sexta-feira, 29 de outubro de 2010

AMANTES - 12 -

- 12-

Certo dia após, Silas estava no apartamento de Vera. A aula de Silas terminara um pouco antes do normal. Ele já fazia do apartamento o seu novo lar, apesar de ter que ir a casa de sua mãe quase ou todos os dias. Dona Lindalva, a mãe de Silas, era mulher de seus sessenta anos. Às vezes, estava com Lindalva a sua comadre de fogueira, Dona Clotilde, que passava dias e mais dias morando naquela casa. Sempre que Silas desaparecia, era Clotilde quem assumia o lugar do rapaz. Com relação a Vera, certa vez Silas já estava na ampla sala do Ap a consultar seus apontamentos do filme que faria no mês seguinte. Vera estava ao lado, no birô, fazendo talvez a mesma coisa ou algo parecido. Os dois amantes viajariam para o sertão da Bahia dentro dos próximos dias para a região da Chapada Diamantina onde seriam feitas as filmagens do documentário. Eles estariam mais propriamente do sertão do Rio das Contas. Naquela noite tudo era silencio no Ap de Vera Muniz a não ser o barulho tênue que chegava de baixo dos automóveis que passavam para um lado e para o outro. Uns gritinhos de quando em vez e nada mais. Em dado instante, Silas parou de ler os seus apontamentos. Ele olhou para Vera e não sabe por que teve a idéia de lhe perguntar:

--- Você nunca quis casar? – indagou Silas a Vera Muniz.

--- Hum? – quis saber a moça de forma aleatória à pergunta do rapaz feita de supetão.

--- Casar. Ou mesmo viver junta com alguém. - explicou Silas de forma mais sutil.

--- Ah sim. Casar, não. Eu não penso em casar. Tem muitos compromissos. Se eu chego tarde ao Ap o homem vem logo saber onde eu estava. Se não saiu ele vem com a pergunta: “Não vais sair hoje”? – sorriu Vera ao responder ao seu amante.

--- É verdade. E tem os filhos. Negócio para mais pensar. – sorriu Silas acabrunhado com a pergunta feita por ele.

--- É. Os filhos. Já estive com um rapaz. Por sinal ele era casado. Mas estava se largando da esposa. Vivemos poucos meses. Um dia, por um motivo qualquer, ele me viu acompanhada com outra pessoa. Eu e o rapaz éramos somente amigos. Mas foi o ponto da discórdia. Ele foi embora. Um para um lado e outro para outro. – fez ver a moça à indagação do rapaz.

--- Sei bem que eu te vi alguns domingos, com esse tal rapaz. Seria esse? – indagou Silas surpreso com a estória.

--- Não. Mas que cinema? – indagou Vera Muniz de forma surpresa e tecendo a cabeça para ver se lembrava de algum cinema.

--- Olímpia. De manhã. Certo domingo. – sorriu Silas ao responder a indagação de Vera.

--- Ah sim. Olímpia. Naquele domingo eu procurei você. Mas o rapaz que estava comigo era tão apressado que tive de voltar. Ainda te chamei. Eu ti vi naquela ocasião. Sabia que você tinha me visto também - - sorriu franca a moça.

Silas igualmente sorriu na oportunidade. Ele não sabia ter sido Vera Muniz o alguém que lhe procurara naquela oportunidade.

Os amantes estavam já propensos a viverem juntos. Casar, talvez não. A moça queria apenas viver como dois amantes. Eles viveram como amantes por longo período quando ainda eram estudantes do Grupo Escolar. Silas pesquisou a memória e foi encontrar um dado que por eles passou. Certa ocasião, os dois amantes, ainda infantes, foram a uma praia um pouco distante para tomar banho de mar. Era uma praia deserta. Pouca ou quase nenhuma gente passava por essa região. Apenas pescadores arredios que aproveitavam a maré seca ou mesmo enchendo. Tinha um Forte na região, algo pouco distante de onde os amantes tinham chegado. Havia morros ou dunas. Nesse dia em que eles foram, subiram uma duna e desceram para o seu meio para depois subir para o outro lado. Foi nessa ocasião que Silas viu um casal postado em outra duna, encostado na parede da duna, fazendo sexo. Ele chamou a garota Vera para ver também o que ele vislumbrara. Vera foi até a encosta e de momento viu os dois namorados fazendo sexo escondidos pelas paredes das dunas. Os dois garotos – Vera e Silas – ficaram assustados com o que estavam vendo afinal. Mesmo assim, sob o doce barulho do mar ao romper as ondas nos rochedos postos ao longo, os amantes, temerosos, ficaram a ver os dois enamorados a cumprir o seu desejo de um logo e duradouro amor. Vera sorriu e disse a Silas:

--- É assim que eu vejo a mulher vizinha fazer com o marido. – falou Verinha a sorrir.

--- Psiu. Cala tua boca. Eles podem ouvir que estamos vendo. – articulou Silas para a garota.

A mocinha então sorriu querendo fazer o mesmo compromisso que ela estava a ver naquele sublime momento de afeição. O tempo era de tarde, e os amantes, olhando os namorados então fizeram a seu jeito o que estavam a ver.

Silas sorriu complacente repleto de suavidade ao se lembrar do momento de pleno amor na praia azul de areias escaldantes em meio a umas dunas. A jovem observou Silas a sorrir e indagou por que ele estava a sorrir de forma tão displicente. Silas apenas sorriu e então gargalhou ao dizer a meiga jovem que era o caso do amor estranho que um dia eles assistiram.

--- Quando? – indagou Verinha a sorrir também.

--- Um dia. Faz tempo. Na praia. Os dois namorados. – sorriu Silas ao lembrar que também tinha feito o pleno amor a dois.

--- Ah bom. Disso você não esquece. Nem me lembrava mais. – sorriu Verinha ao chamar Silas para o quarto de casal.

E então, eles fizeram um verdadeiro amor sublime para lembrar de fato o que tinham visto nas dunas da praia distante e sem quase ninguém.

No domingo daquela semana, os amantes foram passear ao longo, em uma praia deserta, onde apenas o vento açoitava as paredes rochosas de suas estepes colossais de cinco metros de altura e para cima e para dentro ao longo da terra plana comungavam verdadeiras planícies extraordinárias varrendo o chão com o céu. O marulhar das ondas vinham se por até aos pés dos amantes. Verinha corria temerosa se atracando ao rapaz. A moça receosa penetrava em umas cavernas abertas pela própria natureza na rocha árdua. Os amantes estavam ali solitários a contemplar a própria natureza. As roupas de banho que a moça trajava podia se notar muito bem a silhueta de seu corpo ardente e amado.

Vozes distantes. Eram pessoas a transitar por cima onde os amantes estavam encolhidos nas cavernas abertas na rocha antiga feita com esmero, de cores avermelhadas e escurecidas. As vozes tomaram rumo diferente de onde estavam os amantes. Os dois sorriram e então se fez amor à sombra do penhasco sob as ondas do mar aberto a salpicar salgadas porções das águas onde retinham a vida. Era o orgasmo da natureza feito a qualquer motivo. Logo após o descanso os amantes foram até a praia já um tanto cheia para se banhar e retirar os salpicos do orgasmo. Era amor tão delirante como fora em tempos juvenis. Verinha sorria a um só tempo a sacudir água nos magros peitos de Silas. Esse se ajeitava e sacudia em troca salpicos de ondas para a moça correr à praia até cansar. Tantas horas perdidas pelo tempo e que então Silas tentava reaver. Após aquele eterno aconchego os amantes seguiram rumo afora até chegar a uma vila onde havia um rústico bar. E por ali se refestelaram de mariscos e goiamuns ao toque de uma sanfona puxada por um acordeonista sem nome. Do meio da terra surgiu a figura de um esmoler a pedir a ajuda dos amantes. Ele era o Molambo, com certeza. Verificou o jovem Silas.

--- Você é Molambo? – indagou surpreso o jovem Silas.

--- Sim. Uma esmola, pelo santo amor de Deus! – recitou o velho encanecido Molambo.

--- E o senhor mora por esses lados da praia? - pesquisou de forma sutil a moça Verinha.

--- Eu moro aqui mesmo. – respondeu Molambo ao receber uma nota do rapaz Silas.

--- Mas eu conheço o senhor de há muito. Eu era moçinha. Pequena. E o senhor era morador de um casebre de papelão! Nossa Senhora! – disse alarmada a moça Verinha.

--- Isso foi há muito tempo. Hoje eu moro aqui, onde nasci. – recitou Molambo.

--- E como é o seu nome verdadeiro? – indagou Silas a pesquisar o homem.

--- Diomedes, meu filho. Diomedes. Aqui ninguém me chama desse nome de Molambo. – respondeu o velho cabisbaixo.

--- Você tem filhos? – indagou Silas ainda surpreso.

--- Não. Filhos, não. Eu moro com a minha irmã lá no alto depois do rio. – falou Molambo ainda cabisbaixo a guardar seu dinheiro.

Silas olhou para Vera Muniz querendo dizer que ali tinha uma idéia. Ela então compreendeu o que o rapaz falou ou quis falar. Afinal eles estavam diante de uma figura que para eles fez história pelo medo que o dois sentia quando meninos. O homem, de seus sessenta anos, ainda era vivo. Talvez tivesse mais algo para contar, no lugar de somente pedir esmolas. Talvez.

--- Mas o senhor nunca casou? – indagou Silas alarmado.

--- Há muito tempo eu era noivo. Mas a moçinha logo morreu no dia do casamento. – recitou Molambo como quem queria chorar

--- O vestido de noiva! – argumentou alarmado o rapaz dizendo isso para Vera Muniz.

Nenhum comentário: