domingo, 6 de dezembro de 2009

RIBEIRA - 399

- VARSÓVIA -
Quando, em uma tarde fria de outono de 1937, o engenheiro em armamentos alemão, marido traidor e espião Edvard Uhl chegou a Varsóvia para um encontro regado a champanhe e espionagem com uma encantadora condessa polonesa, a capital cintilante mas condenada estava desfrutando de um momento final de paz. "Acima da cidade, o ceu estava em guerra", escreve o romancista Alan Furst na abertura de "Os Espiões de Varsóvia", o mais recente de seus dez romances de espionagem, tensos e ricos em atmosfera, que se passam na Segunda Guerra Mundial. Por ora, é apenas uma tempestade em formação: duas frentes agourentas, uma vindo da Alemanha, a outra se estendendo por todo o leste até a Russia, estão prestes a colidir sobre a capital polonesa. Mas a atmosfera carregada, que logo trará o Armageddon a Varsóvia, apenas serve para aumentar a excitação do obstinado Uhl e da condessa, ela também uma espiã e, como Uhl, uma personagem menor chave, retratada ricamente, que ajuda a mover a ação. Os dois primeiro se conhecem em um pequeno restaurante alemão e, após manobras hábeis por parte da condessa, eles se veem em Varsóvia, no elegante salão de jantar do Hotel Europejski duas semanas depois, onde bebem champanhe e comem lagosta. E então, "após o bolo de creme" escreve Furst, "eles sobem". O autor deixa o que se segue para a imaginação habilmente provocada do leitor. Mas o cenário para as intrigas de seus espiões - os bulevares arborizados, grandes salões de baile, cafés românticos, bares animados e ruas sinistras de uma cidade à beira da catástrofe - é descritp de forma vívida. Ele também fornece uma ajuda visual magnífica no início do livro: um mapa de Varsóvia antes da destruição. Onde a ficção se mistura com a história, o mapa sobrepõe uma à outra, para que os visitantes modernos possam seguir os passos dos personagens de Furst pelas ruas de Varsóvia. "Ha algo na cidade e na Polônia que considero magnético", disse Furst. "Apesar de Varsóvia ter sido completamente destruída na Segunda Guerra Mundial, seu passado ainda está vivo. Ele está lá...é possível sentí-lo quando se está na Cidade Velha e olhando para o Vístula, vendo o rio cortando cidade. É como olhar para a história". Muitas cidades européias sofreram com as conflagrações e misérias causadas por Adolf Hitler há 70 verões, mas nenhuma mais que Varsóvia - a primeira cidade que ele bombardeou e a última que ele destruiu. Uma bela cidade no coração de uma planície frutífera, ela não tinha cadeias de montanhas ou oceanos para conter os ataques. Com apenas duas estradas lamacentas como "barreira sazonal contra a expansão alemã", como escreve Furst, Varsóvia foi um primeiro alvo fácil para a blitzkrieg nazista não provocada que deu início à Segunda Guerra Mundial, em 1º de setembro de 1939. Cinco anos depois, em um último ato épico de ódio, um Hitler derrotado ordenou a destruição sistemática de Varsóvia. A cidade foi incendiada, bombardeada e dinamitada até virar escombros. Foi a brutalidade final de Hitler contra uma cidade já condenada como área de execução de um genocídio. Seis milhões de poloneses foram assassinados e seus fantasmas estão por toda parte; Hitler fez de todas as ruas a sepultura dos seus moradores. Determinados a retirar sua capital do domínio da morte, os poloneses reconstruiram a cidade tijolo por tijolo - uma tarefa nada fácil, já que a grande parte de Varsóvia foi pulverizada. Usando de tudo, de pinturas a óleo a cartões postais, fotos de jornal e velhos albuns de família, os arquitetos e engenheiros reconstruiram meticulosamente a Praça do Mercado medieval da Cidade Velha e a adjacente Cidade Nova do século 15, do zero. Virtualmente tudo o que um visitante vê lá hoje é uma recriação, assim como a maioria dos palácios, catedrais e mercados da cidade. Mesmo assim, a velha Varsóvia se foi para sempre.
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