domingo, 12 de setembro de 2010

DANÇA DAS ONDAS - 18 -

- Lana Turner -
- 18 -
Às dez horas da manhã daquela segunda feira, Honório Dumaresq já estava agarrado no trabalho apesar de ter chegado um pouco mais atrasado. Ele esteve no Porto a examinar os volumes chegados para emitir a ordem de entrega. Ao sair do Porto, ele se deparou com um velho amigo e conhecido de muitas datas, desde o tempo em que jogava “pelada” na rua. Honório era de um tempo que se jogar “pelada” era um bom motivo de se fazer amizades, ou então, de se fazer intrigas, daquela de ficar de mal a ferro e a fogo. Era assim o destino dos bons amigos (e inimigos) de sempre. O “velho” amigo era sem mais nem menos que Sandoval Marinho, nome sempre visitado pelas colunas dos jornais. Sandoval tinha quase a mesma idade de Honório, a se observar o homem de próximo. A surpresa foi total para ambos, pois apesar de ver artigos nos jornais assinados com o nome de “Maneco”, Honório, de antemão, sabia que se chamava o jovem rapaz desse apelido, apesar da diferença do nome original. Foi um abraço imenso dos dois amigos de colégio e de infância. Um deles quase chorou de tanta alegria ao dizer:

--- Você me faz recordar os velhos tempos. – declarou Maneco cheio de lágrimas.

--- Pois é seu cabra. Nunca mais o tinha visto. Sei que andas na cidade. Vejo os teus artigos no jornal. Porém, você é sumamente desconhecido. Só ouço dizer: Maneco pra cá Maneco pra lá. E quem é Maneco? – sorriu Honório ao abraçar o velho amigo de longas datas.

--- Pois é Honório. O velho Honoré de Balzac casado com Eveline Hanska, rica dama polonesa. Como estás? – falou o bom Maneco dos encartes de jornais.

--- Levando a vida enquanto não encontro a minha dama polonesa. – sorriu Honório ao responder o trocadilho do amigo.

--- Não acredito que não tenhas uma dama! – sorriu Maneco com a cara sínica.

--- Para te dizer a verdade: damas têm muitas. Mas estão todas no tabuleiro. – sorriu Honório ao se referir as damas dos tabuleiros de xadrez.

--- Pois é. Tu sem dama e eu? Nenhuma! – sorriu Maneco ao dizer de sua vida íntima.

--- O que me contas do esporte? – indagou Honório desviando o assunto.

--- Ah. O esporte. Ele vai bem. Quem vai mal é o time do azul. Eita coisa danada de ruim. O Veludão esta caindo aos pedaços. Agora puseram pra fora o seu presidente e toda a diretoria do clube. E vão fazer nova eleição. Agora, não tem um nome para ser presidente. Eita pau. – falou desgostoso o comentarista Maneco.

--- Eu vi o que você escreveu certo dia. – respondeu Honório abismado.

--- Não! Mas isso foi agora. Os “homens” estiveram reunidos no sábado e depuseram o presidente. AGORA!!! – descreveu Maneco ainda mais com raiva.

--- Agora? Essa eu não sabia. Desde sábado que eu estava viajando. Não vi jornal nesse fim de semana. Você escreveu sobre o assunto. – indagou Honório.

--- Para o jornal só sai amanhã. Agora no rádio eu meti a boca no mundo. Sacanagem. Agora tem time e não tem presidente. Veja só! – alertou Maneco com os olhos esbugalhados.

--- Quem está mais cotado para ser presidente? – indagou Honório surpreso com a notícia.

--- Não sei. Ninguém quer ser o presidente. E a decisão esta em cima. O Azulão está na primeira posição. Mas ninguém quer ser presidente! - relatou Maneco entristecido.

--- Por que você não se candidata? – perguntou Honório a Maneco.

--- Eu? Tá doido! Quero o que! Agora, pensando bem. Um nome que podia ser apontado era o seu! – declarou Maneco de supetão.

--- Eu? Te manca. Faz tempo que não bato bola e ser presidente, nem pensar. – respondeu Honório ao amigo.

--- E por que não? Olha o status que tu vai ter! – declarou Maneco.

--- Status? Pra me cortarem depois? Nem morto! Agora, eu acho bem pensada uma coisa. Por que você não convida Ernani Ganso Frito para ser o presidente? – disse Honório pensativo.

--- Ernani? Achou que ele não aceita. – declarou Maneco taciturno.

--- Tente. Não custa nada. Junta mais dois e vai até ele. Conversa. Leva um papo decente e veja se ele cai. Se cair. ... – declarou Honório com brilhantismo.

--- É certo. Mas tem um “porém”. – falou Maneco.

--- Qual? – indagou Honório surpreso.

--- Você vai comigo e Pé de Lã! – respondeu Maneco a sorrir.

--- Quem diabo é Pé de Lã? – interrogou Honório.

--- Não é Orlando. Os que o conhecem chamam Pé de Lã! Sabe quem é? Ele jogava pela ponta, mas só escolhia o meio para acertar no gol. Pé de Lã! É Pé de Lã mesmo! – contestou Maneco com a cara seria.

--- Tá bom. Eu vou. À noite. Você me liga ainda hoje? – perguntou Honório.

--- Me dê o teu telefone para anotar. – pediu Maneco.

Os dois amigos se despediram e um foi para um lado e outro saiu com a cabeça tecendo fumaça. Era Maneco, o comentarista de esportes. Dessa vez o rapaz havia emprestado um chute decisivo para compor o Azulão, time pelo qual torcera a vida toda. Então era entrar em contato com Orlando Pé de Lã e, por fim chegar à casa de Ernani Ganso Frito para formular o convite de modo que ele aceitasse, pois não valeria resposta negativa. A qualquer custo, Maneco tinha um nome guardado na sua manga: Honório. Esse era o nome de saída. O mais significativo que Maneco detinha para explorar. Ernani era um “nome”. Homem inteligente, de visão ampla, não aceitava desaforo, era capaz de tudo, porém se afastara do esporte a longo tempo.

Quando chegou a noite, por volta de oito horas, os três desportistas estava a bater na casa de Ernani Salgado, homem decido, voltado para o cultivo de macieiras e nas horas vagas, gostava de assistir luta de boxe. Ou pelo rádio, ou pela televisão e se pudesse, assistir ao vivo quando se deparava com uma luta de competidores de estilo. O “Lagunas”, time o qual sempre admirava com brio, Ernani não mais se importava. “Lagunas” era mais conhecido por Azulão pela cor do seu fardamento: camisa azul e calção branco com meiões azul e branco. Ao soar da campanhia, Ernani logo se prestou em atender, pois de antemão sabia que à noite estaria em sua casa uma comitiva para lhe falar. Com certeza que o instante foi dos melhores. Ernani Salgado recebeu os três rapazes para conversa. Com o avançar da noite, Maneco, Orlando e Honório começaram a fomentar o principal assunto da visita:

--- Presidente? Quero o que! Eu prefiro as minhas macieiras. –descartou Ernani.

---Mas, veja bem. O clube está sem presidente. Não se chega a um denominador comum. Eu vejo em você, - posso até estar enganado -, mas o homem de puro aspecto para não deixar um time que chegou ao primeiro lugar no rank e não deixar cair. Veja bem. Do jeito que estamos, somos o primeiro entre todos. E se você não aceitar a Presidência do Clube vai haver um desastre total. Vamos cair na vala comum dos outros times suplantado por nós. Eu peço, por favor, que aceite a Presidência do clube.

A conversa continuou por altas horas entre um sim e um não, sem se chegar a qualquer acordo decisório. A imprensa tinha falado mal dos magnatas do clube ao dizer que os “grandes” só pensavam em dinheiro e não em um clube do nível do “Lagunas”, pois tais herdeiros de um patrimônio de luxo queriam ter para eles somente a herança do alto patrimônio produzido pelo clube. Chegou-se a falar nos primeiros anos do “Lagunas”, dos seus padrinhos cujo poder era o de tirar a camisa para ver o clube não cair de prestigio. Os anos passaram e o clube gerou rendas até o ponto de uma decisão intempestiva de acabar como todo o amplo patrimônio. Os que estavam torcendo por fora nada sabiam dos esquemas armados pelos ditadores da fama. Havia até quem pretendesse chamar esse clube de dirigentes anônimos do time do “fuhrer” em alusão a Adolf Hitler, designado “líder” da Alemanha.

--- Vou pensar. Amanhã darei a resposta. – respondeu Ernani Salgado.

Com o passar dos dias foi lançada a candidatura de Ernani, cujo apelido era “Ganso Frito” e com isso foi uma campanha mais concorrida da história do “Lagunas”, o “Azulão”. Nas ruas e praças da cidade imperava a fórmula da propaganda dos que defendiam o clube ao dizer:

--- “Vamos meter Ganso Frito na goela”; “Lagunas quer Ganso”; “Ninguém tira esse Ganso”.; “Avante com o Ganso”. Uma modinha foi improvisada para aclamar a vitória de Ernani Salgado onde se dizia “Vamos Salgar o Ganso”. Enfim, foi festa delirante a do Presidente do clube “Lagunas”, com gente de todo o canto presente ao festival da vitória. Inquietos e delirantes os artífices da augusta promoção não cabiam em contentamento. Alguns peraltas não se contentavam e chegaram a falar um termo bem popular: “Com esse Ganso eu Vou”. Foi vitória esmagadora do candidato Ernani Salgado. Para compensar, reservou-se um lugar para Honório que passou a ser Diretor de Esporte do clube Azulão.

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