domingo, 7 de março de 2010

LUZ DO SOL - 47

- JOVENKA -
- CONTO -
Jovenka saiu de casa logo cedo pegada pela mão do seu irmão dois anos mais jovem em busca do pai que saíra de casa fazia um bom tempo. Nessa época, Jovenka estava com seus 12 anos de idade e o seu irmão, dez anos. Os dois perambularam a pé pelo sertão, onde não tinham casas ou mesmo choupanas para se abrigar. A menina, depois de muito caminhar, se encostou à sombra de um pé de pau bem alto e frondoso para poder descansar da imensa caminhada. Jovenka deixara para trás o casebre onde ela e o irmão moravam. Sua mãe havia morrido fazia pouco tempo. O pessoal que cuidou do enterro dizia de a mãe de Jovenka sofrera por causa da ausência do seu marido. Outros afirmavam que fora por causa da fome que a mulher passava. Enfim, ninguém dizia coisa com coisa. Para Jovenka, a sua mãe estava morta e enterrada, apenas. Uma situação de pura pobreza onde nada era tudo o que se podia ter, Jovenka buscou caminho perdida pela estrada do sertão. O seu irmão reclamava do cansaço e da fome. A menina procurava entretê-lo com uns tomates do mato que apanhara no meio do caminho enquanto o garoto chorava.
--- Tô com gastura, Jô. – dizia o menino.
--- Pera. Tamos chegando. – respondia a menina.
Então, os dois dormiram à sombra de um pé de pau enquanto a barriga doía demais por falta de alimento. Quando os dois acordaram, em plena tarde, voltaram a caminhar levando suas angustias e a esperança de encontra seu pai. Todos sabiam que ele era pedreiro, e na cidade devia haver uma construção onde alguém poderia saber onde encontrá-lo, com certeza. A noite vinha chegando e Jovenka procurou abrigo à margem da estrada onde pudesse dormir sobre suas pobres roupas e um saco de moletão. Para matar a sede, Jovenka buscou água em um aceiro onde corria uma restinga que havia no tempo de chuvas. Pouco havia para colher. Mesmo assim, ela juntou em uma cabaça esse pouco de água que deu para o irmão e tomou um tanto do que sobrara. A restinga ficava há pouca distancia de onde os dois acamparam na noite daquele dia.
--- Tô cum fome. – dizia o garoto.
--- Dorme que passa. Amanhã a gente encontra o pai. – respondeu Jovenka, compassiva.
--- Amanhã e muito longe? – perguntou o menino.
--- Não é não. Amanhã é depois da noite. – explicou Jovenka.
--- E a noite é longe? – voltou a perguntar o menino.
--- Não é não. Dorme. – aconselhou Jovenka com sua voz calma.
Enfim, o menino dormiu no meio do mato onde se ouvia o canto das cobras, dos grilos e de outros animais e insetos que muito havia pelo sertão. Ao quebrar da barra, os dois irmãos já estavam na estrada, caminhando como podiam. Ela, a menina, com a sua roupa surrada, pés no chinelo, pano na cabeça para proteger do sol quente, saco de moletão nas costas, mais parecia um assombro. O garoto ao seu lado, calças curtas, suspensório de uma só alça que tinha sido feito por sua mãe quando ainda era viva. Na estrada, o garoto choramingava o tempo todo sob modesta repressão de sua irmã.
--- Te cala. Coisa feia. – resmungava a menina Jovenka.
--- Minha barriga tá agoniada. – choramingava o garoto.
--- Isso passa. Pega. Come. Faz bem. – disse a menina, ao tirar da sacola uma fruta silvestre que havia colhido de manhã logo cedo.
E o garoto mordeu a fruta e disse:
--- É ruim. Azeda. – respondeu o menino.
--- Mas come. Só tem essa. – falou Jovenka procurando acalmar o irmão.
Nesse instante, um caminhão parou. O motorista perguntou para onde os dois irmãos estavam indo e a menina respondeu:
--- Para a cidade. – respondeu Jovenka.
--- Suba na trazeira. – recomendou o motorista, um homem corpulento e todo sujo de graxa de carro.
A garota subiu o irmão, dado a condição um pouco alta do caminhão, coberto com uma lona até a parte de trás e logo, subiu, sem muito esforço.
--- Pronto? – perguntou o motorista.
A menina fez que sim com o dedo polegar para o lado de fora do caminhão que o homem logo entendeu que já podia partir. Os dois se ajeitaram a carroçaria entre outros sacos de carga e dois porcos. A menina só podia mandar o seu irmão dormir, pois o caminhão ainda tinha muito de trafegar.
--- Dorme. É melhor pra nós dois. – recomendou Jovenka.
O sacolejar do carro na estrada e a fome mortal que fazia a barriga de Jovenka também chacoalhar, acomodou os meninos que ali mesmo pegaram no sono. De um dos sacos que estavam da carroceria do caminhão escaparam algumas frutas que correram até onde estava a menina. No seu sacolejar pela estrada, a menina acordou com algo a lhe tocar a perna. Ela abriu os olhos e viu a fruta que estava fugindo do saco para cair na estrada. De imediato, Jovenka colheu algumas frutas e as colocou na sacola que levava então ao lado de sua cabeça. Era aquele almoço e o jantar do dia, certamente, Jovenka pensava enquanto o carro corria. Em certo trecho da estrada, o caminhão parou. O motorista com a camisa aberta aos peitos veio até a trazeira do carro e procurou os dois passageiros. Ele, então, recomendou que o garoto fosse para antes dos porcos e a menina sairia com ele para boleia, pois com um pouco chegaria a uma estação da Polícia Rodoviária. Ela estando na boleia, a guarda não perguntaria coisa alguma. A menina obedeceu e deu umas frutas ao garoto.
--- Que frutas são essas? – quis saber o motorista.
--- Do saco que estavam caindo. – respondeu Jovenka.
--- Ah bom. Não tem importância. Eles estão furados mesmo. - disse o motorista.
O caminhão parou no Posto da Rodoviária. O caminhoneiro conversara com os guardas aduanas, levando uns poucos das frutas para entretê-los e logo pôs o pé no caminho. A Cidade era longe de se chegar. O caminhoneiro olhou para as pernas da menina, encostou o carro em uma sombra de mato e ali fez o que tencionava fazer, na boleia do caminhão. A menina não sabia de nada e permitiu que o homem terminasse com o seu desalinhado feito. Após concluir tal proeza, o motorista largou em frente e quando viu a cidade, disse para a menina:
--- É logo ali. Chame seu irmão e pode seguir em frente. – falou o motorista.
A menina desceu do carro, ajeitando as suas roupinhas e chamou o irmão que estava na carroceria dizendo que estavam onde eles deviam ir.
--- Prontos. Chegamos. - falou Jovenka.
O menino saiu do esconderijo atrás dos porcos, e com certo esforço, saltou para o lado da carroceria amparado por sua irmã.


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