quinta-feira, 12 de agosto de 2010

MEIAS DE SEDA - 41 -

- MEIAS DE SEDA -
- 41 -

Ao descer pela Rua do Cemitério, por quase sete horas da noite, ao chegar ao seu final, onde tudo era plano, Inaldo notou uma porção de gente em frente à sua casa o que já o incomodou sobremaneira. Ao chegar mais próximo da casa, uma habitação simples e mal decorada, pintada somente a cal, Inaldo foi se acercando temeroso do povo que estava dentro e fora do casebre. E nem precisou perguntar o que sucedera, pois um dos vizinhos se acercou dele e foi logo lhe mostrar e dizer que a sua mulher tinha sido atropelada pelo trem. Atropelada e morta. Com certeza ela tinha ido recolher algumas roupas no varal que fazia na cerca do sitio de Osias e ao voltar teve o pé aprisionado por os dormentes que sustentavam a linha férrea. Com isso, a mulher não teve tempo em sair da linha, pois estava vindo um trem de carga que a colheu de vez. Uma outra pessoa disse ter visto a cena e também quando Zilene procurou por todos os meios se soltar dos trilhos. Mas não houve tempo para desfazer do pé. Zilene usava ainda uma bengala para poder dar maior sustentação ao caminhar, principalmente se ela fosse atravessar a linha do trem. A composição tragou todo o corpo da moça e o resto que sobrou cabia num saco de papel, para bem dizer. Zilene teve morte instantânea. Parecia que o destino da mulher tinha traçado o seu fim para uma tarde de domingo, quase noite por assim contar. Diante do fato inusitado, sem poder crucificar viva alma Inaldo caiu em choros.

Inaldo compreendeu o que lhe tinha dito o seu amigo Jubal e não se casou com Zilene. Com ela passou a viver junto. Fazia mais de um mês que eles estavam juntos procurando se acertar de vez por todas. Ela era católica, mas não freqüentava a Igreja. No inicio era por falta de tempo. Depois, porque levou um tiro nas costas. Os meses passaram e Zilene ficou puxando pela perna. Mesmo assim, Inaldo aceitou a viver com ela. Após esse mês, veio a tragédia. Zilene tinha ido buscar roupas no cercado de Osias e não evitou o trem que passava na ocasião. Sua vida foi cheia de atropelos. Andava a pé, de madrugada, levando as coisas para vender no Café do Mercado. E assim viveu até cerca de 20 anos. Depois veio o convite de Inaldo para viverem juntos. Com relação a esse tempo, surgiu a possibilidade de ganhar bom dinheiro como bailarina de cabaré e o resultado foi o que deu: um tiro nas costas. Ela passou a viver novamente com Inaldo até aquele dia.

Os peritos da Policia chegaram às sete horas da noite e recolheram o que sobrou de Zilene no meio dos trilhos do trem. Inaldo estava acabado. Não tinha mais esperanças no seu futuro. Pela manha da segunda-feira, ele acompanhou o sepultamento do que sobrou da sua mulher no Cemitério da Cidade. Quando terminou a solenidade, com poucos amigos, dentre eles Jubal, que não alimentou mais antipatia por causa da denuncia de adultério e que ficou provado não ter havido qualquer ação desse tipo. Jubal, a noiva Salésia, a filha Oceanira estavam juntos durante a solenidade fúnebre, dando o seu apoio ao amigo Inaldo que não parava de chorar. A mãe de Zilene estava também ao sepultamento da única filha querida. Dona Doca era um pranto só. Não olhava para ninguém e apenas chorava sem acusar nenhuma pessoa. O cortejo do sepultamento se desfez ali mesmo com as poucas pessoas presentes caminhando para os seus locais. Um dos que estavam na localidade era Jubal acompanhado de sua noiva e filha amparando o amigo Inaldo que já partia para um recinto qualquer, de cabeça baixa e chorando sempre. Na saída do campo santo, antes mesmo de se chegar ao portão principal, Jubal notou a uma rua após, a figura da mulher que era a semelhança de Nora, já falecida e sua ex-esposa. Quando a notou Jubal a cumprimentou com um aceno de tirar o chapéu. E a mulher sem nome, porque ele ainda não sabia, também fez o seu aceno em resposta ao senhor Jubal. O gesto de Jubal foi notado pela sua noiva, Salésia, que de imediato perguntou com quem o seu noivo falava:

--- Um amigo, do outro lado. – respondeu Jubal disfarçando a mentira.

A moça de imediato olhou para a rua do cemitério e não notou viva alma. Isso a levou, de imediato a falar ao seu noivo.

--- Amigo? Não vejo ninguém ali! – respondeu Salésia se estremecendo até.

--- Ele já passou. Foi de repente. Mas ele estava ali perto. – confessou Jubal aperreado.

--- Não vi ninguém. Eu te juro. – insistiu a moça.

Jubal procurou uma sombra qualquer para melhor se agasalhar do calor infame que fazia do lado de dentro do cemitério ao passo que disfarçava a sua mentira da doce noiva Salésia. A moça, inquieta, ainda procurava olhar para a outra rua do campo santo. Nada vendo, voltou a caminhar de braços dados com o seu noivo sempre a perguntar a Oceanira se ela sentira calor no trajeto de saída do local. Oceanira, toda vestida a rigor, dizia que estava sentindo também. Na saída do portão do campo santo, Jubal se deteve ligeiramente para perguntar a Inaldo para onde ele teria destino. O rapaz disse não saber ao certo, pois não tinha qualquer outra coisa a não ser chorar.

--- Compreendo meu rapaz. Nós iremos deixar Salésia em sua casa e logo depois seguiremos para a minha casa onde você tomará café, com certeza. – respondeu Jubal.

--- Sabe amigo. Estou aniquilado. Não tenho mais vontade de nada. Ao saber que um dia antes ela estava viva e agora está morta, isso para mim é o fim. –confessou Inaldo chorando copioso.

--- Tenha calma. Sossegue. Tudo tem seu jeito. Um dia nós temos que ir enfim. Essa é a vida. Isso ocorre todos os dias com um e com outro. Descanse, apenas. – recitou Jubal.

O veiculo de Jubal acelerou até chegar a Rua da Prisão, onde Salésia morava. Ao chegarem sua casa, a moça desceu do veículo e em seguida também a acompanhava o seu noivo e a futura cunhada. Chegaram eles até a porta da casa e, logo um rapaz estranho veio abrir. Jubal não se preocupou com o rapaz, pois ali estava também Enio e Euclides, irmão de Salésia. Todos os três estavam na banca a estudar. O rapaz abriu a porta e Salesia entrou. Dentro da casa, veio à senhora Suzana, mãe de Salésia, a perguntar coisas do sepultamento. Jubal foi quem disse:

--- Normal. Muito pranto. Pouca gente. É isso mesmo. – relatou Jubal em baixa voz.

--- O corpo da mulher estava muito estragado? – perguntou Suzana fazendo cara feia.

--- Não sei. Ninguém sabe dizer. Estava dentro do caixão e não se pode abrir. – respondeu Jubal de forma lacônica.

--- Só imagino que estava. – respondeu a mulher.

Nesse instante a jovem Salésia chegou com três copos com água para dar ao seu noivo, também a Oceanira e o outro ela levou até o carro para dar a Inaldo. Ao chegar ao veículo, Salésia não encontrou o rapaz. Olhou para um lado e para o outro e viu apenas ele correndo em direção a rua Ocidental de Cima e então pulou o muro de arrimo para o lado da rua Ocidental de Baixo. Foi pulo e queda. Ela, de mão na boca só fazia gritar:

--- Socorro! Socorro! Socorro! O homem caiu! – gritou Salésia apavorada.

De imediato, Jubal se voltou correndo para a rua e perguntou a moça pelo rapaz. E essa sem forças, desmaiou. Jubal procurou a levar para dentro de casa, a filha Oceanira ajudou a carregar a moça, puxando pelas duas pernas, e a mãe, Suzana, desesperada, gritava por socorro por assim era que ela notava a sua filha. Havia tumulto em frente da casa de Salésia e em mais algumas, numa bodega também que ficava mais para cima. O povo correu para ver o que tinha acontecido ao homem que se sacudira de cima do muro de arrimo para a linha do trem, numa altura de três metros. Todos os circunstantes eram um só temor. Em baixo, nos trilhos, um corpo retorcido acabava de falecer com o impacto da queda fatal. Pessoas que moravam na Ocidental de Baixo acorreram também e enxergaram que era um homem que estava quase morrendo ou tinha morrido de uma queda.

--- Ave Maria. O homem está morto! – soluçava uma voz de mulher com as mãos pregadas a boca.

--- Ele está morto? – perguntou um rapaz.

--- Coitado. Não quero nem olhar. – dizia alguém.

Do lado da casa de Salésia, vieram os irmãos dessa e o rapaz estranho para ver o sucedido. O rapaz estava morto para todos os efeitos. A queda de três metros fraturou o crânio e a espinha dorsal além de braços e pernas. Pessoas de baixo chegaram para acudir a vitima e foram recomendadas a não tocar no corpo do rapaz, pois a perícia era quem tinha que fazer os exames. De imediato, chegaram também Jubal e Oceanira.

 

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