domingo, 13 de junho de 2010

LUZ DO SOL - 02

- SEDUÇÃO -
Nicodemos morava no alto da serra plantando e colhendo o que a terra lhe dava. Vivia só em um casebre de barro batido, sem reboco em algumas partes e sem pintura em parte alguma. No quintal viviam as suas criações, como cabras, bodes, ovelhas, carneiros, galinhas e galos. Além de tudo isso, também habitava o quintal da casa um cavalo chucro sem lógica e sem vaticínios, seguindo em frente quando se quer ir para a direita ou empaca num marasmo irritante. Além do cavalo havia também um boi que servia também para capinar o mato onde Nicodemos costumava a plantar coisas que ele consumia e vendia na feira livre da cidadela todos os sábados quer chovesse ou fizesse sol. Ninguém passava por perto do cercado de Nicodemos por causa da falta de asseio do homem. Ele vestia uma calça folgada apertada na cintura por um cordão de embira, cujas pontas ele dava um nó e uma camisa aberta sem botão e quase sempre rasgada. Nicodemos não tinha pai, mãe e nem sequer irmãos. Sua mãe faleceu quando ele nasceu. Seu pai viveu mais alguns anos morrendo de febre tifo na mesma casa onde ele morava. A sua casa ficava isolada completamente das outras, com uma distância enorme que dava para notar. O seu terreno era amplo, herança de seu avô. Quando era estio lá estava Nicodemos a plantar batatas, jerimum, mandioca e tantas outras coisas que lhe aprouvesse. O homem nunca teve mulher e o seu pai ficara só depois da morte da mulher, a cuidar do filho. Quando seu pai morreu, Nicodemos tinha seus 13 anos de idade. Ele mesmo enterrou seu pai no quintal de sua casa como seguiam os mais velhos. Branco de cor, mas por conta do sol, sua pele era enrustida. Alto e forte, de mãos calejadas por força da enxada, do machado e da enjó, assim era aquele homem. A água que apanhava vinha de um cacimbão que o seu avô fizera há muitos anos. Ele buscava em um pote e deixava na cozinha onde as paredes pareciam cair aos pedaços. O quarto de dormir tinha uma cama, um camiseiro e uma banca onde ele acendia todas as noites seu candeeiro. A sala era como as demais divisões da casa, feita de barro batido. Uma mesa de quatro pernas e dois tamboretes de três pernas nem tão seguros assim. Quando chovia, no tempo do inverno, caía mais água dentro da casa que do lado de fora. Ele olhava o telhado e contava os buracos. Logo depois seguia para a sala e de lá olhando do alto notava se a chuva ia passar. Quando então a chuva amainava Nicodemos puxava o seu boi “Manso” e voltaria a plantar e colher. O seu cavalo chucro sempre estava no celeiro. Era besteira chamar pelo seu nome “Cardume”, pois o chucro não estava nem aí. Ele ficava dias e noites naquele celeiro, às vezes em pé, outras vezes deitado se espojando no resto de estrume que ele mesmo plantava. Assim vivia Nicodemos ao lado do seu cavalo e do seu boi além de tantas criações. Quando era sábado, ele estava logo cedo da cidade. Vendendo e comprando o que dava para comprar. A feira era armada no centro da cidade onde havia residências de morada de outros fazendeiros ou mesmo de gente simples do lugar. Ninguém notava a presença de Nicodemos e ele não dava atenção a ninguém.
Foi assim que, certa vez, uma moça que ele nunca vira estava na janela de uma casa grande existente onde se armava a feira. Ele notou a presença da moça e ficou a olhá-la por um bom pedaço de tempo. No sábado seguinte ele estava logo cedo da feira fazendo seus negócios e olhando para a casa da jovem moça para tentar olhar por uns instantes aquela donzela. Porém, a moça não aparecia na janela e ele ficou deveras aborrecido com sua decepção em não vera donzela. Passadas as horas, Nicodemos viu surgir do lado de dentro da sala a donzela que ele tanto ansiava. Dessa vez, a moça passou de um lado para outro da janela e desapareceu. Ele ficou horas e horas esperando ver a donzela porque os seus sentidos eram tão poucos para perguntar o seu nome ou coisa assim tão trivial. Então, depois de muitas horas ele voltou para a sua fazenda. E trabalhou, trabalhou e trabalhou a semana inteira para ver se os dias passavam mais rápidos para ele chegasse a ver a sua meiga donzela. Por fim chegou o sábado e lá foi ele com seu burro chucro, andando e parando, seguindo para a direita quando devia seguir em frente por seu irritante marasmo. Mesmo assim, Nicodemos teve a divina paciência de esperar o destino que o burro faria. Ao chegar à feira do centro da cidade, a janela onde a moça morava ainda estava fechada. E assim ficou por várias horas. Foi então que ele ouviu alguém falar de uma donzela que morrera naquela semana e morava na casa que estava fechada. Nicodemos procurar ouvir melhor e as pessoas lamentavam o fim da donzela da casa grande. Era tão meiga a moça que não parecia sofrer de nenhuma doença. Mesmo assim, era sabido que ela morrera de uma enfermidade do pulmão. A moça chegara naquela casa grande ha cerca de um mês para se tratar da fraqueza do pulmão. Não agüentou muito tempo e, por fim veio a falecer da quarta-feira para a tranqüilidade dos seus familiares. Ele ouviu tudo isso, muito embora não tenha sabido do seu verdadeiro nome. E também não perguntou a ninguém apenas seguiu em se cavalo chucro estrada a fora com a cabeça abaixada como que se estivesse a chorar pelo sentido ingrato que a vida lhe armara. E assim, seguiu ele em frente quando sem que nem porque viu a jovem donzela a caminhar na sua frente, sozinha que lhe assustou. Com certo receio de falar com a donzela acompanhou apenas o seu trajeto pela estrada. Por fim, depois de longo e esquisito tempo sentindo um pouco mais de coragem, não suportando por mais nenhum pouco a sua aflição dilacerante, Nicodemos resolveu a indagar da bela moça donzela:
--- Você não é a moça que morreu? – perguntou Nicodemos aflito.
A moça então sorriu com suavidade para depois responder.
--- Não. Ela era a minha irmã gêmea. – respondeu a jovem.

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