quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

RIBEIRA - 201

DEUS E O DIABO
Glauber de Andrade Rocha, cineasta brasileiro, ator e escritor. Nasceu em Vitória da Conquista, Bahia, a 14 de março de 1939. Filho de Adamastor Bráulio Silva Rocha e de Lúcia Mendes de Andrade Rocha, Glauber foi criado na religião da mãe, que era convertida ao presbiterianismo por ação de missionários americanos da Missão Brasil Central. Alfabetizado pela mãe, estudou no Colégio do Padre Palmeiras, então o principal núcleo cultural do interior do Estado. Em 1947 mudou-se com a família para Salvador, onde seguiu os estudosno Colégio 2 de Julho, dirigido pela Missão Presbiteriana, ainda hoje uma das principais escolas da cidade.Alí, escrevendo e atuando numa peça, seu talento e vocação foram revelados para as artes performativas. Participou em programas de rádio, grupos de teatro e cinema amadores, e até do movimento estudantil, curiosamente ligado ao Integralismo, uma corrente política tradicionalista, inspirada na Doutrina Social da Igreja Católica, que surgiu em Portugal no inicio do século XX.
Começou a realizar filmagens (O PÁTIO, de 1959, o primeiro curta-metragem da Bahia), ao mesmo tempo em que ingressou na Faculdade de Direito da Bahia, que logo abandonou para iniciar uma breve carreira jornalística, em que o foco era sempre sua paixão pelo cinema. Da Faculdade foi o seu namoro e casamento com uma colega, Helena Inez, também atriz, com quem teve uma filha, a igualmente atriz Paloma Rocha. Sempre controvertido, escreveu e pensou cinema. Queria uma arte engajada ao pensamento e pregava uma nova estética, uma revisão crítica da realidade. Era visto pela Ditadura Militar que se instalou no país, em 1964, como um elemento subversivo.
Antes de estrear na realização de um longa-metragem (Barravento - 1962), Glauber Rocha realizou vários curtas-metragens, ao mesmo tempo que se dedicava ao cineclubismo e fundava uma produtora cinematográfica. Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), Terra em Transe (1967) e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro (1969) são três paradigmáticos, nos quais uma crítica social feroz se alia a uma forma de filmar que pretendia cortar radicalmente com o estilo importado do Estados Unidos. Essa pretenção era compartilhada pelos outros cineastas do Cinema Novo, corrente artística liderada inegavelmente por Glauber. Ele foi um cineasta incompreendido no seu tempo, além de ter sido patrulhado tanto pela direita como pela esquerda brasileira. Glauber tinha uma visão apocalíptica de um mundo em constante decadencia e toda sua obra denotava esse seu temor. Com Barravento, ele foi premiado no Festival Internacional de Cinema da Tchecoslováquia em 1963. Um ano depois, com Deus e o Diabo na Terra do Sol, ele conquistou o Grande Prêmio do Festival de Cinema Livre da Itália e o Prêmio da Crítica no Festival Internacional de Cinema de Acapulco. Foi com Terra em Transe que tornou-se conhecido, conquistando o Prêmio da Crítica do Festival de Cannes, o Prêmio Luis Bunuel na Espanha e o Golfinho de Ouro de melhor filme do ano, no Rio de Janeiro. Outro filme premiado de Glauber foi O Dragão da Maldade, prêmio de melhor direção no Festival de Cannes e, outra vez, o Prêmio Luiz Bunuel,na Espanha.
Em 1971, com a radicalização do regime, Glauber partiu para o exilio, de nunca retornou totalmente. Em 1977, viveu seu maior trauma: a morte da irmã, a atriz Anecy Rocha, que, aos 34 anos, caiu em um fosso de elevador. Antes, outra irmã dele morreu, aos 11 anos, de leucemia. Glauber faleceu no Rio de Janeiro, Rj, a 22 de agosto de 1981, vítima de septicemia, ou como foi declarado no atestado de óbito, de choque bacteriano, provocado por broncopneumonia que o atacava ha mais de um mês, na Clínica Bambina do Rio de Janeiro, depois de ter sido transferido de um hospital de Lisboa, capital de Portugal, onde permaneceu 18 dias internado. Residia há meses em Sintra, cidade de veraneio portuguesa, e se preparava para fazer um filme, quando começou a passar mal.
Sem dúvidas, o marco de sua carreira no cinema foi logo no inicio com "Deus e o Diabo". Alí estava o marco do cinema novo, se é que assim se pode chamar o cinema de Glauber Rocha. Contudo, nesse filme ele projeta a figura de um cangaceiro conhecido como Corisco. Esse era o apelido de Cristino Gomes da Silva Cleto que viveu entre 1907, em Alagoas, e morreu no dia 25 de maio de 1940, na Bahia. Foi casado com Sergia Ribeiro da Silva, apelidada de "Dadá". Corisco era também conhecido como Diabo Louro. No ano de 1926, ele tomou a decisão de aliar-se ao bando do cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva, apelidado Lampião. Corisco era conhecido por sua beleza, seu porte físico atletico e cabelos longos deixavam-o com uma aparencia agradavel, além a força física muito grande. Por estes motivos foi apelidado de Diabo Louro quando entrou no bando de Lampião. Corisco sequestrou Sérgia Ribeira da Silva, natural de Belem, Pará e foi a única mulher a pegar em armas no bando de Lampião. Dadá estava com apenas 13 anos, ao ser sequestrada por Corisco. O homem usou da força bruta para que com ele a moça permanecesse e, mais tarde, o ódio passou a ser um grande afeto de Dadá. Corisco ensinou Dadá a ler, escrever e usar armas. Corisco permaneceu com ela até o dia de sua morte. Os dois tiveram sete filhos, mas apenas três sobreviveram.
Em 1940 o governo Vargas promulgou uma lei concedendo anistia aos cangaceiros quese rendessem. Corisco e sua mulher, Dadá, decidiram se entregar mas, antes que isso acontecesse, foram baleados. Dadá precisou amputar a perna direita e Corisco veio a falecer naquele mesmo ano. Com as mortes de Lampião e Corisco, o cangaço nordestino se extinguiu. Corisco foi enterrado em Jeremoabo, na Bahia. Depois de alguns dias sua sepultura foi violada, e seu corpo exumado.. Seus restos mortais ficaram expostos durante 30 anos no museu Nina Rodrigues ao lado das cabeças de Lampião e Maria Bonita. A vitalidade, energia e violência de Corisco fascinou Glauber Rocha e inspirou o seu filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol". Corisco foi interpretado por Othon Bastos.

Nenhum comentário: