sábado, 3 de julho de 2010

MEIAS DE SEDA - 3 -

- MEIAS DE SEDA -
- 3 -
Ao chegar à cabana de taipa mal cuidada, Jubal abancou um copo de alumínio para beber água e molha a cabeça tirando o fogo da quentura causada pelo sol. Após ter despejado a água sobre seu pescoço ele foi para fora, ficando um tempo na cobertura que fazia o alpendre sempre mal construído por suas próprias mãos. Ali fora, tossiu e escarrou para longe aquilo que Le atormentava o respirar. O calor aumentava e os caranguejos se propunham a vir para o terraço onde Jubal sacudia com o facão os crustáceos para longe de onde ele estava. Os caranguejos caiam longe de qualquer forma enquanto Jubal rosnava:
--- Bichos nojentos! Só servem cozidos! – argumentou o homem ainda com ira.
Na porteira do capinzal ele viu quando chegou Zilene vindo ele não sabe de onde. Talvez viesse da Feira do Paço. Talvez, não. O que ela queria naquele sitio cheio de cana caiana, de duas mangueiras de manga rosa e de capim elefante, ele não sabia dizer. Ele apenas olhou a moça de seus 20 anos, mais ou menos. A porteira se fechou como se fosse automática, pois ao bater num tronco de árvore a engrenagem fazia o sentido inverso. A moça caminhou sorridente, entre matas de cana e de capim. Ela foi logo dizendo, sem que Jubal entendesse de coisa alguma.
--- Você está sujo? Por quê? – perguntou Zilene com voz sorridente.
--- É o trabalho. Eu mudo de roupa para trabalhar. E o que você procura? – indagou Jubal de imediato.
--- Nada. Só vim aqui. O tempo está é quente, não está? – indagou a moça se aquietando no banco que Jubal havia feito.
--- É. Tudo está quente esta hora. Nem sopra um vento sequer. E você, o que quer? – perguntou Jubal com um leve sorriso.
--- Nada não. Já te disse. Vim só olhar como você trabalha. Posso? – indagou Zilene com leve sorriso.
--- Pode. Eu estou trabalhando no cortar de capim. Vim aqui tomar água. Então vi você chegando e esperei para saber o que era. Se não é nada, então eu posso sair para o capinzal. Se você quiser pode vir também. – falou Jubal já arrumando o facão de cortar capim que ele havia amolado certo tempo atrás.
--- Posso mesmo? Mas tem é mato aqui. Mato muito. – delirou a moça se acostumando ao recinto onde ela estava.
--- Não é mato. É capim. Mato tem nos morros que rodeiam a cidade. – respondeu Jubal de certo modo inquieto.
--- Como você aprendeu a plantar esse mato? – perguntou Zilene de modo atrevido.
--- Não é mato. É capim. E eu aprendi desde menino na fazenda onde eu trabalhava. – respondeu Jubal procurando se desvencilhar da conversa fria.
--- Ah bom. Quer dizer que você trabalha com esse negocio há muito tempo mesmo? – perguntou Zilene como querendo fazer fita.
--- Muito. Desde menino. Depois ingressei no Exercito e por lá também colhia capim. Parece que é a minha sina. Mas, dá para o gasto. Tenho essa fazendinha e não quero mais nada. – respondeu Jubal de forma mais tranqüila.
--- É bom aqui. É onde você mora? – perguntou Zilene querendo saber de tudo.
--- Não. Eu tenho minha casa. Aqui só faço trabalhar. – contestou Jubal de forma que não queria dizer mais alguma coisa.
--- Ah bom. Você mora com mais outra pessoa? – perguntou Zilene averiguando o ambiente onde ela saiu do banco para ver a sala de visita.
--- Não senhora. Eu trabalho aqui. Tudo é meu. Até esses caranguejos que está nos seus pés. – respondeu o homem com uma graça.
A moça olhou de imediato para o chão e deu um gritinho safado sem muita disposição enquanto o caranguejo se acercava de seus pés.
--- Ui bicho. Sai daqui nojento! – reclamou Zilene sem muita graça.
--- São “elas”. Estão amojadas. Ou seja: estão na época de “andada” ou andar à toa. É o período de reprodução. Quer dizer: elas estão prestes a parir. - explicou Jubal sem saber por que dizia tudo isso.
--- Ah e é? Vão botar ovinhos? Interessante! – disse Zilene olhando as fêmeas com melhor atenção, pois estavam cheias de caranguejinhos.
--- É. É isso mesmo. Vem por meses e por luas. Tem dia que eu não posso nem andar com tantas fêmeas ovadas. A gente conhece quando mete a mão na toca onde elas estão. São menores que os machos. – respondeu Jubal.
--- Interessante mesmo. Muito interessante! – respondeu Zilene com um gesto de quem queria saber mais do que fora dito por Jubal.
--- É interessante mesmo. – redargüiu Jubal em meio de tanta ignorância da moça.
--- Como eles fazem? – perguntou Zilene meio atônita.
--- Fazem o que? – indagou Jubal a moça.
--- Os bichinhos. Tão interessante. – respondeu Zilene quase a pegar no crustáceo.
--- Sei lá como fazem. Sei que eles nascem. Como, não sei. – sorriu Jubal.
--- Espere. Você pode achar que eu sou ignorante. Mas não é isso. Uns bichinhos tão magrinhos e fazem amor? É isso que eu acho interessante. – respondeu Zilene atônita.
--- É verdade. Tem gente magra que faz também. – disse Jubal para desequilibrar a jovem moça.
--- É mesmo. Eu sou magra. Magra mesmo. Olhe minhas pernas. São finas que nem um palito. Mesmo assim, eu tenho vontade de fazer o que eles fazem. – contrapôs Zilene ao seu mestre e com isso atenuando uma conversa que levaria um bom tempo.
--- Eu não sei o seu caso. Mas eu vejo gente mais magra que você com uma barriga e tanto. – rebateu Jubal em contrapartida.
--- É. Tem gente assim. Não duvido. Mas olhe aqui as minhas pernas. As cochas. Que magreza. Não ganho para um pinto. – respondeu Zilene suspendendo a saia até mostrar uma parte de suas vestes intimas. E deixou assim para Jubal ver e dizer algo.
O esforço da moça parecia ter sido totalmente em vão, pois o homem nem queria saber da vontade que sugeria Zilene naquela oportunidade. Ele, um homem de seus quase quarenta anos e ela uma moça que se podia dizer: 20 anos de idade. Se não tivesse essa idade, bem que poderia ter. Jubal era um homem sério. Teve uma mulher que foi a sua esposa, morta durante o parto do seu filho Otávio que ela ainda chegou a conhecê-lo por uma dádiva do destino. Otávio se criou apenas com o pai, a avó e as duas irmãs. E nunca mais Jubal quis saber de outra companheira. Em seus sonhos e pensamentos só havia espaço para Nora, jovem moça prendada que se casou quando Jubal era ainda militar. O garoto tinha seis anos de idade quando Zilene arrumou essa situação para o desgosto do homem já então maduro. E ele não podia dizer à moça que ela era magra demais, pois afinal ela apenas tinha um corpo franzino. Então, aí, pairou a dúvida na memória de Jubal. Querer ou não querer. Isso era tudo. Ela estava dando de graça algo que o homem poderia comprar por vinte cruzeiros ou mais ou menos.

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