sexta-feira, 26 de março de 2010

LUZ DO SOL - 66

- LUDMILA -

- CONTO -

Era difícil para Aldemar saber o que faria então quando Ludmila não quisesse mais fazer amor entre os dois. Quando o rapaz queria, era a vez da moça não querer. Escondida em seu apartamento meio desgastado, pois o dinheiro que conseguia não dava para pagar outro. Ludmila ia levando a vida como Deus queria. Olhos tristes e pensadores, cabelos longos e maus cuidados, boca de carmim, ela andava quase nua para ver se conseguia alguém que aparecesse no randevu a qualquer hora do dia e da noite. E se alguma pessoa fosse falar em Aldemar, ela não ouvia e saia de perto. Seu apartamento era um cubículo apertado nos fundos do prédio do lupanar, um sobrado de três andares onde abrigava as damas da noite que por ali viviam. O bar ficava em cima de tudo, onde uma vitrola arranhava os discos de vinil que ainda ontem se colocava para tocar para o sabor entretido de seus freqüentadores. De novo, apenas havia as mulheres que perambulavam pelos cabarés da velha e acabada cidade, no largo do bairro onde se fazia de tudo. Desde o cachorro-quente até uma Delegacia de Policia que punha a ordem nos botecos do lugar em troca de uma porcentagem das mulheres.
Quando era dia, as damas procuravam comida pronta para comprar, pois nos seus cubículos de dormidas, elas não tinham nem coragem de fritar um ovo. E Ludmila seguia a mesma tradição das outras damas. Se um bêbado aparecia de manhã logo cedo para fazer um pouco de amor, Ludmila estava presente. Era ela quem fazia a vez de atender o vagabundo, mesmo que estivesse sem o mínimo de vontade. Porém, se fosse Aldemar que aparecesse, ela fechava a porta na cara do rapaz e este saía cabisbaixo como se tivesse por completo e extenuado arrependido de tudo o que fizera em beneficio da dama, moça de seus 22 anos de idade. E nesse ponto, o rapaz começava a chorar porque a mulher não mais o queria. Todas as noites, quando dava oito horas, o bar fervilhava de gente. E entre todos os que procuravam diversão, estava Aldemar bebericado uma dose de cachaça e vendo ali a sua mulher amada. Mesmo assim, Ludmila não dava bolas para o rapaz. Então, o jovem se contentava em beber cada vez mais.
De dia, Aldemar costumava consertar carros. E era certo ter uma boa freguesia, pois o seu trabalho era admirado por todos os diversos mecânicos daquela redondeza. Ele trabalhava praticamente da rua, com uma caixa de ferramentas que sempre a deixava quando não tinha nada para consertar, em uma oficina próxima onde Aldemar estava. De onde ele trabalhava podia ver a porta sempre aberta do apartamento de Ludmila que por vezes aparecia para derramar um vaso de água na rua, uma alameda suja e mal cheirosa que muita gente procurava não passar pelo local. Por sinal, o mau cheiro advinha de uma maré que se espalhava por todo o bairro. Os sobrados existentes, como o de Ludmila, eram uma lembrança do passado onde abrigavam engenheiros de cais do porto que vinham para a sua construção. Depois que terminou o serviço, os sobrados ficaram ao relento sendo ocupados pelas prostitutas que se deslocavam para aquele ponto. E o que Ludmila morava era o melhor de todos. Para se ter acesso aos cubículos se subia por uma escada de madeira com era o costume da época em que foi feito aquele prédio. De tanto gastas, as escadas já faziam um ranger como que caindo para um lado e para outro. No ranger que fazia dava-se para ouvir em todo o prédio e todos ficavam atentos para a nova freguesia. Quando era alguém do meio, logo se ouvia os mecânicos a gritar:
--- Olha ele! Chega pra cá! Nós estávamos te esperando! – e caiam na gargalhada.
Se não era de casa, então os mecânicos nada faziam. Principalmente se fossem homens da Policia que a baixa voz todos os chamava de “meganhas”, coisa que desagradava os policiais que ostentavam o poder de dizer:
--- Esteja preso! – dizia o policial.
Entre todas as damas do randevu estava no meio à moça Ludmila, coisa que não preocupava a nenhum, pois todas ali eram também moças na idade, algumas com menos dos seus 18 anos. Essas tais foram embarrigadas logo cedo quando tinham catorze ou quinze anos. Ao saber da “desgraça” o pai punha sumariamente pra fora de casa e tais mocinhas terminavam por seguir a vida de meretriz, com foi com Ludmila. As mulheres de seus 25 anos conversavam nas bancas sobre as novidades que estavam a acontecer. E assim diziam as damas da noite nas suas arrematadas conversas que tinha novidade na roda da prostituição, pois elas tomaram conhecimento de crianças de nove anos de idade que estavam a fazer abertamente trottoir pela rua querendo competir com as mulheres da vida alegre. Tal fato era um escândalo.
--- Ave Maria! Nove anos? Isso é um escândalo. – dizia uma mulher da vida.
Enquanto outras arrematavam:
--- Que é que tem? Eu conheço muita que com essa idade já era embarrigada pelo próprio pai! – conduzia outra meretriz.
--- Eu penso assim. Esse homem, não é homem. É um “cabra” safado. - lamentava a terceira.
E a conversa continuava nesse mesmo ritmo. Em seu canto sentado, bebericando, estava Aldemar. E a sua “mulher”, Ludmila, entrava no cubículo com um homem para fazer um pouco amor. Olhando por baixo como se usasse óculos, o rapaz se entristecia por completo por ter a sua mulher amante, 22 anos, nos braços de outro. Com o compasso das horas, a noite plena de estrelas, o mau cheiro do esgoto da maré, os gritos dos homens que faziam churrasco no meio do caminho entreteciam os ébrios que nas calçadas procuram algum local para conciliar o sono. Os “meganhas”, quando chegavam ao bereu, procuravam logo a gerente do lupanar para fazer sua coleta.



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