quinta-feira, 8 de outubro de 2009

RIBEIRA - 431

- CANTO DO MANGUE -
Faz muito tempo que o Canto do Mangue existe. Cem certeza, uns 350 anos. Nesse local aportavam os barqueiros que chegavam a Natal. Gente simples como ainda hoje é assim. Com a "descoberta" de Natal, no ano de 1599, o Canto do Mangue já existia porque ali era um canto onde o rio Potengi banhava com suas águas quando a maré enchia ou secava. Por certo, há 410 anos alí não se chamava de Canto do Mangue, pois em Natal só havia os índios do lado de cá e do lado de lá do rio. Passou-se o tempo e veio a intenção de se construir um porto que acomodasse navios: o Cais do Porto. Então, por esses tempos, moradores de habitavam aquelas paragens, já estavam acostumados a sair de casa para pescar. A chegada de engenheiros para fazer o Porto, não lhes fazia diferença. Os pescadores continuavam a sair e a pescar em seus botes, sempre procurando o alto mar. Em 1950, eu já sabia haver ali um Canto de se introduzira Mangue. Talvez se chamasse assim porque o mangue margeiava aquele canto. Mangue é um tipo de árvore nativa em regiões costeiras tropicais. O mangue produz uma lama negra por conta de suas raízes que se fincam na areia. E no mangue habitam caranguejos e outros similares. Se bem me lembro havia muito mangue em todo aquele lugar onde, para se passar, tinha-se que se cruzar uma "ponte" feita com três ou quatro troncos de coqueiros, nas imediações de onde existe, hoje, os armazens de qualquer coisa, pois quando foram construidos eram para ser os armazens gerais. Os casebres dos pescadores já existiam onde hoje é ainda os mesmos casebres. Além dessas choupanas, havia também um tal Mercado do Peixe, no meio das cabanas, onde se podia comprava o peixe trazido de alto mar, frescos, pelo que se dizia, nos botes dos pescadores. Para se chegar ao Mercado, tinha que se ir, cruzando a cerca de arame feita pelas companhias de óleo e gasolina: Esso, Shell e coisa e tal. Eu me lembro que, nesse tempo, 1950, tinha muita confusão entre os pescadores, quando bêbados. Foi não foi, alguém saia ferido ou mesmo morto do aglomerado de casebres alí existentes. Dava medo aos desconhecidos parambular por aquele lugar. Contudo, era alí que existia o Mercado do Peixe que vendia o pescado a preço bem barato. Quem não quisesse se avendurar em ir ao Mercado, podia esperar a chegada do bote pesqueiro que atracava à beira do rio, onde as crianças subiam nas embarcações para pular para dentro do rio e as suas avós e mães vendiam o peixe frito, conhecido por ginga. Esses peixes, quem consumia, recebia uma tapióca que envolvia toda a ginga. Além disso, os frequentadores também tinha o direito de beber, principalmente a cachaça ou mesmo o vermute. Alí não havia muro. Eram as barracas e o rio, separando os dois, os botes de pesca. Durante muito tempo o comércio das mulheres e suas gingas foi feito desse jeito. O movimento maior era na parte da tarde, de 3 para as 4 horas, quando os barcos surrados pelo vento e pelo sol começavam a chegar de alto mar trazendo a sua alvissareira pescaria. Nesse botes, quase batendo ou mesmo margeando o oceano por seu peso de carga, vinha de tudo: peixes grandes e pequenos, camarões, arraias, enguias e até mesmo as lagostas, pois nada era proibido de se pescar. Os pescadores distribuiam com os seus filhos, netos, sobrinho e primos, as espécies mais baratas dos peixes. Certa vez, eu vi um cação, onde o pescador retirava-lhe das entranhas os seus membros genitais. Isso é costume ainda hoje. O cação de boca-da-barra é um tipo que é capaz de comer tudo o que se move por baixo dágua. Certa vez, eu ouvi conversa de pescador que pegara um cação cujo interior encontrava-se uma botina - calçado -com resquicio de sangue. De pescador tem muitas histórias, algumas verdadeiras. Quando um barco desaparecia no mar, havia prantos, pois se sabia que seus tripulantes teriam morrido, certamente. Havia caso em que muitos desses pecadores encalhavam numa praia distante e, após vários dias reapareciam para os seus familiares, vindos por transporte de terra - caminhões - ou outro barco pesqueiro que os traziam para a gloria dos que pranteavam e estavam sem esperança. Quantas Missas se rezavam em favor da alma de quem desaparecia no mar!. Essa era e é a vida dos pescadores do Canto do Mangue que vivem e viveram por longo tempo sem pensar que é "doce morrer no mar".
---
Veja também:

Nenhum comentário: