sábado, 14 de novembro de 2009

RIBEIRA - 373

- CIDADE ALTA -

Esta é a Cidade Alta (foto) ou parte da Cidade. Como se pode vê, nada demais. Poucas casas e ninguém por perto. Contudo, era a Cidade Alta, trecho da capital do Natal (Rn) quando a metrópole não tinha nada para mostrar. Mesmo assim, foi nessa arruado de casas que a minha tia Nenen - nome era Irací Leandro - casou com um rapaz da Polícia Militar e com ele viveu por muitos anos. Durante o seu casamento, Iraci teve 11 filhos, bem abaixo do que sua mãe, Estefânia, que deu à luz 21 rebentos, dos quais 16 escapara com vida. Seu marido era Francisco Borges que terminou a carreira como Coronel da Polícia. Depois disso, gozou de sua aposentadoria olhando a cidade do alto, que tanto bem lhe fez. Nenen e Borges residiam em um bairro mais afastado do centro da cidade. Um bairro que alguém pôs o nome de Lagoa Seca, pois, lá, existia uma lagoa que nem era tão seca assim. Eles moraram nesse local, um tanto distante da chamada lagoa seca. Sua casa de terreno imenso, ficava na Avenida Dois, hoje chamada de Presidente Bandeira. Em sua morada tinha um verdadeiro sítio, com árvores frutíferas que brotavam às mais saborosas frutas, como o araçá. manga, graviola, araticum e mais algumas outras espécies. A casa de tia Nenen ficava quase vizinha a uma vila de sargentos da Polícia Militar, separando-se apenas por um clube da Polícia onde havia saraus vez por outra. O único meio de transporte para se chegar àquele ponto longincuo era o pontual Bonde que passava pra lá e pra cá a cada meia hora. Quem fosse de Bonde para o Alecrim, esse era o ponto principal. Se alguem fosse para a Ribeira (bairro), teria que embarcar em outro Bonde, pagando a passagem de 300 reais ou 3 centavos. O já tenente Borges tinha a primazia de um carro da PM ir buscá-lo em sua casa. Eu vi, por várias vezes o tenente, capitão ou então major está a balançar em sua espreguiçadeira, pra lá de pra cá, aproveitando o ar abundante e quente que soprava vindo das encostas do morro do Tirol e Morro Branco que dava aos que desfrutavam um tempo de paz e sossego. O primeiro filho de tia Nenen foi Renan, um garoto sagaz, porém um pouco deficiente, ao falar com que tivesse em sua casa.. Para a minha mãe, que era a sua tia, ele se expressava de uma forma onde se entendia com facilidade -"aaabenção, tititiaNera!". - era a forma com que pedia a benção. Os demais irmãos e irmãs eram todos normais em sua fala. Tia Nenen reclamava bastante das arteirices que Renan aprontava, como sair de casa sem dizer nada ou a ninguém para olhar os artigos que estavam à mosta nas lojas do Alecrim. Vez por outra, um soldado da Polícia, que já o conhecia, levava-o de volta à sua casa, dizendo-lhe. "Seu pai está brabo!". E ele, obdiente, aceitava o conselho do policial. Dos filhos de tia Nenen, podemos destacar: Renan, Odilson, Oriane, Chico (Francisco), Anchieta, Santino, Oceanira (Nirinha), Odilma, (Maria das) Graças, Maria do Carmo e Maria de Fátima. Dos onze filhos estão vivos apenas sete: Odilson, Anchieta e as cinco irmãs mulheres. Tia Nenen nasceu no dia 19 de dezembro de 1912 e faleceu no dia 21 de fevereiro de 1985, aos 73 anos incompletos. Eu tenho a recordar o tempo que Chico passou a trabalhar no armazém de tio Zeca (José) onde, todo dia sempre chegava depois da hora, coisa de 30 minutos. Por isso, tio Zeca ficava possesso da vida e pegava a relamar:

--- AGORA!!! - esbravejava tio Zeca.

--- É o ônibus. - explicava Chico.

--- QUE ÔNIBUS!!!! - explodia tio Zeca.

Certa vez, Chico chegou - como sempre - meia hora atrasado. E já estava aos berros do tio Zeca. Eu, que vinha um pouco mais atrás também, levei as sobras.

--- VOU CORTAR O PONTO DE TODOS OS DOIS!! PODEM IR EMBORA!!!! - textuou tio Zeca.

E nós apenas demos meia-volta e largamos para o Ministério do Trabalho pedir explicações: se trabalhavamos ou não, naquele dia. O funcionário nos declarou:

--- Claro que não. Ele não mandou vocês embora? Então, pronto. Amahã vocês voltam. Veja o que ele diz. Vocês tem carteira? - perguntou o fical

--- Só eu. Ele. não. - disse eu ao fiscal.

--- Pois voltem aqui. Voltem aqui! - recomendou o fiscal.

E nós fomos perambular todo o resto da manhã, percorrendo o Cais do Porto, vendo os navios desembarcar mercadorias e coisas mais. Já estavamos certos de que se perdessemos o emprego, tinha a nosso lado a DRT. Então, pra além do tempo, nos despedimos, pois já estavam às 11 horas. Quando eu chegei em casa já tinha estado lá um serviçal, pedindo para que eu voltasse ao trabalho. Dessa vez, eu tinha muito o que falar a tio Zeca.

--- Eu passei no Ministério e não tenho obrigação de trabalhar! - disse eu.

--- Olhe! Olhe! Olhe! Já foi pro Ministerio!!! - disse tio Zeca. E explicou que só tinha mandado embora Chico, que era também seu sobrinho.

--- E por que eu não? Se cheguei depois de Chico? - respondi de forma grossa a meu tio.

---Ooooooora! - respondeu ele.

Tempos depois, Chico foi aprovado em um concurso de Fiscal de Rendas e me mostrou seu nome no Diário Oficial do Estado. Ele pediu as contas e saiu para entrar no Estado. Nunca mais eu o vi. Soube apenas que, numa inspeção estadual, para os lados de Pau dos Ferros, o jeep em que viajava se acidentou e ele morreu de forma inesperada. Aquilo me entristeceu profundamente. Era o fim de meu primo e ex-companheiro de trabalho, Francisco Borges.

Ficava em minha mente os tempos infantis que bricávamos em um local bem abaixo de sua casa, em um terreno baldio, de jogos de bola e de gude. Eu, ele, Oriane e Odilson, pois os outros dois irmãos ainda tinham que nascer. Para mim, foi o ocaso da vida a morte de Chico.

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