sábado, 6 de fevereiro de 2010

LUZ DO SOL - 18

- ANNE -
CONTO
Augusto Menezes estava, naquela hora, pensativo, lembrando um velho amor que não seria tão velho assim quando os dois enamorados se encontraram pela primeira vez em Nápoles, quando a guerra tinha chegado ao fim. A Itália estava um monte de escombros com a destruição provocada pelas armas e tanques que dizimaram o país. Menezes voltava para casa, no Brasil, e encontrara por acaso, aquela jovem, de roupas poídas e quase nua, vagando pelas ruas da cidade, buscando alguma coisa para matar a fome entre o lixo que sobrara da guera. Ele estava só, quando viu a jovem a catar com vagar o lixo. De certo modo, era grande o número de italianos que perambulavam por ruas e becos de cidades destruídas, a procura de algo para saciar a fome. E aquela moça era uma das muitas que estavam nesse mesmo sacrifício de tantos italianos quase mortos pela guerra. Em tal momendo, Menezes viu a jovem a catar lixo e quase nem se deu conta da miséria estampada naquele rosto franzino de mulher. Quando a moça tropeçou e caiu sobre os escombros foi que Menezes se deu conta que alí estava um ser humano a procura de alguma proteção. Então, Menezes acudiu a jovem, dando-lhe a mão para que se levantasse dos escombros da cidade. A jovem aceitou e agradeceu, com certeza, com um obrigado que Menezes só entendia ser um agradecimento:
--- Grazie - voz da jovem.
--- Levante. Tome a mão. - disse Menezes.
--- Grazie - voltou a jovem a falar.
Em tal momento, Menezes notou no semblante da jovem algo de puro e belo com se estivesse segurando um filho ou filha naqueles tempos de desventuras. Nada sabia o que lhe dizer, pois por mais que se parecessem os idiomas, algo de estranho ofuscava-lhe a mente e tão somente o que podia fazer era dizer algo em português um tanto arrastado de um nordestino brasileiro que foi mandado para a luta em terras da Itália. De seu modo, a jovem olhou para o homem com suas vestes de militar, um tanto rotas, com a pele do rosto toda alquebrada, mas traduzindo através do seu olhar um gesto de ternura. As mãos de Menezes era firmes como feitas para segurar uma arma pesada, e ele trazia às costa um fuzil-metralhadora, o saco cheio de alguma coisa, talvez alimento, chocolate ou alguma fruta. Então Menezes se compadeceu cada vez mais da jovem italiana e sem que ela pedisse ele lhe deu uns pacotes de chocolate e uma caneca com água.
--- Tome. Coma. É bom. - dizia Menezes.
E a moça somente sabia dizer a palavra que conhecera para agradecer.
--- Grazie. Grazie. - dizia a moça.
--- Não há por que. Coma! - dizia Menezes.
--- Grazie per avermi regalato. - disse a jovem.
Para Menezes, aquela confusão de palavras não lhe fizera maior sentido, pois sabia que não entendia de coisa alguma do que a jovem acabara de dizer. Por fim, ao ver a jovem desembrulhar as barras de chocolates, ele lhe disse seu nome e quis saber o nome da jovem.
--- Meu nome. Menezes. Menezes. Eu. Menezes. -Entendeu? - disse-lhe o rapaz.
--- Ma si. Menesses! - fez a moça de forma que entendera.
--- Menezes. Ouviu? - disse o rapaz.
--- Ma si. Si. - repetiu a jovem.
--- Seu nome? - apontou o jovem em direção da moça.
--- Anne. Io sono Anne. - respondeu a moça, inquieta, procurando se compor.
Daí por diante, todo suado, cansado, nem sabendo para onde ir, Menezes começou a conversar no seu idioma com a jovem Anne e procurar o caminho, entre muitas pessoas que andavam a perambular entre os escombros que a guerra deixara, até o certo porto onde ele embarcaria no navio que o trouxera para o Brasil. No meio do caminho, a moça conversou um bocado de tempo dizendo que ela era italiana e estava alí, vinda do norte da Itália para escapar da guerra. Seus pais, ela já nem sabia ao certo que lhes acontecera. Disse ter visto soldados brasileiros a caminhar pelo lugar. Certas palavras ela ouvira falar. Algumas, ela aprendera. Mas, ao certo, não sabia o significado.
Com olhos negros, cabelos curtos, pele macia apesar da poeira da guerra, Anne olhou bem o rapaz e esse lhe disse que teria de voltar para o Brasil. Se um dia pudesse lhe chamar para ir morar com ele na sua terra, Menezes ficaria muito feliz. Alí, no porto, os dois se acertaram em trocar correspondencia, apesar de a moça não ter dinheiro qualquer. O jovem se inquietou por isso, e disse que um jeito seria dado para que ela não ficasse da forma que a encontrou. E puxou do seu saco uma mochila de notas e a fez presente, dizendo que ela precisaria trocar em um Banco por moeda italiana. Anne agradeceu de vera o que o rapaz estava fazendo por ela e, ternamente, chorou como igual a uma jovem menina.
Por um resto de dia, depois de almoçarem em um restaurante, se era possivel chamar aquele quiosque de restaurante, os dois ficaram a conversar e acertar a vinda de Anne para o Brasil, pois Menezes combinou com a moça lhe mandar dinheiro em quantia razoável até quando ela precisasse de se arranjar e ter a possibilidade de vir morar com rapaz no seu pais. O dia era quente, e Menezes tinha que embarcar no navio, pois a saída já estava com hora marcada. Ele viu na beira do cais, uma porção de barracos com gente morando, couros de cachorros espichados ao sol, homens e mulheres, crianças de braço e outras mais a perambular pelos cantos. Na hora da partida, Menezes estava no parapeito do navio a acenar, chorando, para Anne que estava no cais e sacudir destemida com o seu comovente pranto ao cair das lágrimas o lenço branco a desfraudar para o seu eterno namorado.

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