quinta-feira, 14 de outubro de 2010

DANÇA DAS ONDAS - 50 -

- Barbara Paz -
- 50 -
A moça voltou a sorrir com o desfecho dado por Dumaresq. E sorriu onde podia se lembrar no caso de uma pergunta feita ou não feita por ela: “Será?”. Essa indagação trazia problemas para o velho se ele de fato ouvisse Lucia a indagar. Porém ela não teceu tal comentário. Apenas observou o velho Dumaresq e nada mais. No motel de luxo onde ficara com Honório, ela pode observar o desatino do rapaz. Lucia tinha adquirido três peças de roupas bem compostas e apenas uma o homem pode observar. Mesmo assim nem se preocupou em saber por quanto fora àquela despesa da moça. Além dos três vestidos teve mais combinações de seda e dois pares de sapatos de ultima moda. Nada disso Honório tomou conhecimento. Apenas pagou a conta. Para a jovem moça aquilo não tinha gerado preocupação. Porém, no dia seguinte, ao ver o desequilíbrio de Honório perante o seu tio, ela voltou em suas elucubrações. O velho ainda não estava tão alquebrado pela sorte e sabia muito bem o que fazer. Naquele momento, Luiza recordava da oportunidade de ter uma casa. Mesmo assim, contemporizou aquele instante, talvez para poder observar melhor o que estava a acontecer.

--- Aquele quadro vale muito – refletiu o velho displicentemente.

--- O senhor quer que eu ligue agora? – perguntou a moça ao velho.

--- Faça, por favor. – respondeu o velho D em uma atitude desatinada, pois pensava mais nos quadros.

A tarde chegou logo após e Luiza, por volta das três horas, procurou o velho Dumaresq na galeria de artes, onde ele devia estar. Com Luiza desceu também a jovem Carmen. Essa não sabia o que lhe esperava. Apenas seguia a moça modestamente. O velho estava entretido com as molduras para por na parede, na sexta-feira vindoura, quando ele queria mostrar os dois quadros de Rafael que a moça copiou. Não notou a presença de súbito da sua secretaria, Luiza ao dizer que a jovem Carmen estava com ela. O velho se pôs de imediato a prumo e com sublime delicadeza e cumprimentou a jovem mulher. O sol ainda estava bem quente e o ambiente na sala era de tenaz calor. Automóveis iam e vinham a passar pela frente do atelier. Moças, rapazes, homens sisudos e donas de casas passavam a toda presa pela calçada do bazar sem notar que dentro estavam homens a trabalhar freneticamente para abrir a loja logo depois, às quatro horas. A gerente Nora Velásquez estava junto do velho Dumaresq conferindo as peças e anotando as medida para que, na sexta feira estivessem prontas. O bonde trafegou próximo ao atelier e se ouviu o barulho que fez ao sair. O rádio tocava ao longe um choro bem conhecido cujo nome era Resedá o que levou o velho a olhar sorrindo a sua bela e modesta secretária Luiza que de temor também sorriu. Nora de imediato notou o sorriso de Luiza e fez também o leve sorriso como quem quisesse dizer que estava ouvindo a melodia. E logo depois veio outro chorinho que tinha o nome de Odeon tocado em plena luz da tarde ao piano. Logo após, o velho falou a jovem moça Carmen.

--- Vamos aos negócios. – relatou Dumaresq.

A moça Carmen sorriu de leve como se estivesse com puro medo. Ela observou Luiza temendo ser reconhecida de imediato. Mesmo assim, não relutou ao dizer.

--- Sou toda ouvida. – sorriu Carmen inquietando-se com os braços presos entre si.

--- O preço da obra? – indagou Dumaresq sorrindo.

--- Eu não sei. Deixo a sua responsabilidade. – respondeu a moça Carmen.

O homem refletiu um pouco dando margem ao tempo. O que parecia era que a jovem era uma estreando em exposição de seus quadros. Por isso tomou o ensejo de perguntar quantas mostras de artes a moça já havia participado. Carmen relutou em dizer, porém declarou que estava com uns quadros de sua própria elaboração expondo em uma galeria de outro Estado. O homem fez um leve sorriso. E indagou se ela teria idéia por quanto venderia os seus belos quadros. Ela fez um gesto de não saber.

--- Bem. Nesse caso vamos bater um contrato. A senhora fica com vinte por cento do que for apurado e o restante é da “Botija”. Não pense que seja pouco para a senhora. Nós arcamos com as despesas, propagandas, anúncios, jornais e tudo mais. A senhora ganha 20 por cento limpos e crus. Aceita? – perguntou Dumaresq com o rosto trancado.

A moça ficou a indagar da jovem Luiza se era bom aquilo. Luiza respondeu não saber. Porém pelo jeito era melhor aceitar.

--- Olhe bem. A senhora, se sair vendendo por aí, não vai encontrar um preço justo. É por isso que eu pergunto. Sim ou não.

Mais uma vez a dúvida. Após certo tempo a moça disse aceitar. O velho teve que subir para o primeiro andar e cegando onde estava o escritório, bateu o contrato para a secretaria passar a limpo e então a moça assinar. Com todo esse tempo, Dumaresq passou a ligar para o rapaz auxiliar de molduras e fazer os arranjos dos quadros. Dumaresq ligou para os jornais da cidade e encomendou tiras de propagandas para as artes. Quando Carmen assinou o contrato, Dumaresq advertiu que daquele momento em diante a moça se preparasse para dar suas entrevistas aos jornais e rádios. Tudo estava sacramentado, então. A moça Carmen ficou aturdida pelo que tinha a falar com a imprensa.

--- Não se incomode com isso. Nós falaremos por você. – disse o velho a sorrir.

Na sexta feira, tudo estava armado para a exposição do quadros de Carmen retratando duas obras de Rafael: “Transfiguração de Jesus” e “A Sagrada Família”. Os valores eram por demais impressionantes: U$ 50 mil cada peça. O sobrinho do velho Dumaresq advertiu que por tais preços nem vendendo o Bonde. O velho, ao saber do que o sobrinho dissera, recomendou que ele fizesse silencio, afinal era a sua loja quem estava em jogo. Em cada peça já havia um aviso: “Reservado”. Isso demonstrou o valou das peças para cada um dos visitantes. Alguém perguntava quem teria o poder de comprar uma peça por tão alto preço. A moça Carmen não cabia em si. O velho argumentou dias antes um nome para a sua modesta pintora. Teria que ser um nome que impressionasse a todos. Surgiram vários títulos. Por fim chegou-se a um em definitivo: Carmen Azucena. Os repórteres dos jornais não paravam em perguntar a Carmen se ela era de outro País. A moça dizia apenas que seus pais tinham vínculos com o pessoal de fora. Fotos de todos os ângulos. Era um tomento para a moça. Até um rapaz que se dizia de origem francesa e de família de brasão dedicou um poema em forma de pedido de noivado a jovem senhorita. Para Carmen o que lhe importava era receber a sua parte na venda de suas obras de arte, reprodução de Rafael, o autor verdadeiro.

Um jovem da Igreja Católica esteve no local a observar a obra de Carmen Azucena e indagou por quanto era pretendia vender as amostras. Ela respondeu que tal assunto era só com o seu marchant. Ele insistiu que os originais já estavam no Vaticano. E ela respondeu que não estava à venda o original. Apenas uma reprodução da obra de Rafael.

--- Mas isso é uma exorbitância! – reclamou o jovem da Igreja.

--- Compra quem pode meu jovem. E as obras já estão negociadas. Apenas “A Botija” tem a satisfação de mostrar tão belas obras de arte. – proclamou soberbo o velho Dumaresq.

--- Isso é uma afronta a Rafael. – reclamou o rapaz com a cara franzida.

--- Olha bem moço. Ninguém pediu a sua intromissão nesse assunto. – teceu Nora Velásquez.

De um pulo o rapaz foi embora para no dia seguinte sair uma reportagem de capa no jornal de propriedade católica que se estava fazendo comércio com obras sacras. Um cidadão norte americano pediu para se mostrar as duas obras, pois ele queria adquiri-las. A resposta veio de imediato.

--- As peças estão negociadas. – relatou uma porta voz de “A Botija”.

--- Eu dobro o valor de compra! – enfatizou o norte-americano.

O assunto calou fundo no coração de Dumaresq. U$ 100 mil por cada uma das obras de arte. Era um clarão de felicidade para a moça que nunca pensou em ganhar tanto dinheiro. O negocio foi feito e as peças enviadas para os Estados Unidos sob abrigo de severos agentes da polícia norte americana, dias depois. Dumaresq já estava repleto de felicidade, pois seu atelier passaria a ser um conglomerado internacional com adesão de outros salões de arte. A artista Carmen Azucena era então a mestra de refazer obras de arte, beliscado peças de Da Vinci, Michelangelo, com a pintura Pietà, obra original em escultura representando Jesus morto nos braços da Virgem Maria e Donatello refazendo em pincel a obra original do escultor. Não sobrava tempo algum para a moça Carmen Azucena, trabalhando dia e noite. Às vezes, recebia em seu próprio atelier a vista de Dumaresq e em outras, a visita de Honório. Nesses dias ela estava sempre suja de tintas já não mais pensando em continuar suas obras em aquarelas.

Eram completados quarenta e cinco dias de engessamento da perna a mulher de Honório. Chegara por fim o dia de se retirar aquele envoltório que tanto a incomodava. De manhã, logo cedo, Ângela seguiu no carro do marido, em sua companhia para o hospital. Na casa de saúde um enfermeiro retirou as peças postas na perna e o médico mandou fazer novos exames de radiografia. Foi um tempo eterno. Passou-se pelo menos até as onze horas da manhã. Porém, tudo estava ótimo. Um medicamento foi passado em caso de dormência ou dor. O casal regressou feliz e contente para a sua mansão. Ao cruzar com uma rua, um caminhão de óleo cru buzinou insistente por ter em seu trajeto o veículo do rapaz Honório. O automóvel seguia pelo lado direito do caminhão. Ângela, ao desespero gritou:

--- Cuidado!!! – clamou insistente a jovem Ângela temendo pela batida do seu lado. E com isso levantou o braço cobrindo o rosto.

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