terça-feira, 23 de março de 2010

LUZ DO SOL - 63

- CURVAS DA VIDA -
- CONTO -
Seu nome era Helena, porém todo o pessoal da família a chamavam de Lena. Caso normal em qualquer tempo. Contudo, Helena, já então formada professora de História não ligava muito para o nome e se alguém lhe perguntasse como se chamava ela então dizia simplesmente Lena. Com seus trinta e cinco anos de idade, viúva, pois o marido morrera tempos atrás, Lena vivia dos cuidados dos filhos e de ensinar no Colégio da Capital. Era esse o seu modo de vida. Aos sábados e domingos juntavam os filhos – e eram três, sendo duas meninas e um menino de idades variado de 10 aos 15 anos – e se largava para a chácara dos pais em lugarejo foram do burburinho da capital. O local era aprazível onde tudo era silêncio. Apenas o ruído de alguns carros que passavam longe na estrada, era o toque do progresso que se avizinhava. Na fazendo do seu velho genitor o mais saltitantes de todos era um cabrito novo que fazia as graças de quem estava a vê-lo com certeza. Os criados da fazenda eram os que cuidavam do gado, cavalos, éguas, cabras e até mesmo o novinho cabrito. Para Lena eram um sonho de vida aqueles tempos em que passava juntos aos pais com os seus filhos.
Em certa tarde de sábado, onde o tempo era de chuva, chegou até aquele lugar um homem de seus quarenta anos, pedindo abrigo por questão da chuva que estava a cair. O homem, muito bem vestido - de gravata e paletó, calças de linho e sábados brilhosos se não fora a chuva que o atolou na lama – levava aspecto de gente da cidade e, com certeza, estava ali por passeio, em visita a algum conhecido. O pai de Lena deu abrigo ao homem e perguntou-lhe o nome, de forma modesta. O homem informou o seu nome:
--- Augusto. Satisfação em conhecê-lo. – respondeu o visitante.
O pai de Lena também lhe deu o seu nome para ativar um pouco a conversa.
---Nicanor. O prazer é meu. – respondeu o pai de Lena.
E assim se fez as graças de ambos. Lena, que estava em um dos quartos, notou a conversa do velho pai com o forasteiro. Ela ficou a escutar o que ambos conversavam sem maior atenção. Em certa ocasião, o seu filho passou até a sala e cumprimentou o visitante sem maior cuidado e saiu pela porta da frente para ver como estava o tempo por aqueles lados do sertão. As duas filhas de Lena continuavam na sala de jantar jogando damas como era o seu hábito. A mãe de Lena cuidava do jantar ao lado da cozinheira da casa. Outra empregada varria o chão para tirar as folhas que entravam na chácara trazida pelo vento da chuva. Na sala de visitas, Nicanor conversa com Augusto sobre o tempo e em certo ponto perguntou:
--- O senhor é daqui mesmo? – perguntou Nicanor querendo assustar o forasteiro.
--- Não senhor. Sou da capital. Vim visitar um amigo. O carro em que eu estava achou de quebrar. O destino me trouxe até aqui onde tive oportunidade de encontrar a sua chácara. O meu carro está logo ali, em baixo. – respondeu Augusto sem cerimônia.
--- Ah. Bom. Essas invenções de hoje são sempre assim. Eu sou do tempo da charrete. – sorriu o velho Nicanor.
--- É verdade. Meu avô tinha uma charrete. Era um tempo maravilhoso. Nós íamos de um canto a outro e não quebrava. Tempo bom aquele. – respondeu Augusto.
--- E por que não compra uma charrete? – perguntou Nicanor.
--- Até que não era mal. Mas na cidade tem as suas limitações. É assim. – redargüiu Augusto a indagação do velho.
--- Bem. Isso é. Mas já vi na capital gente andando de charrete. E têm muitas. – disse Nicanor.
--- Tem. Isso tem. Mas eu moro em um apartamento. Então: e o cavalo, quem cuida? – indagou Augusto a sorrir querendo insinuar ao velho que para ele aquilo não prestava.
--- É verdade. É verdade. Mas não custa nada tentar. Se vier aqui de charrete, tem mais segurança. – respondeu o velho enciumado.
--- É verdade. É verdade. – respondeu o homem a sorrir.
O tempo estava clareando e Augusto teve que se despedir de Nicanor, pois o seu carro estava alheio e ele precisava de alguém que o consertasse. Quando se levantou para olhar o tempo, o velho lhe contrapôs.
--- Moço. Aqui você não encontra ninguém que conserte seu carro. A não ser tirar um pneu o colocar outro. O resto, não tem ninguém que conserte. – respondeu Nicanor.
--- É verdade. Mas eu conserto. A não ser uma peça quebrada. Então tenho que comprar outra. O resto, eu conserto. – proferiu Augusto.
--- Ah bom. Sendo assim eu posso até mandar o empregado da fazenda cuidar com o senhor. Se não se incomoda. – respondeu Nicanor.
--- Eu agradeço a ajuda que o senhor me oferece. Obrigado. Pode ser. – respondeu Augusto
O velho foi até o quintal e chamou um ajudante para que fosse socorrer o carro de seu Augusto que estava quebrado. O rapaz se prontificou em ajudar. Ao voltar à sala, Nicanor encontrou Lena a conversar com o homem. A mulher perfumosa, cheia de esmerado encanto se mostrou ao homem. Lena disse a Augusto com precisão se ele não pudesse consertar o seu automóvel, poderia vir para dormir na chácara, pois no dia seguinte havia feira naquela cidade e, com certeza um mecânico havia de aparecer. O homem agradeceu aquela modesta dádiva e comprometeu em ficar para não sofrer as agruras da tempestade. De certo modo atendendo a Lena, o homem resolveu ficar de vez e cuidar do veículo no dia seguinte. Foi uma noite de aprazível encanto, com Augusto mostrando sua desenvoltura em conversas e Lena apenas a ouvir o que ele estava a dizer. Seus três filhos, o pai e a mãe de Lena observavam o conversar de Augusto e em determinados instantes o sorrir da neta mais nova com as palavras ditas pelo nobre senhor. Com o tempo que passava, Nicanor convidou o senhor para assumir o seu quarto de hospedes onde ele poderia se abrigar sem medo da torrente chuva que continuava a cair. Naquelas curvas da vida, Augusto agradeceu ao esmero do dono da chácara e foi logo se agasalhar. Por toda noite chovia aos píncaros em toda a região. De manhã, logo cedo, Augusto estava acordado vendo se o tempo melhorara. Com certa precaução, o homem acertou com o velho Nicanor para ir a feira, em companhia de um serviçal tentar encontrar um mecânico.
De volta para o seu local da chácara, o homem agradeceu toda a hospitalidade recebida, pois o mecânico encontrara o defeito do seu automóvel e ele agora já teria condições de seguir viagem. Porém, conversa vai, conversa vem, Augusto se viu obrigado a passar o domingo na chácara onde pode observar todo amplo terreno onde o velho se ocupara em criar seu gado, o plantio de árvores, o cultivo de mandioca, milho, feijão entre outros produtos que Nicanor tinha em seu cercado. Para tanto, ele fez a caminhada no dorso de um cavalo, tendo por companhia em suas montarias o neto do velho e o competente Nicanor. Quando era por volta do meio dia, o velho resolveu voltar sob os olhares penetrantes de Lena sobre o jovem novo cavalheiro que naquela altura estava coberto do suor. Augusto queria apenas descansar um pouco da viagem que fizera por tal aprimorado recanto acolhedor.
--- Que tal achou da chácara? – perguntou Lena.
--- Muito linda. Estou quase morto de cansado. Suando demais por todos os poros. – respondeu Augusto.
--- Essa é a vida do campo. – comentou Nicanor.

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