domingo, 5 de setembro de 2010

DANÇA DAS ONDAS - 11 -

Drew Barrymore
- 11 -

O bonde trafegava vagaroso com o seu brando sinal para alertar o cobrador que estava de partida ou alguém para estar no ponto de parada. Nessa hora da manhã a sua lotação já seguia quase a metade. Honório estava sentado em um dos bancos de meio lendo um jornal do dia passado, com certeza notas esportivas. Fazia calor na plena manhã de sol, ainda nem sinal de tempo frio. Em uma parada ele viu subir a moça que fizera um pic-nic com ela e a sua irmã para uma praia do litoral do Estado. Quando Adélia subiu logo avistou Honório e se fez de sorriso. Ele, em troca revidou sorrisos. Fazia pouco tempo que os dois companheiros de Bonde não se avistavam. O rapaz não se esquecera do pedido feito da última vez. Naquele domingo ele havia pedido para Adélia se casar com ele. Porém, a moça foi meio reticente e pediu que aguardasse um pouco. Desse modo, ele resolveu não tocar mais no delicado assunto. Casos aconteceram e Honório não pensaria no tal tempo em casar. E Adélia parecia recordar pouco do que houve ou não fizera ele o gosto a moça. Enfim, o negocio nem foi nem veio. Ademais, ele passou alguns dias ausentes da casa de Adélia por motivos próprios. Por isso mesmo Honório não procurou conversar mais no assunto. E, com o tempo, ela talvez até esquecesse-se do caso. Porém, naquela manhã Honório sentiu nova vibração por Adélia e, apesar de constrangido por não poder dizer o que acontecera resolveu o assunto por outro lado.

--- Você hoje aqui, não é? – disse Adélia sorridente.

--- É. E estou atrasado para chegar ao serviço. Como tem passado você? E Ângela? – perguntou Honório um tanto desconfiado por não ido mais a casa de Adélia.

--- Ela vai, obrigada. E eu já retomei meu expediente e hoje estou seguindo para o trabalho. E que trabalho! – sorriu a moça feliz da vida.

--- Verdade. Você parece muito querida de todos no seu trabalho, não? – perguntou Honório deixando o jornal de lado.

--- Não. Não. É que as meninas fazem fofocas demais. – gargalhou Adélia com sua voz macia.

--- Fofoca é? – sorriu Honório para Adélia.

--- É. O pessoal é bom demais. Diga aí? E você não apareceu mais? Estava encantado? Viajando ou fazendo o que? – indagou Adélia bastante alegre.

--- Eu? Nada. Dormindo. Recuperando-me da luta diária da semana que passou. – explicou Honório o seu tão ausente falado.

--- É mesmo. Pois eu “pensei que você não estivesse mais disposto para ir lá a minha casa”! – sorriu Adélia com todo o ímpeto e fulgor.

--- Eu me lembro de você dia e noite. Parece uma obsessão. Eu mesmo não acredito. Por isso eu resolvi me acautelar. Quero enxergar se, de fato, é realidade. E se não for suma verdade, eu prefiro ver o que tenho a fazer. Na verdade, na pura verdade, em suma, tu és, para mim, uma deusa do Olimpo. Tu enfim nem pode mesmo existir para alguma pessoa. Nem para mim, talvez. Tu és para mim a imagem que nenhum ser pode ter. “És bela, és pura, és meiga, és tudo enfim que tem de belo em todo resplendor da santa natureza. Perdão se ousa confessar-te que eu hei de sempre amar-te” querida minha. – delirou Honório no passeio daquele simples e barulhento Bonde onde outras pessoas tomavam assento em bancos anteriores e posteriores do qual os dois se sentavam.

--- Nossa! Que delírio. Nunca eu tinha suposto ouvir tanta devoção de um cavalheiro em uma manhã de pleno labor. – respondeu Adélia a gargalhar.

Os versos que ele recitava eram de uma canção popular a qual era divulgada no rádio algumas vezes. Mas, sempre havia de surtir bem o efeito quando dita a uma mulher em plena profusão e candura e enlevo. E com Adélia até que surtiu. Ao que parecia, a moça não era ligada em musicas remanescente e que contavam historias de amores delirantes. E mesmo assim, a seu ver, Adélia parecia uma jovem doce e suave, mas não de graça divina onde a canção exprime enlevo da essência perene do permanecer. Naquele instante de suave encantamento, Adélia deixou-se enlevar pela expressão máxima do momento e Honório a beijou suavemente como em contos de fadas. A moça se alucinou por tanta comoção de momento.

Ao trafegar pela avenida já então em calçamento, o Bonde viajava célere, buscando seus eternos e iguais passageiros de todos os dias e de todas as manhãs. Para as pessoas, aquela cena de amor não era algo de anormal se bem uma senhora um tanto idosa cuspira para fora do carro do Bonde ao dizer, ao ver os dois amantes agarradinhos e descuidados:

--- Nojento! – falou a mulher torcendo o rosto para o lado oposto.

Enquanto alguém delirava ao ver tão perene amor a desabrochar.

--- Meu Deus! Como eles se amam! – declarou surpresa outra mulher bem mais jovem.

Com meia hora depois, os dois enamorados estavam a descer do Bonde, sempre juntos, tão pertos onde nada alguma oferecia qualquer espaço. Então estava a resposta onde por longos dias Honório perguntou à meiga e angelical donzela. Ele haveria de sentir amor por longos e eternos momentos de eterna lucidez. A se despedir de sua jovem namorada, Honório lhe deu um beijo na face. E entre tantas gentes passantes para os seus ofícios do dia, Adélia, enlevada com sentimental e carinhoso encanto se despediu. Aquele era o fim de um começo. Um eterno e fugaz início. O rapaz se conteve de momento e não mais pediu afeto.

Com o passar das horas, Luíza já estava de volta ao serviço. Em nada a moça falou ou quis dizer por momentos. Até que Honório, chegando atrasado, lhe deu os cumprimentos amplos normais. Perguntou-lhe Honório como estava a situação pela qual passara.

--- Normal. – respondeu a moça agüentando o choro o qual fazia questão em vir.

--- Esteve no enterro? – perguntou o rapaz de forma humilde.

--- Não. Fiquei em minha casa! – foi à resposta que Luíza pronunciou.

--- Eu pensava que você pudesse ter ido ao velório ou ao enterro. – relutou Honório.

--- É. – comentou Luíza.

--- É? É o que? Você não diz nada? – perguntou Honório com certa pressa.

--- Não! – respondeu a moça pondo-se a trabalhar na máquina de escrever.

--- Está bem! Se não quer dizer, não fale! Agora ficando aqui você só no “é”, “não”. Isso é pouca coisa para se falar. “É”. “Não”! Bosta. Por que eu fui falar? – saiu Honório para o seu local de trabalho enfezado da vida.

A moça se levantou de onde estava e foi para o sanitário ou o banheiro, atrás da casa onde passou um bom tempo. Talvez tivesse ido para chorar e lamentar a perda do namorado de forma tão brutal. Por isso, Luíza não quis saber nem saber de ler jornais cujas edições estavam espalhadas por cima do birô de trabalho. Em súbito momento, o dono do estabelecimento entrou no seu escritório. Ele perguntou por Luíza e teve a resposta do rapaz:

--- Entrou. Está no sanitário. – relatou Honório.

--- Ela falou algo do enterro? – indagou seu Dumaresq meio preocupado.

--- Não. Eu perguntei e ela disse apenas que tinha ficado em casa. – disse o rapaz assustado.

--- Eu sei. Eu sei. Ela não suportaria em ver o rapaz morto. – resmungou Dumaresq.

--- É. Talvez. Pode ser! – relutou em dizer o rapaz.

Em instantes, a moça Luíza retornou do sanitário onde fora chorar por mais uma vez. Esse caso se podia ver diante de sua fisionomia alquebrada pelas tantas lágrimas derramadas. Ele cumprimentou o chefe e em seguida lhe disse algo escrito em um memorando:

--- Estou demitida. Eu agradeço a sua compreensão, mas me demito! – respondeu a moça com a voz de quem chorava.

O homem leu o pedido de demissão e calou. Após breve instante Dumaresq chamou a moça a um reservado e lhe disse com voz amena de quem não aceitava o pedido de Luíza.

--- Minha filha. Vá para casa. Passe quantos dias quiser. Não te cobro nada e nem vou colocar alguém no seu lugar. Descanse bem. Vá para outro local. E deixe o tempo passar. Amanhã, depois, ou seja, lá o que for você volte, pois seu lugar estará a sua espera. Mas, se cuide. Não faça besteira. Cuide-se. Está bem? – perguntou Dumaresq.

--- Está bem. Eu me cuido. Mas, por enquanto, o meu pedido é esse. Se o senhor me der algum dinheiro, eu agradeço. Se não, paciência. Estou demitida. – resumiu Luíza o seu pensar.

--- De modo algum. Eu vou te dar os recursos de que precisas, mas eu quero você de novo entrando por aquela porta para vir trabalhar comigo. – respondeu o homem.

A moça caiu em um choro compulsivo como se o mundo estivesse para acabar. Agarrou-se ao ombro do senhor Dumaresq, lamentando-se de dor e comoção. Era mais o profundo gemido de uma alma ao desalinho. Lacrimejava-se por demais temendo o passado que tivera em certo tempo, onde nada lhe podia compelir para tão desaguado momento de desalento. Já era passado o tempo de sofrer por tanto amor. Enfim, a jovem moça retornou ao seu sentido procurando desfazer daquele sofrer amargurado. Nada além para o seu coração. O homem o qual Luíza amara não mais existia para ela e para os demais amigos e parentes.

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