silas a imaginar quem podia ser.

--- Nem advinha? Conto até dez! – sorriu a voz ao telefone.

--- Não faço a menor idéia. – sorriu Silas a imaginar alguém do curso de jornalismo.

--- Mas dos cajus você se lembra? – indagou um tanto maliciosa a voz ao telefone.

--- Cajus? Que cajus? – e a mente de Silas passou a percorrer outros rumos.

--- Já sei que não se lembra da cobra! – sorriu a voz do outro lado do fone.

--- Bati. É Vera!!! – sorriu Silas em verdadeira emoção de menino travesso a dizer o nome.

--- Ah. Agora se lembra, não é seu safado? – sorriu Vera contente da vida.

--- Ora. Mas você está aonde? Que saudade. Há quanto tempo! Imagine. – chorou de emoção o jovem Silas de alegria e contentamento.

E os dois “amantes” conversaram por um longo período. Ela recordando dos cajus e do sítio do velho Heráclito, e ele a se lembrar das cobras e do banho de mar que os dois infantes, certo dia foram tomar em uma praia distante. A cabeça do rapaz rodava em seu pensar como teria sido a vida de dois amantes como eles algum tempo da vida tinham sido. Questões de arengas e má querência, acertos e desacertos. Quantos acontecimentos a se lembrar no meio de um simples telefone. Mas o tempo passou rápido quando Vera chamou Silas para conversar mais a miúda no dia seguinte. Vera teria aula na parte da manha. À tarde, seria mais propicia. Caso ele tivesse interesse em um bom emprego, deveria ir a Agencia Pomar onde Vera estava a ocupar o lugar de vice-presidente da organização. Silas tremeu nas bases.

--- Mas logo eu? – exclamou Silas de modo muito surpreso.

--- Sim. É você. Eu estive consultando os jornais da cidade e vi o seu nome no que você está. Eu quero você comigo. Para sempre. – sorriu Vera ao lhe enviar um beijo pelo telefone.

--- É danado. Eu vou até você amanhã de duas horas. Certo? – indagou Silas a tremer.


domingo, 24 de outubro de 2010

AMANTES - 7 -

- Jennifer Lopez -
- 7 -

O tempo passou. Silas era um rapaz de seus vinte anos. Muita coisa aconteceu no roteiro de sua vida. Então, já bem disposto e fagueiro, presidente de um clube de cinema, certa vez teve oportunidade de ver aquela menina então senhorita acompanhada de um rapaz, com certeza o seu noivo ou namorado. Ele, de muito perto, notou a presença de Vera. Ela, por sua vez, nem notou a presença de Silas. Vera caminhava com seu noivo ou namorado para assistir ao filme exibido naquela manhã de domingo no Cinema de Arte, promoção do Cine Clube. Era tanta gente a entrar no recinto de projeção que Silas mal vislumbrava a presença de Vera. Para o rapaz foi um desacerto total por ver a sua amante aos braços de outro qualquer. Ele então pensava no que eles fizeram de estranho amor no tempo em que eram mais jovens. O mundo rodou em torno de sua mente ao relembrar todos aqueles ébrios instantes quando os dois passaram juntinhos ao bel prazer. Em lembrou de certa vez que os dois amantes (Silas e Vera) caminharam até o Morro da Torre, local ermo e sem habitação onde pudesse se notar alguém para ir buscar cajus e mangas. Foi um verdadeiro momento de terror. Ao chegarem ao Morro da Torre, eles colheram um cesto de cajus. As mandas, verdes por sinal, ele não colheram.

--- Estão verdes! Olha! – fez ver a garota Vera ao seu amante.

--- Assim não presta! Têm outras mais lá adiante! – recomendou Silas.

--- Lá em baixo? – indagou Vera ao garoto.

--- É. Vamos depois buscar mangas nos pés! – respondeu aperreado Silas se livrando das moscas pequenas que zoavam por todo o caminhar.

A mocinha sorria de mais por conta do aperreio de Silas angustiado com as moscas pequenas que lhe azucrinavam a todo o momento. O garoto olhava a sua companheira e sorria para dizer que estava sendo comido pelas moscas.

--- Elas estão me comendo! – respondeu Silas entrechocado com as malditas moscas.

E a garota sorriu para se acabar. Era uma gargalhada só. E Silas também sorriu com seu cesto de cajus pendurado no braço esquerdo. Foi então que a garota de repente se assombrou ao notar a presença de uma cobra verde entre os galhos do arvoredo. Foi um grito só:

--- Olha a cobra!!! – gritou a garota pegando a estrada de volta para fugir da serpente.

--- Onde? – indagou alarmado, com um brutal temor o garoto Silas.

Não deu nem tempo de o infante se virar e ver a tamanha cobra que ele pensava. Era uma cobra e tanto, supunha o infante. E então correu também em busca da sua namorada. A menina se soltou na frente a gritar terrível temendo a ação da serpente a lhe alcançar. Apenas gritava para o garoto que estava bem aos seus pés.

--- Olha ela! Olha ela! Olha ela! No galho! Ela te pega! – gritava a garota correndo em direção a Torre. Aquele era o único local onde havia presença de um homem. O certo senhor bem moço ainda estava sentado em uma cadeira de vime em frente a um birô no interior de um quarto a consertar rádios.

Quando a garota entrou no quarto, espavorida, o homem se alarmou. Queria saber do que se tratava para tanto espanto. Em seguida, entrou o garoto Silas que vinha atrás da atabalhoada mocinha. Ele corria temeroso apenas. Mesmo assim, com as narinas soltando brasa. Apenas a garota Vera traduzia alarme em pânico.

--- É uma cobra! É uma cobra! É uma cobra! – gritava a garota se abraçando com o rapaz da Torre.

E o garoto, em seguida, acrescentou temeroso de receio que a enorme serpente estivesse aos seus pés e trancou a porta de entrada da casinha.

--- É uma cobrona enorme! – alarmou o garoto ainda com o seu cesto de cajus, à tira-colo.

O homem cujo estado era o de consertar rádios de seus donos, moradores em casas distantes, igualmente entrou em pânico a dizer aos garotos que tivesse calma. Ele, por sua vez, agarrou de uma espingarda de soca e evitou ser agarrado pela garota, desvencilhando por fim, e se levantou da cadeira de vime para poder sair do lugar com a sua atiradeira. Enfiou mais pólvora no cano da arma e perguntou aos dois infantes.

--- Onde está essa cobra? – indagou ao se levantar o homem que consertava rádio.

A menina, com seu vestido todo rasgado pelas estacas da porteira da casa, quando foi entrar, apenas disse:

--- Ali! Ali! Ali! No mato! – cheia de medo e de terror emendada pelo seu amante.

--- No mato! Tem uma ruma de cobra! – acrescentou o garoto Silas com o calção quase a cair.

O homem que consertava rádio e tomava conta dos aparelhos eletrônicos de uma radio que enviava o seu sinal de um bairro para o outro, pediu aos garotos que lhe deixassem ir ver tamanha cobra. E seguiu o homem a devassar o terreno até ao pé do morro procurando ver se tal cobrona existia de verdade. Pelo que dissera o menino, era mais de uma. Um monte. Com certeza era um ninho de cobras. Alí onde estava a Torre, sempre apareciam serpentes e vez por outra o homem dava cabo dessas cobras. Eram às vezes Coral, Caninana e mesmo papa-ovo, jararaca e cascavel. A Torre ficava em um terreno plano, porém era um cerco de mato ao redor vez que as serpentes habitavam aquele local de há muito. Os garotos – Vera e Silas – seguiram de longe o rádio-técnico temendo uma represália das cobras. O garoto perguntou a Vera um pouco baixinho:

--- Você viu o cobrão? – indagou Silas a Vera tremendo de medo com o seu cesto de cajus.

--- Eu vi! Ora! Era uma cobrona! – retratou a mocinha com todo o seu medo de cobra.

Enquanto isso, o homem vasculhou por todos os cantos no pé do Morro, já distante do local da Torre e nada ou nenhuma cobra ele pode observar. Com certeza a serpente já teria saído do seu local. O rádio-técnico vasculhou por ampla região a procura de ninhos de cobras e nada mais foi encontrado. Para não perder a viagem o homem usufruiu de um caju tirado no pé. Era um caju doce e travoso, grande e suculento cuja emoção era de dar água na boca. Para afagar os desesperos dos dois garotos – Vera e Silas – o homem disparou a sua espingarda para cima do cajueiro e assim ele acabou com a fama da serpente para todo o sempre. Muito embora ele não tivesse visto nem sinal de cobra nos aceiros do local onde existiam melancólicos os cajueiros, mangueiras, umbuzeiros, pitombeiras e outros tantos. Para além do morro era mata virgem e apenas eram tomados pelos caçadores de cotias, veados, raposas e outros animais pequenos e apanhadores de lenha. Esse pessoal era acostumado em conhecer animais e repteis por onde passasse. Com o disparo, o rádio-técnico acreditava ter amedrontado o réptil que por ventura alarmou os dois amigos, infantes ainda, talvez irmãos, pois ele desconhecia o passado de Vera e Silas. Ao retornar a oficina, o homem preveniu aos dois garotos que aquele local era “assombrado” e só os homens que tiravam guarda por aquela região podiam ter acesso.

--- Mas tem um homem que mora dentro da mata! – respondeu Silas ao técnico em rádio.

--- É. Seu Heráclito. Ele vive nas matas. É conhecedor de toda aquela região. Mas eu recomendo a vocês não irem atrás dele. Dizem que ele é meio “maluco”! – sorriu o homem querendo fazer mais medo aos dois garotos.

Silas olhou para Vera e sorriu como quem dissesse.:

--- É para lá que nós iremos. Afinal. ... .- quis dizer Silas à mocinha.

Vera sorriu em troca compreendendo o que Silas quis informar naquele instante. Afinal, as cobras já haviam de se acabar, certamente.

Esse pensar Silas recordou ao ver Vera de braços com o seu noive a entrar na sala ampla do cinema naquela manhã de domingo. Aqueles braços dados um dia foram seus, apesar das brigas do Grupo Escolar e dos ciúmes de Ana sempre fazia aos dois amantes. Era uma luta constante entre Silas e Vera. Logo, Silas se lembrou do velho e louco Molambo cujas vezes o fazia temer. Silas tinha momentos de reflexão dos tempos mais remotos o qual passara ao lado de Vera. E se lembrou de Helena e de outra amiga de Vera de nome Racilva. Essas duas amigas eram alunas do período da tarde do mesmo Grupo Escolar que eles freqüentavam pela parte da manhã. Com o passar do tempo, Silas se encontrou com Racilva, na Universidade. Os dois estudavam em cursos diferentes. Quando havia festa e eventos, Silas sempre encontrava Racilva, já com um rapaz que talvez se dissesse ser o seu namorado. Racilva era alva, cabelos encaracolados. Era uma meiga senhorita naquela fase da vida.

Quando a sessão terminou Silas não viu nem sombra de Vera. Era gente demais para assistir a sessão de cinema. Ela e o noivo com certeza tinham seguidos outro rumo, da esquerda, pelo menos. Com certeza, Silas se lembrou do ancião Molambo cujo feitio era de um homem já velho, feito um traste e quase acabado. Roupas em trapos, iguais as que estavam a trajar os homens do filme que naquele dia foi projetado. Mesmo assim, Silas ainda procurou ver se encontrava Vera, a bela jovem irrequieta que um dia fora uma pequena travessa em buscas de seus amores juvenis. Por mais que antever a procurando, Silas enfim retornou a sua labuta. Era hora de conferir os ingressos da sessão matinal do Cinema Olímpia onde acabara de projetar o filme daquela manhã de setembro. Nesse instante, um rapaz chamou Silas apressado:

--- Silas! Tem alguém a tua procura! – orientou o rapaz apressado.


sábado, 23 de outubro de 2010

AMANTES - 6 -

Elisabeth Shue

- 6 -

Ao final da tarde Silas Albuquerque entrou em sua casa. Sua mãe, Lindalva, estava uma fera. Quando o garoto chegou foi logo recebido a bofetes, gritos e puxavante de orelha. A mulher, desesperada, procurava saber o que o filho tinha feito na parte da manha que sumira da aula e do grupo escolar para ninguém mais poder vê-lo. O garoto não corria. Apenas esperava as pancadas de sua mãe. Com um azedo na boca a mulher reclamava pelos cotovelos a sorte que Deus lhe deu em ter um filho tão malvado como aquele. Silas nada respondia diante da ação intempestiva de sua mãe. Ele apanhou de tapa e por fim, de palmatória que a mulher guardava suspensa no interior da cozinha para o emprego em horas incertas. Três bolos de palmatória em cada uma de suas benditas mãos. A tagarelice de sua mãe infernizava muito mais ao garoto que os próprios bolos da famigerada palmatória, em pedaço de madeira de trinta centímetros de comprimento por uma espessura de duas polegadas feita especialmente para bater com força em preso nas cadeias da cidade.


--- Vai dizer ou não onde se escondeu???? – indagou a mulher com a maior valentia que podia ter em hora quase da Ave Maria.

--- Eu estava no mercado! – foi só isso o que o garoto Silas confessou, mais por medo da palmatória do que pela valentia de sua mãe.

--- E por que saiu da escola?? – perguntou a mãe Lindalva com a mão nos quartos, palmatória vibrando e olhos esbugalhados.

--- Eu saí para não levar castigo! – respondeu o garoto em boas intenções.

--- Castigo é??? E eu feito uma maluca respondendo a diretora o que não sabia!!! Vá já para o quarto!!! Está de castigo!!! – gritou a mãe de Silas desesperada com o sossego do garoto.

No dia seguinte bem cedo, sem pedir a bênção à mãe Silas saiu para o Grupo para assistir a aula. De Vera nem quis saber. Para o infante, Vera não passava de uma “doida” e ele não queria mais saber conversa com ela. Na metade do caminho ele viu de perto o “louco” que o povo chamava de Molambo. Apesar de tentar escapulir, ele não saiu do lugar em que estava. O “louco” olhou bem para Silas e depois, entre barbas espessas no rosto, cabelos da cabeça grande e retorcidos achatados por um chapéu de panamá todo roto, mas velho que nunca, sorriu como quem não queria formar um desafeto com o infante. Tenso por todos os meios, Silas não falou coisa alguma. Apenas olhava para o “louco” Molambo, postado a sua frente no caminhar da escola. O que pensava o infante era de que se fugir, o “monstro” pegava lhe na certa. Se tentasse passar, seria do mesmo jeito. Então, resolveu ficar parado como uma múmia dos tempos remotos. Silas em nada podia vislumbrar no que poderia Molambo está naquele momento a sorrir vagamente. O pessoal saía das suas casas para o trabalho ou para o Mercado Publico e mesmo para qualquer bodega da região. Ninguém notava o medo que sacudia Silas naquele terrível instante. Os garotos do Grupo passavam por Silas a chamar para a aula do dia, porém o garoto estava estático. Apenas ele estava a ver as longas barbas de Molambo, suas vestes rotas, encardidas, remendadas com pedaços diferentes de outros trapos, saco às costas que o velho segurava com a mão direita. Saco velho todo furado, mostrado os trapos que nele estavam. Mochila comprida para se possuir para levar qualquer caso. Apenas a sombra de um sorriso fazia o pavor ao garoto naquele momento. De repente, deu-se uma brecha ao velho olhar em torno e ver alguns garotos a chamar:

--- Molambo!!! – vozes dos meninos a gritar e a correr.

Aproveitando a volta de olhar que Molambo fez, então Silas pegou o caminho e partiu em vertiginosa disparada deixando para trás todos os colegas do Grupo. Com o coração a bater, quase a sair pela boca, o infante penetrou no terreno do Grupo e se escondeu na privada por um bom pedaço de tempo. Ao soar a sineta do velho Mousinho, então Silas partiu em direção a sala de aula, passado por entre todos para chegar a primeiro lugar. Assim, passou Silas por Vera e Ana e nem as duas cumprimentou.

--- Raça ruim! – foi o que pensou ao passar pelas duas alunas.

Quando a professora Margarida começou a fazer a chamada dos alunos presentes, Silas estava no mundo da lua a se lembrar da figura de Molambo por vezes inquietante. Ele deitou a cabeça na carteira como se quisesse chorar. O mundo aos seus pés se transformou em uma gigantesca pirâmide. Ele nem notou as lágrimas a descer pelo seu rosto. Em determinado instante, uma colega de escola o chamou, pois a professora acabara de recitar o seu nome.

--- Estás doente Silas? A professora está chamando você. – comentou a garota em voz baixa.

O infante então se levantou da cadeira e respondeu que estava presente. A mestra vislumbrou o seu rosto e teve compaixão do garoto por causa do dia anterior. E lhe perguntou:

--- Você está bem? – indagou dona Margarida olhando por cima dos óculos.

--- Sim senhora. – respondeu o infante à professora enxugando as lágrimas.

--- Venha até aqui que eu quero você de perto. – foi o que disse a mestra.

O infante deixou os livros na mesa da carteira e seguiu até ao birô da professora com seu jeito todo desarticulado de andar. Ao passar pelos os colegas de aula nem reparou os olhares que lhe lançaram naquele momento de desacerto. Apenas ele seguiu de modo firme e resoluto até onde estava a mestra. Ao chegar ao local à mestra olhou o garoto de cima abaixo. E ela notou as mãozinhas do infante todas as duas inchadas. A mestra chamou o meigo e inquieto garoto até onde ela estava. Pegou-o no colo e lhe perguntou baixinho:

--- O que foi isso em suas mãos? – indagou a professora o acalentado.

--- Nada não. – respondeu o aluno ainda a chorar.

A professora passou a mão nos seus macios cabelos e o olhou de frente enternecida. Nesse momento ela chamou o infante para ir com ela até a diretoria e recomendou calma em toda a classe, pois voltaria em um instante. Margarida, a mestra, seguiu com o garoto até a diretoria e chegando lá mostrou à diretora como as mãos de menino estavam deliberadamente inchadas, pois ele, apesar do silencio, teria levado uma sova de palmatória porque não assistira freqüentar a escola no recente dia passado. A diretora, dona Eunice se lacrimejou como uma mãe ao ver as mãos do infante todas intumescida. Após assuar o nariz pediu ao garoto que dissesse o que levara a fazer tal agrura.

--- Foi só uma brincadeira de mau gosto! – explicou o menino chorando.

--- Que brincadeira foi essa? – indagou a diretora Eunice.

--- Eu disse que a aluna Vera não estava porque tinha sofrido dor de barriga. – comentou o garoto.

--- E ela faltou mesmo? – averiguou a diretora a olhar as mãos inchadas do infante.

--- Não. Ela estava presente. Mas a minha professora disse que me punha de castigo. Então eu fugi da escola. – chorou o garoto Silas.

Dona Eunice novamente assuou o nariz e depois pegou o menino e pôs ao colo a tecer palavras de carinho a lhe dizer que ele não faria outra vez brincadeira desse estilo. E que ele fosse pedir desculpas a sua colega Vera por ter posto em humilhação perante a classe. O garoto ouviu tudo o que recomendou a diretora e se comprometeu em pedir desculpas. De volta à sala de aula, ele e a professora Margarida foram tomar o seu assento. De imediato, a professora fez ver a ele que havia de pedir desculpas a sua colega de classe pelo vexame que ele fez. O garoto então seguiu até a carteira de Vera e apresentou seu pedido de desculpas. A menina aceitou embora tenha ouvido de Vera uma demonstração de que para ela não tinha desculpas ao proferir a palavra:

--- Monstro! Asqueroso! Palerma! – foi o que disse baixinho a aluna Vera.

O infante então voltou para a sua carteira sob os olhares de dona Margarida, a professora.

O período letivo encerrou no final daquele ano com a conclusão da aula para todos os alunos da quinta série. Nesse ponto concluíram o curso todos os alunos ali matriculados, inclusive Vera, Silas e Ana. Houve festa entre os estudantes e quase todos participaram. Foi uma festa realizada na parte matutina com atrações bem diversas. Cantos, recitais, negócios do gênero da cultura de onde os garotos moravam ou viviam. Foi mesmo uma manhã de muita alegria e contentamento. Silas foi um dos que participaram de brinquedo animado onde todos os alunos gostaram dos esquetes apresentados, inclusive Ana e Vera, extasiadas com o popular da garotada, as duas de modo a sorrir. Os trajes dos garotos eram típicos de pescadores e eles entoavam cantos alusivos à pescaria. Quando terminou a festa foi servido um almoço para a garotada. Eram mais de cem alunos a presenciara festa. As senhoras professoras eram as que mais entusiasmo sentia. A alegria da garotada foi mais tempo que a previsão do que esperava da a direção do estabelecimento de ensino. O Secretario de Educação esteve presente à jovial formatura dos novos alunos concluintes. A debandada se deu em meio ao tumultuoso fervor de brilhante entusiasmo com cada qual se despedindo com abraços dos amigos e professoras cuja presença sentiria a falta para os anos seguintes. Em determinado instante, Vera se aproximou de Silas dizendo que tudo que ele fez foi por demais espirituosos. E sorriu com ele. Ana, por sua vez, trouxe um ramalhete de rosas para dar de presente a Silas agradecendo pelas belas risadas tidas durante toda a festa de encerramento. O garoto sorriu também agradecendo a Ana pelas rosas ofertadas.

--- Nem precisava. Bondade sua. – sorriu Silas delirante de contentamento.