domingo, 12 de julho de 2009

RIBEIRA - 336

MARIA DE OLIVEIRA
- "MARIA BOA" -
Agora, falo de uma pessoa que nunca a conhecí e, se alguma vez, na rua eu a ví, digo que não sabia quem era ela. Porém, de saber o seu nome: Maria de Oliveira Barros, nascida no dia 24 de junho de 1920 - véspera de São João - e que faleceu no dia 22 de julho de 1997, na Casa de Saúde São Lucas, à uma hora da madrugada, vitimada por um AVC - Acidente Vascular Cerebral - mais conhecido com o nome de "trombose", entupimento da veia do cérebro - trombo. Esta senhora, quando murreu, com 77 anos, era conhecida no Brasil e no mundo como sendo "Maria Boa", dona de um lupanar de verdadeiro luxo e belas artes, cheio de enfeites, de coisas bizarras, luz-e-sombra por seus recantos e corredores, toalhas e água para atender aos clientes, além de bebidas de fino gosto.
Maria de Oliveira Barros chegou à Natal - Rn - trazida por Nezinho Fernandes, um farto negociante aqui estabelecido para ser doméstica em sua casa. Foi o próprio Nezinho com quem teve a primeira conjunção carnal e, para não alarmar a família, o homem a colocou em uma casa, dando-lhe roupas e comida, Maria de Oliveira tinha apenas 20 anos de idade. Ela nasceu em Campina Grande - Pb - e, em Natal, ficou para sempre. Os relatos não falam de sua família.
Depois de amante de Nezinho Fernandes, ela compreendeu o seu destino. Já era mulher-da-vida e, então passou a viver com outros homens, inclusive com o nobre Dr. Manoel Vilar, oftalmologista e renome e único da cidade do Natal. Daí em diante, sabendo bem pouco ler e escrever, valendo-se da sua juventude e beleza, com o gosto apurado pelo cinema, a música e mesmo a literatura, dona de uma inteligência farta, Maria Barros procurou estabelecer a sua sina, frequentando o Grande Hotel, modelo de requinte e luxo, único na cidade, uma vez que os demais hoteis então existentes não passavam de simples pensões.
Daí por diante, Maria Barros, chegando no auge da II Guerra Mundial, fez a vida de prostituta. Alguém lhe disse que ela era uma mulher decente, uma prostituta de linhagem. Era uma boa mulher. Para todos os efeitos, frequentando o salão do elegante e esnobe Grande Hotel, não tardou em ser chamada por "Maria Boa", não por atrevimento, porém por uma delicadeza, uma cortezia dos que "sairam" com ela. Maria Barros ouviu uma voz que lhe disse: "Você pode montar um cabaré na cidade". Nesse tempo, casas noturnas nãp havia por esses lados. Maria pensou e procurou uma casa retraída que lhe servisse de bordel. E, tão logo se instalou na cidade, buscando as moças do interior da Paraíba, Pernambuco, Piauí e mesmo Rio Grande do Norte, ela passou a divulgar entre os homens que preferiam o Grande Hotel, local de esmero e requinte, que já podiam procurar o cabaré de "Maria Boa", primeiro de Natal. E, desde esse afortunado período, durante a Guerra e depois dela, o randvous da cafetina mulher ganhou fama, vindo homens até mesmo do exterior, com França, Tchecolovaquia, Espanha e, por que não dizer, Estados Unidos e do próprio Brasil. Vinham eles conhecer os mistérios revelados à meia-luz entre gritos e sussurros pelas damas da noite, mulheres doutas em fazer o homem gemer.
Maria Boa se firmou na cidade e chegou a desfilar, durante o período do caranaval, em um carro conversível, por volta de 1950, na companhia de Antônio Farache, um graduado homem de negócio da capital, figura de tradicional família aqui residente - a família Farache que abriu a Rádio Poty de Natal e fundou o time do ABC F.C..
Maria Barros permitia aos taxistas estacionar no interior do seu bordel, onde o motorista levava para casa ou mesmo o Grande Hotel, em cliente depois de viver momentos de orgias. Pelo cabaré de Maria Boa passaram as mais formosas e encantadoras divas que já podia se ver por Natal. Eram todas escolhidas a dedo, por assim dizer. As damas da noite tinham residência para morar, fora do cabaré, bem perto de onde atuavam. Durante a II Guerra, os aviadores aquí sediados colocaram no bico de um B-25, o mais moderno avião em operação naquela época, o nome gravado de "Maria Boa". Ela não acreditou nessa façanha até que foi chamada para ver de perto o aparelho que trazia o seu nome. Um sargento da Força Aérea Americana tirou uma foto de Maria Boa, ela inteiramente nua. Esta foto, um tanto desbotada, se encontra na Base de Fortaleza, Ce, onde sempre no dia 22 de abril há uma ferrenha competição de aviadores e atletas disputando torneios que puseram o nome da bela e incandescente mulher: Maria Boa.
Maria de Oliveira Barros teve, pelo menos, um filho que durante muito tempo trabalhou em taxis, na capital. Estudantes dos diversos Cursos da Universidade Federal fizeram um trabalho, entrevistando a própria mulher, enfocando a época aurea de Maria Boa. Tais trabalhos acadêmicos fizeram daquela simples protituta um "Mito", pois abordaram o fenômeno da protituição até mesmo infanto/juvenil. Os estudos mostraram o desenvolvimento físico e psicossocial dos nossos jovens quando os bordeis funcionavam em Natal.
Pelos ídos anos de 1990, via-se Maria Barros caminhar de manhã cedinho do calçadão da praia do Meio, acompanhada de uma antiga amiga. Mulher de falar bem, como uma dama de escol, Maria Barros não revelava ser, nos fins de sua vida, a plena meretriz que, um dia chegou a ser. Reprimida pelas senhoras donas, ela não se importava com o que podiam pensar do seu comércio. pois frequentava a sua casa os homens mal-amados, distantes das suas esposas. Maria Barros contava com amigos e clientes. Era uma dura vida para a mulher. No fim, era ela uma respeitavel mulher sem nada a reclamar. Polítos, empresarios, estadistas eram os seus clientes. Sua morte, no dia 22 de julho de 1997, passou ignorado pela sociedade, onde as donas de casa mostraram um alívio com o fim de "Maria Boa", a mulher fatal.

3 comentários:

Manoel de Oliveira Cavalcanti Neto. disse...

Embora com um certo atraso, quero parabenizá-lo por essa postagem que ajuda a resgatar a grande figura que foi Maria de Oliveira Barros - Maria Boa. "la Belle de la Nuit"
Abraços

Rodrigo Cajueiro disse...

Obrigado!

Graças a vc, conheci um pouco mais da história de minha tia avó, sobre quem quase nada sabe minha geração. Além de crescermos distante (RJ), pouco ou nada ouvimos falar sobre ela, uma vez que, seus irmãos, nossos avós, sempre trataram este assunto como tabu, ainda que seus filhos, nossos pais, carreguem consigo boas lembranças das visitas dessa tia de Natal, sempre marcadas por generosos presentes.

Abraços

Emanoel Barreto disse...

Alderico, você teria como colocar-me em contato com Rodrigo Cajueiro?

Grato,
Emanoel Barreto
e.barreto@ufrnet.br