sábado, 27 de junho de 2009

RIBEIRA - 317

RIBEIRA
Eu, aqui aprendi a trabalhar - se é que eu sei, na verdade. Aqui, se pode notar a Avenida Tavares de Lyra, na Ribeira, em Natal, Rn. Claro que a artéria não é mais assim. Algo mudou. As calçadas são mais altas - e destruidas -, os predios estão ao abandono e bonde não tem mais. Quem vê a foto - esta que está exposta - por certo verá uma rua, quase no inicio - da foto. Essa rua é a Chile. Antes, era rua do Comércio, pois ali havia toda sorte de comércio da qual a cidade precisava.Do lado direito de quem olha, tem um negócio feio em cima de uma casa. Aquilo era a estação de telefones. Mais pra cá eram casas de comércio e de uma agência - a Agencia Pernambucana -que vendia jornais do sul do pais, revistas, livros e mantinha um serviço e altofalantes para divulgar mensagens de seus patrocinadores, musicas, serestas, carnaval e também o boletim da BBC de Londres com notícias da Segunda Guerra. A Agencia pertencia a Luis Romão que morava da rua Sul, onde tem, hoje em dia, a Caern - Companhia de Águas da capital que o governo já quer privatizar.
Na rua Tavares de Lyra, do lado direito de quem olha - a foto - além das casas comerciais, tinha também o escritóriode representação. Bem perto da Agencia Pernambucana. Naquele escritório trabalhava um rapaz por nome de Afrânio. O escritório pertencia a seu pai. Quando eu conheci Afranio, ele, ainda, não trabalhava lá. Eu comecei a trabalhar em um outro escritório de José Leandro que ficava na rua Dr. Barata, 210, no alto do Jornal A ORDEM. Quando eu passava pela av. Tavares de Lyra, visitava o meu amigo Afranio. Conversa vai, conversa vem e eu partia para outras paragens do meu destino. Ás vezes, eu encontrava Afranio na Agencia Pernambucana vasculhando as revistas que haviam chegado. E. alí, nós teciamos longos "papos" - conversas -até o tempo de nós nos despedirmos. Meu destino era o Correio para ver as correspondencias que haviam chegado para o meu tio - José Leandro - ou para ir ao Banco, fazer compras e coisas mais. E foi assim, nos anos de 1952 até 1956, quando meu tio abriu um armazem de madeiras na avenida Rio Branco, 241, por tras do teatro Alberto Maranhão. - Não sei porque trocaram o nome da casa de espetaculos, pois, quando cheguei ao armazem, ainda era chamado de Teatro Carlos Gomes. Mas, deixa pra lá.
Do armazem eu ainda tinha contato com Afranio, quando tinha que ir fazer mandados. Ele ainda estava no mesmo prédio do escritório do seu pai. Um dia, muito tempo depois, por volta de 1959, Afranio me chamou - quando eu passava em frente ao prédio - e me disse:
--- Sabe quem morreu? - falou o rapaz.
E eu respondí.
--- Não!!
--- Deca!
Aquela noticia me gelou o corpo. Deca era Francisco Canindé que nós o conheciamos muito bem. Tempos passados, eu fui, muitas vezes, com Deca na casa de Afrânio que morava em um sobrado na rua Prudente de Morais, perto da praça Pedro Velho, em Petrópolis, bairro de Natal. Afrânio disse ainda que ele estava internado, pois piorara da doença que o acometera, tendo ataques epilépticos constantes. E em um desses ataques, ele não resistiu. Então, morreu.
Eu fiquei abismado com a notícia. Deca, nunca mais eu vira. Fazia tempo que eu acompanhado com Deca - ele era cego - ia até a casa de Afrânio para jogar conversa fora. Agora, a noticia de sua morte. Eu fiquei a pensar nos tempos que tinha ído com Deca até as Rocas - bairro de Natal - para sessões "espiritas" na casa de "Taperuá', um homem que fazia sessões espíritas naquele bairro, às terças-feiras. E de outras vezes que eu ia ao Centro Espirita da rua Camboim, onde comparecia muita gente às quartas-feiras. Nesse tempo, Deca já sofria ataques epilepticos mais de uma vez por dia. Uma senhora aconselhou à sua mãe, Cecí, mandar o rapaz ao Centro Espírita pois acreditava que aquilo fosse um "encosto". Dona Ceci deu fé no que a mulher dissera e me pediu que acompanhasse Deca até aos Centros que ela conhecia. Nós - eu e Deca - batemos essa cidade por város cantos, como Tirol, Cidade, Alecrim, Rocas e onde tivesse um Centro. Sempre iamos a pé, pois temiamos bondes, pois um ataque em um bonde era por muito dificil da acudi-lo. Agora - naquela hora - me veio a noticia de que Deca falecera. Eu não sei de chorei para desabafar ou o que fiz. Só sei que, de Deca nunca esqueci. Mesmo estando morto, eu não o esquecia.
Ainda hoje, ataques epilépticos são tratados e tem medicamentos para tal mal. Naquele tempo, eu não sei se havia tratamento. Eu conheci Deca quando ele já era adulto, coisa de 18 anos. Soube, por dona Cecí, que o primeiro ataque que o acometera, ele estava a bordo de um navio, em companhia de sua mãe, rumo Natal-Rio. Deca era pequeno, coisa de três anos - ou menos - de idade. Foi assistido pelo médico de bordo e dona Cecí - Cecília era o seu nome - foi aconselhada a procurar um especialista quando chegasse ao seu destino. Por conta desse ataque - penso eu - ele ficou com um braço - o direito - defeituoso que cuidava do o manter sempre erguido, por volta aa cintura, um pouco encolhido.. Quando eu conheci Deca , ele já estava cego, pois essa deficiencia visual acolheu quando ele estava com os seus 16 anos. É tanto, que o rapaz nunca queria que o tratasse como se ele fosso um "cego" e sempre me pedia para que, quando saísse com ele, o deixa-se amparado no meu ombro e de uma forma que ninguém soubesse que ele era um deficiente visual. E foi assim que nós faziamos as nossas caminhadas pelos bairros dessa Natal escura, pois à noite, para Francisco Canindé era mais facil de andar, uma vez que havia pouca gente na rua. Aquele fato, Afranio não sabia. Apenas notava que Deca era um deficiente visual.

Nenhum comentário: