sexta-feira, 1 de outubro de 2010

DANÇA DAS ONDAS - 37 -

- Tony Curtis -
( 1925-2010)
- 37 -

No dia seguinte, Honório esteve logo cedo no Hospital do Coração. Esperou longo tempo pela chegada do médico. De tanto esperar, ele tirou os seus sapatos e passou a coçar os dedos do pé descalço. Quando o médico apareceu após os bons dias habituais, ele foi logo a perguntar pelo estado de saúde do seu pai. O médico então veio logo a perguntar se o velho tinha contato com gente da África. E o rapaz logo respondeu que, ultimamente, ele esteve a bordo de um cargueiro que esteve naquele continente. O medico ficou calado, de cabeça baixa a procura de uma resposta. E falou em seguida:

--- É o seguinte. Isso é uma hipótese. O seu pai deve ter sido mordido por uma mosca “tsé-tsé” transmissora da moléstia do sono. Essa é uma hipótese. A mosca vem da África, da região de Angola ou Moçambique. Por esses países. Ao que parece, ele guarda os sintomas de quem tem doença do sono.

--- Puta-merda! E agora? – perguntou alarmado o filho de Dumaresq.

--- E agora? É esperar! Nós tiramos amostra de sangue para exame. Ele pode durar até seis anos. Também pode ir a óbito em apenas seis meses. Tudo isso são hipóteses. Vez que o paciente esteve a bordo de o navio vindo da África, ele pode ter sido picado por uma mosca do sono. Mas, pode também ser outra causa. – respondeu o médico ao filho de Dumaresq.

--- Isso é uma porra. Caralhos me mordam. – caiu em prantos Honório.

--- Tenha calma. Tenha calma. São hipóteses. – falou o medico a Honório.

--- Hipóteses! Hipóteses! – e o homem continuou a chorar como uma criança.

Na verdade, Dumaresq tinha estado em um navio que havia aportado em portos da África. Esse fato fazia quase um mês. O homem costumava a embarcar em navios cujo itinerário fosse a cidade onde ele estava. Como despachante, tornava-se mais fácil Dumaresq embarcar em um navio de bandeira estrangeira. E então, ele conversava com o capitão do navio e visitava os camarotes da embarcação e até mesmo o bar onde a conversa era mais ampla. Eram vários navios que aportavam e ele os visitava. Dessa forma, Honório sempre se lembrava dos navios visitados por seu pai, pois muitas ocasiões ele também estava a bordo de tais embarcações. O caso do navio em apreço foi pelo motivo de se ter servido um almoço ao despachante, caso raro de se ofertar a um visitante. E o rapaz se lembrava de ter um mosquito ou mosca pousada no pescoço de Dumaresq e esse matou sem dó nem piedade aquele inseto. Não fora esse detalhe, talvez Honório nem se lembrasse do fato. A mosca do sono era um inseto que podia existir em uma longa travessia de um navio. Talvez, esse inseto fora o mesmo que nessa oportunidade fazia o homem a sua vítima.

Quando Honório chegou ao escritório depois de passar por sua Mansão a contar a novidade da tsé-tsé que poderia ter acometido o velho Dumaresq, a arrumação da escrivaninha de sua nova secretária, Luiza de Campos, era o seu nome completo, já estava organizada. A moça informou que devia haver uma pessoa para cobrir a Agencia dos Correios onde buscaria as correspondências postadas na Caixa do velho Dumaresq. Ao dizer tal fato ela olhou fixo o olho de Honório e notou a presença de lágrimas. Então indagou:

--- Então? Que houve? – perguntou Luiza de Campos surpresa com a resposta.

--- O velho. Você já não estava aqui. Foi no tempo em que você se afastou. Ao que parece, ele foi picado por uma mosca transmissora da febre do sono ou doença do sono. Dá no mesmo. O problema é que se for isso mesmo, ele tem dias contados. – falou Honório entristecido.

--- Pena! – destacou Luiza sem chorar.

A esposa de Dumaresq, a senhora Anita Colares, estava no Hospital do Coração nesse mesmo dia. Então, foi quando o médico lhe chamou para dizer as novidades do paciente. A mulher entrou no consultório do médico por deveras apreensiva. O seu estado de nervosismo era angustiante. A mulher quase não fazia suas refeições na hora certa. E em outro horário sempre vinha com explicação:

--- Não tenho fome. – dizia Anita com a voz pesada e cheia de temor.

--- Mas a senhora necessita comer qualquer coisa, dona Anita. – recomendava a empregada doméstica da casa onde a mulher morava.

--- Não. Eu vou para o Hospital. Quando eu voltar sei que tem comida aqui. - respondia a mulher de qualquer forma.

E nessa desventura da vida, Anita Colares se levantou da poltrona onde estava sentada e caminhou até a sala do médico. Em lá chegando, ficou em pé na frente do especialista. Quando o homem a falou não sobe nem articular uma palavra.

--- Bem, dona. ... Anita. – consultou o prontuário de Dumaresq para não confundir o nome.

--- Seu marido recobrou os sentidos. – falou o médico a Anita. Era o momento que jamais a mulher esperava ouvir. Ao dizer tal afirmação, Anita desmaiou, quase caindo ao chão, no fora a rapidez de um enfermeiro que estava ao lado em acudir a mulher.

--- Peça o maqueiro. Depressa! – disse o medico alarmado com tamanha sensibilidade da mulher. Ele não esperava que a notícia fosse o choque para Anita Colares.

Dois maqueiros que estavam a postos na porta do consultório vieram imediatamente para acudir à paciente e colocar em uma mesa hospitalar que sempre havia no consultório. Os maqueiros fizeram friquição no pulso de Anita enquanto o médico procurava ouvir as suas pulsações e o coração. Alarmado com o desmaio de Anita, o médico procurou passar nas suas narinas um liquido muito forte para fazê-la despertar.

Após alguns minutos, a mulher tinha recobrado os sentidos, apesar de estar um tanto chorosa ao dizer que o doutor a desculpasse pelo vexame sofrido. O médico respondeu que ela sossegasse e chamou uma psicóloga para cuidar a mulher. Foi um caso surpreendente. Uma pessoa desmaiar ao ter boa notícia. Ao cabo de meia hora o médico voltou ao consultório de onde tinha saído. Acompanhado de outro médico ele perguntou a Anita se a mulher estava passando bem. A mulher respondeu que sim. Então, o médico informou de modo calmo que o paciente Dumaresq despertou e estava nesse momento sendo cuidado por uma equipe de especialistas. Na verdade, não se tratava de moléstia perigosa, como ele afirmara ter suspeita de uma febre da mosca do sono. Desse momento em diante, Dumaresq passaria um período no hospital até que os exames que eram feitos chegassem a alguma conclusão. A mulher caiu em pratos e procurou rezar pedindo a Deus que curasse o paciente Dumaresq. Com nenhum familiar estava presente com Anita Colares, a notícia não teve meios de se propagar para outras localidades de imediato. A mulher procurou saber se era possível ver o seu marido. O médico pediu apenas que esperasse um pouco.

Uma copeira trouxe leite quente, café, bolachas, sucos de frutas para dar a dona Anita Colares. Essa, mais animada, tomou uma xícara de leite, comeu umas três bolachas e bebeu um pouco de café. Sentindo-se reconfortada Anita declarou que Deus era bom até demais. A copeira sorriu. A mulher desceu da cama onde estava e caminhou para a varanda onde havia o plantio de mudas de várias espécies. Anita olhou aquele ambiente, mas não vislumbrara nada do que havia se plantado. Ela apenas queria ver o seu marido e saber quando ele poderia sair da UTI. Ao longo da manhã era só espera. O homem estaria lúcido para qualquer assunto, era o que perguntava a mulher a um enfermeiro. E recebia a noticia de que estava muito bem, com certeza. Então, Anita resolveu discar para Do Carmo dando ciente das novidades. E fez.

Ao meio dia, chegaram à sala de recepção dona Do Carmo, a doméstica Catarina e o seu filho Honório, todos loucos para saber das novidades. Anita estava sentada em uma cadeira e logo se levantou para receber as visitas. Chorando bastante, ela apenas disse:

--- Deus é bom. – e voltou a chorar.

Honório saiu de corredor a fora à procura de um médico para ter as novas informações. O homem Dumaresq recobrou de pleno os sentidos e seria transferido para um quarto de primeira categoria dentro de mais algumas horas.

--- E o negócio da mosca? – perguntou Honório preocupado.

--- Era somente uma hipótese. Porém os exames deram negativo. Tudo bem, agora. Dumaresq fica por mais alguns dias em observação e depois pode sair para a sua casa. Mas, lembre-se: Nada de esforço físico. Essa é a recomendação que se prescreve. – lembrou o médico.

--- É danado! Passar dois dias dormindo? – relutou Honório ao médico.

--- Não foram exatamente dois dias. Foi um apenas. Ele esteve sedado enquanto na UTI. Mesmo assim, se resolveu tirar o medicamento na noite passada e ver o que sucedia. Agora, está tudo bem. Avante, rapaz! – sorriu o médico batendo nas costas de Honório.

--- Mesmo assim. – destacou o rapaz de forma calma.

--- Olhe bem. O sono é benéfico para o coração. A falta de sono é um fator de risco para uma série de problemas de saúde. Ao longo do tempo tem se estudado o fenômeno, como a calcificação das artérias coronárias. Ele é uma pessoa que já sofre de problemas coronários. Não é raro que se tenha um pouco de sono a mais para recuperar as perdas das coronárias. – sorriu o médico.

--- Menos mal. Vamos então dormir. – sorriu Honório.

 



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