terça-feira, 9 de junho de 2009

RIBEIRA - 298

AVENIDA RIO BRANCO
Quem vê, nos dias atuais aspectos da avenida Rio Branco, em Natal, Rn, nem imagina que aquela artéria tem uma história que remonta o tempo antigo da cidade, quando nem era chamada de avenida Rio Branco e o seu tamanho terminada no cruzamento com a rua Jovino Barreto que nem exista naquele local onde está, sendo uma cerca de pau e quem seguisse por ali, teria que dobrar à esquerda ou à direita para pegar o seu rumo.
Na Avenida Rio Branco daquela época posterior, mostrada na foto, tem algo singular para quem olhar. Ali, já no cantinho abaixo, perto de um cercado onde esteve o Quartel do Exercito, o retrato do Mercado Público da Cidade, uma bela estrutura por assim dizer, com portôes de ferro que abriam para cima, feitos pelo ferreiro e professor do Liceu Industrial, mais tarde chamada de Escola Industrial, sr. Luís de França. Naquele mercado se encontrava de quase tudo que havia na época; do café com cuscuz, bolo de fubá e tapioca, até mesmo aos sapatos e tecidos para as pessoas menos dotadas de poder aquisitivo. O Mercado da Cidade, como era chamado, vinha de tempos mais remotos, no século 19. Era um verdadeiro quarteirão o canto ocupado pelo local público e, em tempos remotos, à tarde, quando o movimento era menor, as verdadeiras ruas que separavam as lojas existentes no seu interior, era um divino prazer para se passear sem nada falar ou dizer. As bancas de carne verde (carne de gado morto na hora) se abasteciam de lotes para serem vendidas no dia seguinte aos seus consumidores.
Do lado de fora do Mercado, pelo lado direito de quem olhava da Avenida Rio Branco, podia-se ver os carros, caminhões que traziam frutas e verduras para os comerciantes da época instalados no interior do velho Mercado. No chão da rua se podia notar os montes de palhas de bananeiras ressecadas pelo tempo misturadas às cargas de magas, laranjas, limas, melancias, melôes e até mesmo bananas que efeitavam o ar impuro do local com seus perfumosos encantos de frutas maduras.
Do lado da frente, os quitandeiros arrumavam seus locais de vendas, com frutas, verduras e mesmo negócios bem diferentes, como fumo e tabaco, para os seus consumidores habituais.
O Mercado da Cidade era um ponto de comércio de repleta atividade, onde balaeiros buscavam caminho por entre o povo repleto que se espremia na passagem daqueles homens robustos. As crianças amedrontadas por diverso alvorosso se encolhiam por entre as pernas de suas mães, temendo serem agarradas pelos homens sujos, com um pano na cabeça e outros, com um saco de farinha que lhe protegiam no descarrego das camadas de carne verde suspensas em ganchos para depois arriar os colchões das pernas das vacas, ficando alí, em repouso, até o dia seguinte.
Medo fazia à criançada, as cabeças de bode, sem pele, cor vermelha, olhos esbugalhados, olhando para o sem fim, que os homens traziam também e depositavam nas pedras de lousa e alí ficavam a espera de quem as comprasse. Eram cabeças de bodes, cabras ou carneiros, com os dentes serrados como que sorrindo para as crianças, ameaçando-lhes pegar de jeito, a qualquer instante para o seu festím diabólico que se arrumavam durante as madrugadas escuras nos quintais das suas casas, entre rezas, fumaças e fogueiras, tendo a presença dos homens encapuzados com suas cabeças cobertas por um pano melado de sangue. Ah! Isso fazia muito medo! E como fazia!
O Mercado era assim. De manhã, cedinho, coisa de cinco horas, o dia bem não despontava, as mulheres dos quiosques já preparavam o café para atender aos seus frequeses. E como já enfatizei: café, bolo de milho, tapioca, cuscuz e pão. E o consumidor, se quisesse mais, até que tinha. Os bules com seus gargalos estreitos, eram cobertos por uma almofada que não os deixavam esfriar por um longo tempo, serviam aos consumidores as xicaras que eles ingeriam. O café era de graça. O fregues pagava somente o que consumia por fora, como pães, tapiocas e coisas mais.
Os locais, ainda cedo, estavam fechados, somente postos a funcionar para a venda de seus artigos, como sapatos e tecidos, por volta das sete horas do dia. Antes disso, só quem vendia as verduras, legumes e mesmo os quiosques de venda de objetos velhos.
Em sua cobertura, podia-se notar que o prédio tinha cinco revestimentos, se estendendo de leste a oeste. Assim, os seus ocupantes ficavam tranquilos com a sua segurança. Na parte leste, tinham lojas de comércio de produtos variados, como faijão, farinha, açucar, arroz e tudo o que se consumia de forma enlatada, como o leite, por exemplo. Logo atrás, mais chegando ao fim do prédio, havia as bancas de peixes, dos grandes aos pequenos, ostras, camarões e até mesmo lagostas. Alí, o cheiro era quase insuportavel, pois se confundia com o arroma fétido que brotava dos miquitórios que ficavam logo a baixo. Quem quisesse sair pelas portas dos fundos, encontraria rumas de estercos humanos misturados com urina dos ébrios que frequentavam o local. Era assim o velho espaço de vendas da cidade. Na parte de trás, havia três escadarias para descer e subir, em dois vãos de ascessos, o que não acontecia com a parte da frente, que era plana como o chão. O terreno inda hoje tem seu declive como sempre foi. Mesmo assim, o Mercado da Cidade, destruido por um incêndio na década de 1960, era um belo local de se viver e ser feliz. Quando houve o incendio que destruiu todo o espaço, a Prefeitura de Natal prometeu construir novos espaços para abrigar os comerciantes. Assim, surgiu, entre outros, o Mercado de Petrópolis, que os locatarios nunca aceitaram, vez que era distante dos seus comercios e consumidores. Não foram poucos os que morreram ou ficaram inválidos por doenças mentais, ao perderem tudo o que tinha naquele pavoroso incendio que consumiu em pouco espaço de tempo os seus bens e negócios por fazer, visto de vários pontos da Capital. Era um sábado à noite quando tudo isso ocorreu. Enfim, uma coisa era certa: já não havia mais locais para se andar sozinho, olhando as coisas que nos entretiam deveras nas tardes sabatinas de alegres devaneios. O Mercado Público da Cidade tinha o seu fim desastroso imposto pelo fogo.

Um comentário:

Manoel de Oliveira Cavalcanti Neto. disse...

Alderico,

Lembrar do nosso passado é renascer, parbaéns pelo excelente texto.