domingo, 26 de setembro de 2010

DANÇA DAS ONDAS - 32 -

- Gene Tierney -
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A data tão desejada por Honório e Ângela chegara afinal. Dia de sexta-feira, sossego no bairro Alto, pelo menos para a família Dumaresq. Às três horas da tarde, estava o Juiz, o Escrivão e o Sacerdote da Igreja Católica a espera da noiva. No local estava também o noivo, testemunhas, familiares de ambos os casais em numero reduzido. O local era o Bosque de São Paulo, local paradisíaco, onde em outros recantos casais se união em matrimônio como haveriam de fazer os noivos Honório e Ângela. A espera demorou meia hora até a chegada da noiva em um vestido branco de cetim de seda. Ângela foi conduzida em uma charrete para dar mais pompa e gloria ao enlace. O noivo estava vestindo uma casimira listrada de com azulada e com todos os requentes que o cerimonial ostentava. As arvores do Bosque faziam silêncio, com certeza, à espera da brilhante noiva, cujo atrase era bem normal. Após a solenidade de praxe, foram todos os participantes até a Mansão dos Dumaresq onde a festa começou por volta das cinco horas da tarde. Em frente à Mansão a Prefeitura havia concluído o calçamento da rua e pôs uma iluminação em cordões para ilustrar a ocasião. Foi festa muita, com os noivos a dançar à meia-noite a Valsa da Despedida para depois sumirem de vez para o Chalé da Montanha, onde os dois passariam oito dias pleno de amor.

O bazar Casa das Artes “A Botija” já nesse ponto estava operando negócios extraordinários, com a compra e venda de coisas novas e velhas, como era o caso de um piano de parede que o dono havia deixado ali para negociar. Além do piano, tinham também almofadas de veludo, xícaras ornamentais, pratos feitos a mão com impressões de pássaros a cantar nos galhos dos arbustos, peças de um abajur feito em bronze, uma saleta completa com todos os utensílios do lar, quadros de belas artes, baú do século 19 entre outros aparatos originais e remotos. “A Botija” era uma casa de amplos negócios, tanto para os seus magnatas donos como para o público freqüentador. O movimento era imenso, principalmente à noite, pois pela manhã “A Botija” não abria para negócios. O movimento era apenas interno. O velho Dumaresq sempre dava uma olhada para ver como estavam se saindo os novos proprietários, tão logo eles regressaram da lua de mel no Chalé da Montanha.

Um quadro de fotografias era aberto para que todos pudessem admirar quando os noivos se casaram em pleno bosque com a participação de poucos convidados. Honório examinou as fotos do casamento e deu um sorriso fugaz. Eram oito horas da manhã e ele ainda tinha o que fazer no Porto deixando a sua mulher a gerir a Casa de Arte onde os negócios estavam perenes com a participação de uma gerente de compra e venda e a participação de dois empregados. A parte da manhã era destinada a compra. E a tarde, por volta das quatro horas, era aberta a Botija para os que desejavam vender ou comprar. As luminárias eram acesas de modo que as peças ficassem bem aclaradas. O funcionamento da Casa de Artes era até a meia noite, quando isso era nas sextas-feiras, sábados e domingos. Nos demais dias da semana a Galeria trabalhava apenas até as de horas da noite.

Na galeria de artes havia três cordões de lâmpadas a iluminar as peças em mostras embutidas na divisória do salão de modo a que ninguém ficasse a sem notar no mínimo algum defeito que porventura houvesse. Nas sextas-feiras, sábados e domingos do final do mês eram comuns haver exposição de quadro de arte. Além do mais, havia exposição de artes sacras em salão a parte, onde se podia sentar em dez cadeiras e um sofá de vime do século 19 devidamente acamado pela ordem no meio da sala. As obras sacras estavam afixadas em divisórias por todo o quadrado do recinto. Em outra mostra os autores criavam imagens que caracterizavam os mais sombrios dos sonhos. Ali estava uma galeria de arte “negra”, pois nesse recinto havia exposições de peças raras, novas ou antigas. A constante da galeria era a de mostrar uma expo a cada final de mês. Além do mais, a galeria exibia todos os dias os trabalhos artesanais feitos por mulheres e homens do interior e peças de um dia do século passado. Certa vez, houve uma reunião de diretores de “A Botija” composta pelos membros oficiais: Honório, Ângela e Jorge. Seria realizada em outro Estado da Federação reunião dos empresários de obras de arte, onde se consultava a presença da diretoria de “A Botija” vez que estava fomentando um largo efeito na mostra das artes da sua região. Nesse caso, deveriam estar presentes pelo menos dois dos seus organizadores. Essa reunião foi feita de certo pela manhã. O encontro durou largas horas do expediente matutino. Essa era a primeira vez que uma entidade local tinha o ensejo de ser chamada para representar o Estado.

--- Devemos ir. Ficariam à frente da loja o seu pai e a gerente, por certo! – declarou Ângela.

--- Isso é. – respondeu Honório entusiasmado.

--- Eu entendo somente de compras e vendas. – sorriu o velho D.

--- Creio que a moça entende já e muito bem. – sorriu Honório.

--- Ela vai casa! – lamentou Ângela de surpresa.

--- Bosta! Isso é uma merda! E esse casamento vai ser quando? – indagou Honório alarmado.

--- No final do mês. – respondeu Ângela angustiada.

--- É mais bosta ainda! Eu me casei durante um fim de semana e você nem reclamou. Passamos oito dias fora. Foi do mesmo jeito. Agora, por causa de uma reunião e ela não vai tolerar por causa de um casamento? – indagou Honório cheio de ira.

--- É. Vamos ver. A reunião vai ser numa terça feira. Eu queria também conhecer pelo menos uma galeria de arte. Então, nós estávamos a voltar no muito na sexta feira. – sorriu Ângela.

--- E tem Luiza! – declarou o velho D.

--- Luiza? Que Luiza? – indagou Ângela assustada.

--- Luiza? E ela esteve aqui? – perguntou Honório assustado.

--- Esteve. Luiza era funcionaria do escritório. Eu já falei dela. Eu disse que Luiza voltasse à tarde. No muito ela ficaria com o afazer do escritório e eu tomaria conta do atelier. – fomentou com certo orgulho o velho D.

--- Luiza! Quem diria! Ela apareceu em uma hora oportuna! – comentou Honório a se lembrar dos velhos tempos.

--- É Essa tal Luiza pode ficar mesmo com o escritório. Eu já tenho três empregados no atelier. Isso vai inchar muito. – respondeu Ângela enciumada com o marido, pois sabia muito bem quem era a peça.

--- Eu fico com Luiza. Ela entende bem do negócio. – respondeu o velho D.

--- Assim é melhor. Eu sei. Luiza! – rebateu com antipatia a mulher.

--- Ela é boa! – disse Honório sorrindo.

--- Eu sei o quanto! – respondeu Ângela arrumando os seus pertences a olhar para o marido.

Finda a reunião, os três partiram para o almoço do meio-dia deixando o prédio aos cuidados de Miguel, o porteiro.

O almoço foi servido no Restaurante Magestic, local de lauta refeição onde era muito bem freqüentado pela sociedade aristocrática da cidade. O local tinha três fileiras de mesas, cada uma com oito passadios. Àquela altura das horas, era repleto o restaurante com os garçons a atender a todos quantos pediam um almoço. Para contentar a freguesia, de início, servia-se um vinho com salgadinhos. Depois é que se servia o almoço de verdade. Para Jorge D ele pediu um peixe o que foi pedido também pelos outros dois acompanhantes. Por isso, o almoço findou ornado em peixe. Alguém que estivesse a olhar a mesa de D., ficava a saborear aquele augusto prato de salmão ao molho e não se negava a dizer:

--- Era bem melhor se ter pedido o prato de salmão. – recitava alguém.

--- Você preferiu filé! – respondia o outro aturdido.

--- Você é quem quis filé! – respondia malcriada apesar de baixa a voz à mulher intiqueira.

Logo após o almoço, os três D da família seguiram viagem no auto de Honório para o escritório do Bairro Alto. O velho tinha então uma refeição um pouco leve, pois a arritmia do seu coração o alertou para moderar nos alimentos, notadamente a carne de sol ou verde. Às duas horas da tarde, com Ângela a cuidar doas afazeres do seu atelier e Honório no Porto, coube a Jorge D ficar no escritório, com certeza, a cochilar derribado na cadeira alcochoada. Foi nessa ocasião que entrou no recinto a jovem moça Luiza, tocando de leve na porta para não assustar o seu chefe, pois Jorge Dumaresq estava a dormir. Mesmo assim, com o toque, o homem acordou e se ergueu da cadeira recomendado a moça que ela cuidasse em sentar.

--- Obrigada! – respondeu Luiza a sorrir.

--- E então? – indagou Jorge Dumaresq.

--- Então? Então digo eu. – sorriu a moça esperando a resposta.

--- Os seus papeis estão aqui. Você voltou. Faz tempo. Mas estás admitida! – sorriu o velho Dumaresq como quem dizia; “O lugar é seu”.

Então, Luiza abriu um sorriso largo e cumprimentou Jorge D com um beijo na testa.

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