sábado, 17 de julho de 2010

MEIAS DE SEDA - 17 -

- MEIAS DE SEDA -
- 17 -
Na curva da linha de trem quando esse saía da Estação Central, havia uma imensa Casa Grande no meio de um terreno bem amplo. A casa ficava em um “X” com a curva da linha férrea. Ali morava o Coronel Veríssimo, homem de seus 60 anos de idade, dono de uma boa parte de terra existente na região da Companhia de Força e Luz. A Usina de Energia de Água e Luz ficava de um lado e o casarão do Coronel Veríssimo ficava do outro lado. Nas terras do Coronel tinha um cata-vento para assegurar o abastecimento de água para a sua casa e também para os animais que ele criava como gado, cavalos, cabras, bodes, carneiros e ovelhas dentre galinhas e outras coisas a mais. O terreno do Coronel ficava próximo ao sítio do seu Osias, como era chamada a terra que o homem vendera há pouco tempo ao outro colhedor de feno, seu Jubal, que era terreno vizinho com o sitio de Osias. Como todos já conheciam o terreno de Osias, pouco importava se ele havia vendido ou não. Ficou o costume de se chamar o sítio de seu Osias apesar do dono ser seu Jubal. E perto do sítio de seu Osias também ficava a Casa Grande do Coronel Veríssimo quase como fazendo um “X” com a terra do homem. Da casa do Coronel para o sitio do seu Osias era um pulo. E o Coronel mandava comprar todos os dias o feno para dar aos seus cavalos e gado que ali existiam. Um criado era quem fazia as compras do feno todo santo dia quer chovesse ou não.
No terreno de seu Osias havia um casebre feito de pau com reboco de barro. Era um casebre, não restam duvidas. Uma casa de taipa para bem dizer. Ali dormia o caseiro mais a sua mulher, Creusa. O homem se chamava José Bento que tomava conta de todo o sitio, mesmo depois que o dono, Osias, vendeu todo ele a Jubal. O homem colhia o capim e vendia a quem procurasse pelo feno inclusive ao Coronel Veríssimo que comprava a Osias há um bom tempo. Como já era costume do Coronel, ele mandara um empregado buscar o feno e no meio da passagem dizer a mulher, Creusa, que ele – o Coronel – estava a lhe esperar no canto de costume. O recado era dado através de sinais que o empregado fazia para a mulher que sempre estava em casa sem fazer coisa alguma. Creusa foi mulher da vida e certa vez José Bento a tirou para ir morar com ele no sítio de Osias. Os dois já moravam naquela casa de terra batida há cinco anos. Quem fosse falar com José Bento tinha que passar pela frente da casa de taipa onde ele morava.
A mulher entendeu o recado dado pelo serviçal e se arrumou depressa. Ao sair de casa, ela disse ao seu companheiro que estava de bruços colhendo feno para atender aos compradores.
--- Zeca! Vou ali e volto já. – gritou a mulher Creusa ao companheiro.
Esse nem deu importância sabendo que ela fora fazer safadeza para bem dizer. Zeca olhou desconfiado para Creusa enquanto a mulher corria pelo terreno em frente ao sítio de seu Osias e pegou o rumo da ladeira que dava acesso ao Cemitério. Ele balançou a cabeça para um lado e para o outro e não disse patavina. Creusa esperou um pouco na calçada alta da Igreja de São Pedro até o carro de o Coronel apontar na rua de entrada da Igreja e afinal parou para a mulher entrar pela porta da frente e ficar sentada esperando conversa que quase não havia a dizer. O Coronel seguiu por uma rua sem nome e foi até ao final onde entrou por outra rua e chegar por fim ao Solar de Virgínia de que ficava no final da Avenida Dois com a Rua São José, no bairro de Lagoa Seca. Era o fim do mundo aquele solar. De solar não tinha nada. Mulheres de vida fácil ali faziam seus habituais encontros com cavalheiros de pouca vergonha que andava às escondidas pelo solar. Muro alto para ninguém notar o que se passava dentro do solar, bancas toscas, cadeiras de vime ou de madeira, na entrada da casa um salão de baile e um corredor a seguir, um quarto mais ou menos pobre e nada mais. Virginia sempre estava ocupada com alguma coisa. A gerente era quem vazia a vez. Ele procurou um quarto que estava pronto para atender ao Coronel. Dentro do quarto, uma toalete, um armário de guardar roupa, uma bacia com água, um jarro cheio de água também, perfumes com cheiro de azedo, duas cadeiras, uma cama de casal com cobertor e um banco alcochoado era tudo que havia no quarto. A mulher ajudou o homem se despir e se despiu em seguida. Enfim os dois foram para a cama rangedora, pois o colchão era de mola.
Após satisfazer o seu amado a mulher Creusa pediu uma cerveja bem gelada para o Coronel Veríssimo que o homem estava com muita sede, disse a dama. Após pouco tempo, a empregada chegou com a cerveja em cima de uma bandeja semelhante a prata, dois copos, um avental e uns tira-gostos para bem melhor servir. O Coronel dispensou os tira-gostos e apenas bebeu a cerveja dando cada arroto de fazer medo. O homem era gordo, pançudo até, pele branca, muito branca mesmo mais parecia um holandês ou alemão. Sua origem ele nunca falava apesar de muita gente chamar-lhe de “alemão” por sua cor embranquecida, sua altura colossal – homem de dois metros ou coisa assim – e músculos fortes. De Coronel ele não tinha nada. Apenas o seu avô tinha esse titulo comprado ao Governo da Província. Eu seu pai também era chamado de Coronel e assim ficou ele sendo chamado pelo igual nome.
De repente, um susto: o Coronel havia desmaiado. A mulher Creusa chamou a gerente e essa veio com mais pressa ainda. Ajuntaram-se as mulheres que estava no Solar. Apesar de todas procurassem o coronel desmaiado, a gerente impediu entrada de tanta gente no quarto. Ao sentir que o velho não recobraria a consciência, de imediato chamou-se um veículo que estava sempre estacionado por dentro da entrada do solar e em seguida puseram o velho Coronel todo troncho e meio alquebrado pelo que sofrera, no interior no automóvel e, em seguida, o veículo seguiu viagem para o hospital na esperança de que pudesse salvar-lhe a vida do velho ou quase velho por assim dizer. Nunca houve caso semelhante no augusto Solar de Virgínia. A dona do estabelecimento cuidou para que tudo transcorresse em absoluto sigilo. Ao dar entrada no Hospital, o homem deu o seu suspiro de morte. Ele morrera de uma parada cardíaca ou quase isso. Os médicos de plantão o examinaram e chegaram a conclusão:
--- O homem está morto! Nada mais a fazer! – disse o clinico médico.
Virginia que foi até o hospital ficou pálida de vez ao ouvir a sentença o médico.
--- Morto doutor? Não é possível uma coisa dessas! Ele estava tão bem agora! E está morto? – perguntou Virgínia quase a chorar.
--- Pode levar para o necrotério. O exame dirá do que morreu. – falou o médico saindo em seguida com o seu uniforme branco abanando que nem um véu.
--- Quem vai dizer a família dele? – perguntou o motorista.
--- Não sei, Quem poderá ser? – perguntou Virgínia atônita e de olhos bem abertos.
--- Eu digo!- falou Creusa inventando uma historia de que estava no hospital quando soube da noticia da morte do Coronel e então pediram a alguém para avisar a família.
A conversa surtiu efeito. Creusa saiu no carro de Virginia e saltou pouco antes de chegar à casa do Coronel. Dali foi um passo. Ela saiu correndo para avisar que uma pessoa que estava no hospital disse-lhe que o Coronel Veríssimo tinha falecido naquele dado momento. Era tudo o que a mulher sabia dizer. Foi esse o relato que chegou aos ouvidos de Dona Cândida e das suas três filhas. Creusa deu o recado e saiu para a sua casa, no sitio de Osias. Houve tumulto na casa do Coronel Veríssimo. As filhas eram as mais atentas ao cuidar da senhora sua mãe e se dirigir para o Hospital a procura de notícias mais precisa. Um enfermeiro que estava no pronto-socorro foi quem atendeu a moça de cerca de 30 anos. Ele a levou até o necrotério do Hospital e mostrou o cadáver do Coronel para que de fato a filha pudesse identificar o corpo. Com a filha Susete estavam mais um acompanhante e outra mulher que não se identificaram.
No dia seguinte houve o sepultamento no Cemitério da Cidade do velho e nobre Coronel Asclepíades Veríssimo do Monte. Lágrimas e ranger de dentes por todos os que o conheciam. Toda a gente nobre da cidade naquela tarde de verão compareceu ao féretro do ilustre Coronel e em conversa baixa e dolente alguns perguntavam por querer saber deveras.
--- E o carro dele onde está? – perguntou em surdina alguém querendo saber.
--- Não sei. Nem ouvi falar. – dizia outro em total surdina também.
--- Estranho. Muito estranho. – respondeu o primeiro a perguntar.
O cortejo saiu às quatro horas da tarde para o Cemitério da Cidade em meio à profunda comoção de parentes e amigos de velho. Dona Cândida foi no carro da frente.

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