segunda-feira, 5 de abril de 2010

LUZ DO SOL - 76

- REJANE -
- CONTO -
No calor da manhã da segunda feira quando Rejane estava acordada, sentada no chão, pois a cama já não fazia mais efeito algum, ela se lembrou do seu verdadeiro amor que ela abandonara sem ter motivos. O violão emudeceu em um canto solitário do quarto de dormir como se ele fosse o culpado de tudo o que sucedeu. Havia apenas a janela por onde entrava o sol. A cortina da janela no seu jeito dormia preguiçosa e calada como se estivesse somente a espera de chorar. Com o seu meigo e lindo corpo, Rejane desistia de tudo o que lhe fazia feliz. Sempre aconteciam coisas dessa natureza. Brigas por tudo e por nada. Aquele era mais um dia. Lençol caído ao redor do seu corpo nu era tudo o que restava. Pensativa no que fizera, Rejane pouco imaginava de quem era a culpa, se houvesse culpa nas brigas de namorados. Ao acordar naquele dia ela somente lembrava o jeito em cuja forma seguiu o seu belo namorado na noite do dia anterior.
Na noite de domingo Rejane rompeu o laço que prendia ao jovem por causa alguma. Apenas uma brincadeira que ela se ressentia, foi tudo o praticara o jovem. Quando era o final do mês, a moça sentia dores cruéis por causa de sua menstruação. Aquele era o tempo que o melhor a ser feito era de não ver ninguém. Ela preferia ficar em seu quarto onde não podia nem assistir os programas de TV e ao menos ouvir o rádio. O barulho de carros na rua vindo subindo pelas paredes do edifício e entrando no seu quarto, era um temor a mais. Naqueles momentos de dor inquietante, Rejane apenas se lembrava do tempo do sitio onde não havia nada para incomodar. O sitio do seu avô era um local sossegado onde borboletas apareciam volitando ao sabor da brisa de todas as manhãs, meio-dia e tardes.
Nos dias de inverno, as borboletas não mais apareciam. E ela não sabia o porquê desse desaparecimento. Nesse tempo a menina não sabia de tudo o que mais tarde passaria a conhecer. Apenas as coisas triviais da fazenda onde brincava em comum com as suas duas irmãs mais velhas que ela. Vez por outra aparecia na fazenda do seu avô outra menina, sua prima, que vinha com seus pais. Os adultos ficavam entre os adultos. As meninas entre as meninas. Naquele tempo não havia dores atrozes. Certo dia, ela amanheceu coberta por sarampo. Então, foi obrigada a se deitar na cama existente no quarto de dormir da fazenda onde não tinha o direito sequer à luz do sol. Naquele quarto, ela tirou uma semana de solidão onde apenas a mucama aparecia para levar o seu leite, café, chá, torradas e, na hora do almoço, uma sopa feita com todo o cuidado.
Para Rejane, foi um sacrifício tremendo aqueles dias de sarampo. Quando não havia ninguém por perto, a menina olhava por uma fresta da janela as borboletas esvoaçando pelos roseirais. Quando alguém aparecia, ela voltava a deitar e ouvir a recomendação dada pela mucama.
--- Cuidado, viu? Se não vai virar sarapampão! HUM! – falava a mulher gorda e negra.
A menina olhava com o seu olhar apenas de menina e se cobria toda com um lençol por conta do tal “sarapampão” que ameaçava vir. Porém ninguém sabia dizer com precisão o que era a tal moléstia. Com a doença do sarampo Rejane já sofria demais, com as chagas por todo o corpo, até mesmo no céu da boca o que a impedia de comer qualquer coisa. Apenas soube como estava “feia” depois do oitavo dia quando pos a cabeça no lado de fora do seu quarto. Nesse dias as feridas estavam murchas e ela podia sair do quarto. Mas, nesse dia foi um verdadeiro horror. A sua irmão encostada, logo que viu a cara de Rejane, saiu aos gritos tremendo de medo dizendo que a menina estava toda ferida.
--- Mããããeeee! A cara dela estava toda feia! Mãããeee! – gritava a sua irmã encostada.
Por isso, Rejane não saiu do quarto, pois era uma menina feia. A mucama entrou nos aposentos e lhe fez carinho dizendo que tudo aquilo era normal. A menina precisava de um banho quente para despertar do mal que lhe acometera. Era o que dizia a mucama.
--- Vamos lá pra dentro que eu ponho uma bacia com água. – dizia a mulher gorda.
--- Vai doer? – perguntou Rejane.
--- Não. Eu paço bucha por onde não tem sarampo. – respondeu a mulher gorda.
E a menina chorou de medo. Como a mucama teria que acertar o local onde não houvesse chagas? Era isso que imaginava Rejane. Pois todo o corpo havia se enchido de sarampo, muito embora já estivesse secando. A menina seguiu a mucama, tremendo de medo e entrou no banheiro. Por lá já estava uma bacia cheia de água com umas folhas de eucalipto. A menina foi obrigada a se despir por completo, pois a mucama queria passar sabão em seu corpo inteiro, com muito cuidado para não chagar os sarampos que ainda mostravam vida. As suas irmãs estavam escondidas no quarto bem mais longe do que o de Rejane. Elas se abrigavam por completo temendo ver a sua irmã sair do banheiro.
--- Estou com medo, Nina! – dizia a encostada.
--- E eu. Não quero nem olhar. Dizem que cega!!! – falou a mais velha de todas.
Nesse desalinho todo, apenas a mucama e a mãe da menina podiam ver o estrago que fizera no corpo de Rejane o surto de sarampo. Eram muitas outras meninas e meninos da cercania da fazenda que estavam tendo a mesma doença.
--- Cuidado para não atacar as outras! – dizia a mucama a mãe de Rejane.
--- E o que se faz para evitar? – perguntava a mulher.
--- Não sei! É perguntar a seu Justino. Ele é enfermeiro. – respondeu a mucama.
No dia seguinte Justino apareceu na Fazenda, trazendo consigo uma maleta de injeção, agulhas, seringas, álcool e umas ampolas de vacina contra sarampo. Ao chegar, foi recebido pelo avô de Rejane que logo foi perguntando:
--- E esse negócio presta? – perguntou o avô de Rejane.
--- É o melhor que tem. Todo mundo está se vacinando por esses lados. – respondeu Justino acreditando na vacina.
--- Por que você não veio antes, homem? – inquiriu o velho.
--- Trabalho. Eu sou sozinho para atender a toda essa gente. – disse Justino.
--- Trabalho! Rum! – fez o velho com voz antipática e o cachimbo na boca sentado na cadeira de balanço e com um pé suspenso posto na cadeira.
As duas garotas foram logo vacinadas e, por precaução, a mãe de Rejane e também a mucama por ter estado cuidando da filha menor. O velho avô nem quis ver a vacina.
--- Homem! Já estou velho! E se morrer é de morte morrida! – comentou o velho avô
Aquele foi um tempo de velhas e diluídas histórias. Depois, chegou à menstruação na moça Rejane. E então, o namoro. Naquela segunda-feira, ela acordara em seu apartamento, na cidade, e se lembrara de todo aquele incidente. E do seu namorado também que no domingo Rejane mandou embora.

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