A vila de Ponta Negra, em Natal (Rn) é o ponto principal onde se pode encontrar as rendas, labirintos e bicos, feitos à mão, em um ensino de mãe para filha. Quando eu era menino, costumava ir na casa de Mercês, uma das mulheres que faziam seus ricos trabalhos que a mulher vendia apreço módico para quem a procurasse. Para mim, era um deleite ver aquele jogo de linhas e bilros se cruzando com uma eterna rapidez, nos seus trec-trec constantes, cobrindo um desenho feito em um papel ou memo cartão, cruzando para um lado e para o outro, como se nunca acabasse de tricotar em uma almofada recheiada de algodão de pluma ou de retalhos de tecidos. Com um cachimbo na boca, quase sempre apagado, aquela nobre senhora não prestava atenção a ninguém, muito emborar o seu olhar ladino sempre estivesse pronto para chamar uma das meninas (mocinhas) para fazer alguma atividade. Na casa de Mercês - e ela nem fazia questão que lhe chamassem desse modo. Era bem melhor do que "dona" - outras mulheres e mocinhas ajudavam no trabalho de cada uma. Às vezes, uma conversa saltava e alguém na roda da sala respondia desatenta: "pois é", "não vi mais, também" ou mesmo "onde ela anda?". Eu nada dizia, mesmo quando Mercês reclamava: "Senta, menino. Agora, fica em pé! Tu morre!". Eu me aquietava, como o pé formando um quatro. um lenço atolado na boca para evitar um espirro descabido. Por vezes, olhava um desenho que fazia no seu dedilhar, uma mocinha dos seus 15 anos, filha de Mercês, jogando os bilros para um lado e para o outro, como se já tivesse a maestria de Mercês. Se bem que pensasse, a mocinha levava jeito para aquela profissão de rendeira. Elas trabalhavam o dia todo e todo santo dia. Eu nunca perguntei para quem as mulheres faziam o serviço, porém, por acaso, ouvindo a conversa que de vez por outra surgia, ficava sabendo que uma mulher "rica" ia casar uma sua filha, dentro de um mês, e precisava dos trabalhos. Para mim, aquilo pouco importava. Não me interessava mesmo. Eu só queria era ouvir o tric-trac dos bilros, batendo uns nos outros, fazendo um entrançado de linhas, as figuras, as vezes de um santo, às veses de Jesus, de Maria Santíssima, de um cálice ou mesmo do que somente as mulheres sabiam do que retratavam. A renda pode ser feita até mesmo com fio de ouro e aplica-se em guarnições de altares ou em vestes de sacerdotes. Pelo que eu soube, a renda vem de muito tempo e chegou até os casebres de Ponta Negra, há muitos anos e ninguém sabe por quem por alí chegou e teve a humildade de dar este presente. De modo que, Mercês aprendeu o oficio com a paciencia de sua mãe e essa aprendera de sua avó. Era assim que se fazia renda, bico, bordado, tricô, babados, labirintos e tudo mais que, antigamente era feito sem qualquer ajuda de máquina de costura. Até aqueles alegres dias de minha infância era assim que se fazia renda na casa de Mercês.
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