sábado, 24 de julho de 2010

MEIAS DE SEDA - 24 -

- MEIAS DE SEDA -
- 24 -
Eram passados alguns meses quando, pela manhã logo cedo, vinha pela calçada do Royal Cinema a senhora Doca em direção do Mercado Publico da Cidade. Com certeza vinha ela de algum trabalho ocasional ou de fazer compras de certas mercadorias ou de qualquer coisa que não se sabia então. Na hora em que a mulher vinha pela calçada eis que surge do Café existente na Rua Vigário Bartolomeu, frente com um campo desocupado que servia apenas para amarrar cavalos e jumentos, a figura de Inaldo, ex-amante da filha de Dona Doca, a moça de mais de 20 anos que se chamava Zilene. A mulher topou com Inaldo frente a frente, indo pra lá e pra cá sem conseguir se definir qual o percurso tomar. Naquela confusão de sai não sai à mulher olhou para a cara de Inaldo, pois vinha de cabeça baixa. Quando olhou para o rapaz a sua cara de sorriso mudou e nem desculpas pediu. Foi uma cara feia de horror e revolta que traduzia uma porção de ocorrência que dona Doca teria a dizer ao seu ex-genro ou quase genro, pois ele nunca casara com Zilene e a tinha abandonado desde que certa vez a entrou no Solar de Alba com um amante ao que parece improvisado. E naquela ocasião Inaldo ainda deu umas tapas na moça e saiu ligeiro indo até o sitio de Jubal para rogar proteção, pois se sentira desamparado por parte da então chamada meretriz. Com olhar seco da mulher, Inaldo traduziu o que havia para dona Doca dizer de uma só vez.
--- Onde está minha filha? O que você fez com ela? – isso e mais coisas para recitar.
Mas a mulher não disse nada. Apenas pulou da calçada para o meio da rua e saiu brava igual a uma taturana, pois em seu olhar pairava um fogo cruel. Inaldo até que não deu importância ao desencontro tendo feito um sorriso com o desespero da mulher, cuja sandália se quebrou ao tentar fugir de rua a fora. Dava para sorrir a desesperação de dona Doca. Por certo que dava. Inaldo então se lembrou de Zilene e o que ela estava a fazer, se estivesse no mesmo local que a deixou, o Solar de Alba, onde mulheres prostitutas eram coisas que não faltavam. De imediato pensou em voltar naquele local pela noite. Se conseguisse Zilene, cuidaria com melhor afeto, pois o rapaz ainda sentia um doce carinho pela mulher amada. Ele apenas pensou e apesar do desassossego de dona Doca em calçar a sandália que não mais servia, caminhando com uma perna só, Inaldo saiu para a sua repartição onde o trabalho tinha tempo para começar.
No mesmo dia para além das 9 horas da manhã, Inaldo estava sem cisma a dedilhar compenetrado em sua máquina de escrever quando, de repente surgiu no seu birô a figura enigmática do jovem rapaz que todos o chamavam de “Lunático”, pois seu nome era incerto. Talvez João, talvez José ou qualquer nome assim. Lunático chegou ao birô de Inaldo e deu três pancadas com o dedo e esse se virou e viu o rosto do rapaz. De surpresa tornou-se conversa diante de alguns funcionários que julgavam o rapaz de pleno louco. Conversaram um pouco sobre a gema do ovo e sorrisos francos eram ouvidos por todos os que estavam no ambiente apenas cochichado palavras que nem se sabia dizer. O Lunático se sentou em uma cadeira de palha junto a Inaldo e disse que estava naquele recinto porque viera falar com o prefeito. Porém não o encontrou. Pelo que soube o Prefeito estava em viagem. O Lunático vinha trazer para a Prefeitura um projeto que daria sentido a administração. Apesar de lhe chamarem de louco, ele um rapaz de inteligência invulgar. Porem, não estava o Prefeito e ele não abrira a boca para dizer o que tinha em mente. A conversa girou nesse tópico. Quando o rapaz saiu eis que Inaldo se lembrou de uma pergunta que já deveria ter feito há mais tempo ao rapaz. Então saiu de sua mesa de trabalho deixando os papeis a voar para todos os sentidos e ainda assim encontrou Lunático na calçada em frente a sua repartição de trabalho. Logo ao sair Inaldo chamou pelo rapaz, com certeza sem citar o seu nome. Apenas o chamou. O Lunático parou por instantes e perguntou se era com ele.
--- É você. Diga-me o seu nome. – perguntou Inaldo mostrando um sorriso.
--- Como você me conhece? – indagou o Lunático.
--- Eu conheço pelo apelido. Mas preciso saber o seu nome. – respondeu Inaldo.
--- Nome? Que importa? Qualquer nome. – respondeu Lunático.
--- Deixa de brincadeira. Você tem um nome. Eu não sei qual seja. Porém é bom saber para se poder conversar melhor e eu tenho algo a lhe perguntar. – falou Inaldo
--- Mauricio. É esse o meu nome. – respondeu o Lunático.
--- Mauricio? Viva? Eu sabia que você tinha um nome. Viva – gritou alegre Inaldo.
--- Que você quer saber? – perguntou Mauricio, o Lunático.
--- A cobra! – perguntou Inaldo se desfazendo do riso.
--- Cobra? Que cobra? – perguntou Maurício.
--- A serpente. Cobra. A que tentou Eva. – respondeu Inaldo.
--- Ah, sim. Podemos conversar aonde? – perguntou Mauricio.
-- Podemos ir ao Café da Bartolomeu. – citou Inaldo.
--- Pois vamos. Você vera como era a serpente. – disse Maurício a Inaldo.
E os dois seguram direto para o Café da mulher evangélica. Entre pedidos de café pequeno e outras coisas para se comer com café, a mulher trazendo e pondo da mesa então a conversa seguiu. Mauricio fez ver a Inaldo que não havia serpente alguma na literatura bíblica. Isso porque a Bíblia tinha começado a se escrever 400 anos antes de Cristo nascer. E foram 40 anciãos que escreveram a Bíblia. Que os cérebros da Bíblia, como Davi, tinham sido degolados. Que Moises era um Príncipe dos Sumérios. E que a Bíblia era um conjunto de história e nada foi escrito pela ordem de Deus, pois o Deus que ele já mostrara outra vez, não passava de um ovo ou ovulo. E a serpente criada pela história não passava de mera especulação quimérica para que o povo da idade antiga entendesse melhor. A serpente – falou Mauricio – era a figura do testículo onde estava encoberto o sêmen ou o espermatozóide e o caminho por ele a percorrer até chegar ao útero da mulher onde encontraria a luz. A luz que era o ovulo.
--- Para você se lembrar, o espermatozóide é um pequeno ser. Ele caminhou sem cessar do testículo do homem até chegar ao ovulo. Para ele, tão pequenino, o ovulo era imenso. Ali, o espermatozóide abriu a porta, entrou e trancou para ninguém mais entrar. E ninguém – os seus irmãos – não entrou. O esperma restante fora jogado para fora, ou seja, “desceu ao inferno”. E a serpente, por ter um formato sinuoso era o que melhor representaria o caminho seguindo pelo espermatozóide. Quando a serpente disser a Eva, você deve se lembrar que Eva é igual à vida. Tanto você pode chamar uma pessoa de Eva como pode de vida. E a serpente teria que dizer a vida que tudo ela saberia se comesse um pedaço da maçã. Ora. Um pedaço foi o que ela provou do sêmen. A vida teve somente uma quantidade irrisória para provar. E essa quantidade foi um ser, um espermatozóide. O restante, ela apagou, pôs no “inferno”, na terra. É essa a historia da serpente. Portanto não existe serpente, a não ser o caminho de que se segue do testículo ao óvulo. Dá para entender? – perguntou Mauricio.
--- É danado! E porque não se diz abertamente? – indagou Inaldo pouco cismado.
--- Por quê? Mas a Religião Católica diz isso sempre. Todos os dias. Ela abre os olhos dos seus adeptos. Diz os Judeus também. Agora, se dizer e se entender de fato vai um caminho longo. Não adianta para um Padre dizer que viu Deus com Ele é se ninguém quer acreditar. – respondeu Mauricio.
--- Quer dizer que eu sou culpado em não entender? – perguntou Inaldo estarrecido.
--- Tu dizes! –respondeu Mauricio e acrescentou. – Veja bem. O homem faz de sua vida uma porção de coisas. Quando ele casa, ele quer casa. E uma casa tem uma porta. Quando ele entra em casa, o que faz? O que faz? – perguntou Mauricio.
--- Bem. Eu vou tomar banho. – respondeu Inaldo de forma jocosa.
--- Não senhor. Você fecha a porta. Fecha como fechou ao entrar no ovo que aprontou você para estar falando agora comigo. O banho. O banho vem depois que a sua mãe lhe recebe no ovo. Ai então ela lhe dar o banho. Mas dar mesmo. No ovulo. Quando você nasce, a preocupação primeira que sua mãe tem com você é lhe dar banho. Veja se não é? – indagou Mauricio.
--- Puxa! Eu não tinha nem pensado nisso! – sorriu Inaldo.
--- É isso amigo. Mais alguma coisa em dúvida? – perguntou Mauricio de modo serio.

Nenhum comentário: